A primeira cimeira das Nações Unidas em pessoa desde o início da pandemia, em Nova Iorque, tem sido agitada. Enquanto França discutia com o Reino Unido e os Estados Unidos por causa da venda de submarinos à Austrália, a China ia metendo o dedo, temendo perder terreno no Pacífico. Como se não bastasse, os talibãs exigiam representação na cimeira, deixando a comunidade internacional – que não reconhece o Governo dos extremistas islâmicos, mas tem perfeita noção que o anterior Governo já não existe – num dilema. E no meio de todas estas discussões, os diplomatas ainda se tiveram de preocupar com o risco sanitário colocado pela delegação brasileira, encabeçada por Jair Bolsonaro, que admitiu não se ter vacinado, e cuja comitiva já teve pelo menos dois casos positivos de covid-19.
Aliás, o mais recente caso foi o do próprio ministro da Saúde. Marcelo Queiroga testou positivo menos de 24h depois de estar com Boris Johnson – Queiroga foi um dos poucos que estiveram de máscara no encontro entre o primeiro-ministro britânico e o Presidente brasileiro.
Depois, Johnson teria um encontro com o Presidente americano, Joe Biden, enquanto Queiroga participava em reuniões com o Presidente polaco, Andrzej Duda, e com o secretário-geral da ONU, António Guterres, que naturalmente se tem desdobrado em reuniões com dirigentes de todo o mundo, obrigando a um rastreio nas mais altas esferas de poder.
Não é a primeira vez que uma comitiva de Bolsonaro cria receios sanitários. Na última visita oficial que realizou, também aos Estados Unidos, encontrando-se em Miami com o então Presidente Donald Trump, em março do ano passado, 18 membros da delegação brasileira deram positivo à covid-19, obrigando boa parte da Administração americana a ser testada.
Felizmente, Queiroga, um médico cardiologista de 55 anos, tem a proteção de ter sido vacinado, diminuindo a probabilidade de sofrer de doença grave ou infetar outrem. Muitos outros ministros do seu Governo ou não o fizeram, ou optaram por ser inoculados em segredo.
Esse facto fora motivo de preocupação na imprensa americana, onde se ouviram críticas à própria realização da cimeira, com centenas de delegações, por receio de contágios. O caso de do Presidente brasileiro até foi mencionado pelo presidente da Câmara de Nova Iorque.
“Precisamos de enviar uma mensagem a todos os líderes mundiais, principalmente a Bolsonaro, do Brasil, que se quiser vir para cá, precisa de estar vacinado”, declarou publicamente Bill de Blasio, na segunda-feira.
Já Eduardo Bolsonaro saiu em defesa do seu pai, rotulando o presidente de câmara democrata como “marxista”, à conversa com Tucker Carlson, apresentador da Fox News. Eduardo comparou o requisito de certificado de vacinação com as políticas do regime venezuelano, queixando-se que os esquerdistas “querem controlar tudo”.
Apesar de toda esta hostilidade, ainda assim Jair Bolsonaro foi a Nova Iorque, acabando a comer pizza na rua, para driblar a proibição de entrar em restaurantes sem estar vacinado contra a covid-19. Ao seu lado estava Queiroga, fotografado de máscara no queixo, e que no dia seguinte daria positivo ao vírus.
Somando este percalço ao isolamento de Bolsonaro, que deu por si praticamente sozinho na ONU, a defender tratamentos sem eficácia provada contra a covid-19, opondo-se aos passaportes vacinais, enquanto era atacado pelos estragos que a Amazónia tem sofrido, a visita do Presidente “parece ser tudo menos um sucesso para o Brasil, os seus líderes ou a imagem do país”, notou a NPR, a rádio pública americana.