por João Maurício Brás
A história alternativa, a história ficção, o ativismo que nos impõe o ódio a nós próprios, que obriga ao julgamento do passado com as lentes do presente exige-nos: «Peçam perdão, suicidem-se, a vossa história e cultura é maléfica».
Pensemos em alguém que cresce e é ensinado a odiar todo o seu passado, os seus pais, a sua história, tudo, a partir de um viés ideológico duvidoso e repleto de rancor. A nossa cultura é demoníaca e deverá de ser purificada por uma visão de seita radical. Por exemplo, podemos elogiar a padeira de Aljubarrota, mas como uma lésbica empoderada e no Dom Afonso Henriques temos que sinalizar o machista agressor.
Penso também na tragédia do ensino da História, uma das disciplinas mais mal tratadas das últimas décadas. Mesmo os alunos de humanidades nada sabem de história. A História não é uma mera coletânea de factos ou uma fantasia justiceira, permite perceber quem somos, de onde vimos e para onde vamos. A História desde os anos sessenta foi tomado pelos marxistas (e havia excelentes historiadores marxistas com trabalhos rigorosos e sérios, o pior foi depois), as vagas posteriores dos órfãos de Marx que já não tinham o rigor e a bagagem dos marxistas originais. O seu legado foi o da destruição do sentido e do conhecimento em nome de um viés ativista, ora mais revoltado, ora mais assético. A história é para os extremismos ou a apologia delirante ou uma mitificação acrítica de fetiche ou uma história vingança, onde se devem queimar livros, destruir estátuas e conspurcar para sempre os nossos maiores feitos culturais e civilizacionais.
Lembro-me do fascínio que foi descobrir a História Nova e os Annales. Descobrir Vitorino Magalhães Godinho foi uma uma experiência fascinante. Nada ficou até dessa historiografia à esquerda mais séria, resta apenas a excrescência ativista e os seus slogans. Perguntar a jovens portugueses o que foi o liberalismo em Portugal, ou até nomes do dito ‘fascismo’ e da ‘democracia’, ninguém sabe nada. A História já não é uma ciência, mas ideologia fantasista com as culpas brancas e heteros, a divinização das efabulações sobre os géneros e a religião pós-colonialista.
Avaliarmos o ‘ensino’ da História atendendo ao conhecimento dos alunos daria um excelente guião dos Monty Python. A história-ficção e a história-ignorância substituiu a história-factual. Quem se calar é cúmplice.
Por favor desculpem-nos. Portugal foi fundado através de um ato de violência doméstica. Afonso Henriques a bater na mãe. Os antigos são um desfile de criminosos. O racista Padre António Vieira. O terrível fascista e anterior ao fascismo, Afonso de Albuquerque. O machista e sexista, Vasco da Gama. O não inclusivo e xenófobo Martim Moniz. O verdadeiro herói é a vítima construída.
Tudo o que é anterior a 1960, no mundo, e 1980 em Portugal, é retrógrado e opressor. Desconstruir e emancipar consiste em destruir. Eis o mundo totalmente histriónico e fictício. Culpem-nos, humilhemo-nos. Enfim livres.
A morte do homem não foi afinal um disparate teórico de Claude-Levi Strauss, Foucault, Althusser e amigos. Estamos ainda na fase do homem degradado e degradante, nessa sucessão de destruições. Primeiro matamos Deus, depois o homem, construímos uma caricatura de super-homem e chegaremos ao indiferenciado. Acabaremos numa produção laboratorial de células humanas e máquinas até à extinção total.