Libertem as escolas

A escola é um ensaio para a vida em todas as vertentes, até porque é nela que os nossos filhos passam a maior parte do dia. Não é saudável crescer no meio de tantas restrições já tão descabidas e pouco saudáveis.

No início deste mês, com 85% da população vacinada, chegámos à terceira e última fase do desconfinamento. Já podemos, por exemplo, juntar-nos todos em restaurantes, bares e discotecas, mas nas escolas, a única coisa que mudou – muito a custo – foi o uso de máscara no exterior. De facto já se tornava absurdo! Mas tudo o resto continua. Foi implementada uma campanha para a vacinação a partir dos 12 anos, em parte para aligeirar as medidas nas escolas mas, apesar da enorme adesão, assiste-se a uma inércia para alterar seja o que for.

Ontem o meu filho de 5 anos saiu da escola revoltado a dizer que viu meninos a empurrar o irmão de 2 anos no recreio. Perguntei-lhe se não fez nada: «Não posso, por causa da covid! Não posso passar a fita.» O absurdo para que estão a ser empurrados! Movidos pelo medo dos castigos, têm como prioridade cumprir regras, abdicando do instinto e da espontaneidade, do que é natural e desejável na aprendizagem e na vida, não só não ajudar o próximo, como não partilhar ou não se aproximar dos outros, ou seja, o oposto daquilo que mais desejamos ensinar-lhes. 

Se quem dita as normas pode pensar que não lhe fará muita diferença passar mais um ou dois anos nisto, para as crianças e jovens já não é bem assim. Estas alterações do dia-a-dia poderão ter consequências bastante negativas. 
Ultimamente fala-se muito da importância do pré-escolar, pois se as medidas nas escolas não mudarem rapidamente, há crianças que vão passar esses três anos de ouro num ambiente muito pouco saudável.

O mesmo podemos dizer dos mais pequeninos, no berçário e na creche, numa altura em que a relação é primordial e a comunicação é feita constantemente com rostos meio tapados. E também dos mais velhos, que enquanto os pais estão sem máscara no local de trabalho, passam o dia de máscara na sala, seguem regras de circulação em espaços de recreio e corredores, veem-se proibidos de se aproximar livremente uns dos outros, de estar com outras turmas, outros anos, de namorar. Que passaram meses tapados, numa idade em que a aparência física é tão valorizada. A escola não serve só para lecionar, serve para nos relacionarmos com os outros, para aprendermos a sociabilizar, a ser espontâneos, a arriscar, a ousar a nossas crescentes liberdades, a experimentar, a apaixonarmo-nos, a sermos melhores pessoas, a descobrir. E até a pisar o risco. Tudo num contexto protegido. Mas não de policiamento. A escola é um ensaio para a vida em todas as vertentes, até porque é nela que os nossos filhos passam a maior parte do dia. Não é saudável crescer no meio de tantas restrições já tão descabidas e pouco saudáveis.

Se na idade adulta estes distanciamentos e regras são prejudiciais, na infância e juventude, em pleno crescimento, quando há interiorização de normas e valores, formação e aprendizagem constantes, impor uma realidade doente e obrigar as crianças e jovens a crescerem nela só para não aumentar o número de casos de pessoas infetadas – quando eles são os que menos transmitem e menos adoecem com este vírus – é quase pecaminoso. E de um enorme egoísmo. Não são só uns anos, estamos a usar a sua infância ou juventude, que já não voltam. São anos fulcrais que influenciam o desenvolvimento e o futuro de cada um.

Como pedir que os nossos filhos – dos mais pequenos aos mais velhos – respeitem tantas regras quando ninguém parece preocupado em respeitá-los?