Por Sofia Aureliano
Os tempos são conturbados. Foi o governo socialista que viu o seu Orçamento ser chumbado. Foi a gerigonça de esquerda que chegou ao fim. Mas é à direita que os partidos andam “às aranhas”, com dificuldade em acertar agulhas e em constituir boas alternativas de poder para apresentar a votos nas eleições antecipadas. Mais do que o caos (que se pode vir a instalar), reina agora a incerteza.
1. O fim do CDS? É angustiante ver aquilo em que o CDS se tornou. Um partido que apresentava o melhor rácio de bons quadros por metro quadrado, entre deputados, assessores, dirigentes e militantes, vê-se agora numa experiência inédita de quase morte. Porquê? Porque a liderança cedeu à batota, está agarrada ao poder e quer, a todo o custo, ir a votos nas próximas legislativas. Como se a situação atual fosse o melhor cartão de visita para o partido. Longe disso! Diria mesmo que a sobrevivência do CDS depende da capacidade que o partido tenha de mudar de líder, regenerar-se e apresentar, no boletim de voto, uma alternativa refrescada, que represente tudo aquilo que a atual liderança não é: forte, convicta, credível.
Em contrarrelógio, tal sobrevivência não parece viável. O que é uma pena. Porque o CDS que eu admiro conta com alguns dos profissionais mais bem preparados com quem já trabalhei. Apesar da pontual distância ideológica em determinadas temáticas, sobretudo ao nível dos direitos fundamentais (em que, por vezes, nos encontramos nos antípodas), o CDS é o parceiro natural, positivo e lógico do PSD.
Não falo do CDS de “Chicão”. Falo, sim, do de Paulo Portas ou de Assunção Cristas, que elenca elementos de excelência como os cinco deputados com assento parlamentar no fim da última sessão legislativa. Os lugares cabiam nos dedos de uma mão, mas estas pessoas, dotadas de grandes capacidades profissionais, boa oratória e instinto político, reforçadas por uma entourage de peso, conseguiram invariavelmente marcar a sua presença e fazer vingar a sua opinião. Eram poucos, mas enchiam qualquer sala. Com manifesta qualidade.
Se este CDS desaparecer, o sistema político fica garantidamente mais pobre, a classe política desperdiça importantes representantes e perdemos todos, com um ataque cobarde à nossa Democracia.
2. A saudável perceção do inimigo coletivo. Se há coisa que o Partido Socialista faz bem, e que o PSD devia aprender a fazer, é unir-se internamente, perante a iminência de ataque do exterior. A teoria sociológica diz que a perceção de um inimigo coletivo tende a aumentar a coesão de um grupo. O comportamento do PS comprova exatamente isso: pode haver acesa disputa interna, variadas fações, grupos (pseudo) dissidentes, figuras proeminentes que evidenciam descontentamento. No momento da verdade, o PS apresenta-se uno e coeso, contra tudo e todos. Mais forte, mais resiliente e praticamente impenetrável.
No PSD, tradicionalmente, isso não acontece. Mesmo que se tentem demonstrar reinventadas alianças no período de pós disputa interna, soa sempre a fingimento e a dissimulação. Não há um foco genuíno no inimigo externo, nem a assunção de que esse deve ser o único alvo a abater. Pelo contrário, resiste uma névoa de descrença, uma aura distorcida inevitavelmente à espera da queda do gigante. E, ao primeiro cambaleio, ergue-se de novo a discórdia, a rutura, a laceração. Não contra quem devia existir, mas visceral e interna. Que é dilacerante, corrompe e devasta. Tornando o partido cada vez mais fraco e de propósito mais torpe. Quem ganha com isto? Certamente, não ganha o partido, nem ganha o país. Ganha, sim (e muito!), a oposição.
3. O PSD que os militantes desejam. Há uns anos, quando o então primeiro-ministro Pedro Passos Coelho disse a emblemática frase “que se lixem as eleições”, foi maltratado e agredido pelas bases do partido, acusado de colocar o PSD em segundo plano. Fê-lo enquanto chefe de governo, a bem do interesse nacional, numa conjuntura, no mínimo, tão exigente como a atual.
O que Rui Rio diz, neste momento, não se afigura muito diferente. Aliás, o atual líder social democrata fez questão de sublinhar aquele que é o seu inequívoco entendimento, mesmo na oposição: primeiro está o país, depois o PSD.
Desta vez, as reações das bases parecem ter sido menos inflamadas e não houve direito a grandes acusações. Poderá isto significar que finalmente os militantes do PSD atingiram a maturidade política e compreenderam o alcance das palavras de Passos Coelho. De tal forma que agora conseguem até concordar com ele. Talvez a verdade seja menos nobre do que isso. Mas, se assim é, lamento apenas que tenham “chegado” tão tarde.
O que parece que não reúne consenso é o significado de “o melhor para o país”.
Rui Rio acha que é não haver disputa interna pela liderança do PSD, porque isso traduzir-se-ia em menos preparação do partido para as eleições gerais (e a vitória do PSD é inequivocamente o melhor destino para Portugal). Paulo Rangel defende exatamente o contrário: nada fará mais pela Democracia e pelo país do que o líder do principal partido da oposição se apresentar a eleições reforçado e legitimado pela vontade dos sociais democratas.
Seja quem for que tem razão, o cenário provável é que efetivamente as eleições internas sejam disputadas e que os militantes sejam convidados a dar a sua opinião a 4 de dezembro.
Em vez de uma sugestão de sentido de voto (que, no meu caso, será pessoal, secreto e intransmissível), deixo o meu melhor conselho para o dia seguinte: organizem-se! Com mais ou menos tempo, ganhe quem ganhar, é fundamental que o partido se mostre genuinamente unido e coeso no momento da campanha eleitoral. Só assim terá reais hipóteses de disputar uma maioria contra o Partido Socialista.
Para facilitar este bom clima que é, acima de tudo, desejável, importa que a campanha interna seja digna, limpa e focada no que interessa: as propostas de cada candidato a líder para o futuro do partido e do país. Porque as questões de caráter serão avaliadas no comportamento dos candidatos na disputa pelo poder. Como disse Anne Frank, é na adversidade e na disputa que se conhece o verdadeiro caráter de uma pessoa.
Não nos iludamos: também os militantes do PSD vão escolher o seu líder pela forma de estar e de fazer política. Será, por isso, premiado o respeitoso debate de ideias e a salutar competição. E serão reprovadas quaisquer jogadas sujas e intentos menos sérios.
Não há que temer o resultado. Vencerá quem a maioria quiser que vença. Ou seja, vencerá sempre o PSD.