Continuamos a assistir a uma inércia generalizada e apatia por parte dos tribunais para combater a violência doméstica em Portugal. Para além de ter realizado a minha própria campanha de alerta no dia 25 de Novembro, fui mostrar a minha indignação pessoalmente com um mar de mulheres e homens para o largo do Intendente. Começou de fininho e acabou em grande. No entanto, já não pode ser nos largos, nem nas ruas, mas tem de começar na porta dos tribunais que não nos protegem!
«A violência doméstica matou 19 pessoas nos primeiros nove meses do ano, mas levou também mais de 31 mil a serem atendidas e outras duas mil a serem acolhidas na Rede Nacional de Apoio às Vítimas de Violência Doméstica.»
Em relação às mulheres mortas em contexto de violência doméstica, seis já tinham apresentado queixa, o que demonstra o total desprezo do sistema judicial, na forma de resolver e tratar esta catástrofe. Nada que não aconteça todos os anos! O facto de 90% das penas, serem suspensas, demonstra que as atitudes que os juízes tomam dentro da sala dos tribunais, são exatamente as palavras que eles dizem dentro da nas mesmas: «Que a violência doméstica é um problema de casal». E enquanto, continuarmos a aceitar sentenças em que mulheres são espancadas, agredidas, e em a apatia se desenvolve em nós ao ouvir «pena suspensa», ao invés de nos manifestarmos, cada vez que sai uma possível sentença de morte para a agredida, iremos continuar ano após ano, a chorar os cadáveres e as suas horrorosas autópsias.
Houve 40 tentativas de homicídio, em contexto de violência doméstica. Se o sistema faz campanhas que não conseguem chegar aos olhos do sistema judicial, e as mulheres não possuem proteção, meios, e são atacadas de todas as formas, ou para que desistam das queixas (60%) ou para que acabem mortas, somos nós, a sociedade civil e os artistas, advogados e ativistas em conjunto com os deputados que temos de continuar a empurrar o barco para a frente, fazendo uma pressão social sem precedentes para que se modifiquem mentalidades. Se passamos leis, e é permitido aos juízes em geral não as respeitarem, pondo em risco crianças que não são meros espetadores e são já consideradas vítimas mas elas também agredidas a continuar a viver com os agressores, o que é que isto diz, sobre a classe de juízes portuguesa?
Pior, o que é que isto diz, sobre nós, que assistimos, a esta autêntica barbárie sem limites sem fim a acontecer no nosso país? Da próxima vez não será no largo, será na porta do tribunal, já estamos fartas de ter de morrer e renascer de novo, pelas mulheres que deixam filhos órfãos e mães e pais que choram a morte das suas filhas/os!