Tem-se criado em mim uma profunda convicção sobre a forma como está a evoluir a Igreja Católica: estamos a tornar-nos, cada vez mais, protestantes!
Quero, antes de mais, dizer que não tenho nada contra os protestantes ou contra o protestantismo. A grande conquista da modernidade foi, de facto, o desejo de liberdade e, de forma particular, o exercício da liberdade de religião. Hoje, cada um pode ser o que quiser. No entanto, se os católicos se tornarem protestantes, acaba-se o direito de opção.
As nossas tradições. As nossas doutrinas. Os nossos ritos. A nossa vida. Tudo faz parte de um património que enriquece o cristianismo. Enriquece o mundo!
Esta semana houve um debate sobre o futuro da Igreja Católica numa televisão nacional e parece-me que foram tocados todos os pontos de maior interesse para resolver nos próximos tempos no seio do catolicismo.
Mas a sério? A sério que o problema da Igreja é a pedofilia? A sério que o problema da Igreja é o celibato ou a ordenação exclusiva de homens? A sério que se ordenarmos homens casados vamos deixar de ter pedófilos e se ordenarmos mulheres vamos deixar de ter um desequilíbrio de género e de abuso machista?
O próximo sínodo vai mesmo resolver todos estes problemas? Mas não era o Concílio Vaticano II que devia ter resolvido esses problemas? Porque ainda estamos a dizer que faltam mais coisas? Ou será que queremos dar maior poder a um sínodo do que damos a um concílio?
Eu, na verdade, tenho muitas dúvidas! Mas há anos! Eu diria: desde sempre que tenho muitas dúvidas e tenho muito poucas respostas para todas estas questões.
Vivo num terreno movediço que é a cultura contemporânea e o desejo de a compreender e, ao mesmo tempo, a procura constante de partilhar o depósito da fé cristã numa linguagem capaz de iluminar a minha vida hoje e, desta forma, a vida daqueles que procuram a Igreja Católica.
O depósito da fé cristã não é um organismo morto que se formulou no passado e que deva ser transmitido de forma amorfa. O depósito da fé é uma realidade viva que se vai enriquecendo cada vez mais nas reformulações sucessivas. É como se o processo de inspiração ocorresse na vida da Igreja ao longo dos séculos. Isso o vemos, por exemplo, nos concílios e nos sínodos em que a Igreja, vendo-se confrontada com determinada questão, delibera de forma clara o que pensa acerca do assunto.
Luto para que haja a capacidade de comunicar o depósito da fé numa linguagem simples e capaz de iluminar a existência humana, isto é, a capacidade de o homem compreender os acontecimentos da sua vida, de se encontrarem consigo e com Deus. Tudo isto, porque acredito que a chave da compreensão da vida humana está em Deus.
Esta convicção de que nos estamos a tornar protestantes é não apenas na teologia que se tem produzido, mas principalmente pela prática cristã. Tudo o que neste momento se vai debatendo como sendo a salvação da Igreja é, no fundo, a progressiva protestantização do catolicismo. No fundo, estamos a dizer que a Igreja Católica está quinhentos anos atrasada.
Eu, como acima referi, não tenho qualquer problema com o protestantismo e, aliás, admiro muito do que se produz, hoje, na teologia e na prática protestante, mas não posso deixar de lamentar que se deite o catolicismo ao anátema.
Sinto que há muitos católicos que estão a descobrir que são protestantes e isso é bom. Descobriram a sua vocação cristã. Não são católicos! Não há problema! Tranquilos! Mas deixem-nos ser apenas católicos!