Por Nélson Mateus e Alice Vieira
Querida avó,
Cá estamos nós a viver as últimas horas de 2021. Mais um ano atípico. Muitos estavam convencidos que todos os problemas relacionados com a Covid-19 ficavam no ano anterior.
Mas, infelizmente, veio a comprovar-se o contrário! Começámos o ano com praticamente 3 meses de confinamento. Uma canseira, mete máscara, tira máscara …perdi a conta a quantas zaragatoas me enfiaram pelas narinas acima até agora. Felizmente, sempre com resultados negativos. Todos estamos desesperados por virar a página deste assunto. Mas não me parece que esses dias estejam para breve. As pessoas da tua idade já vão na 3ª dose da vacina. As da minha idade prevê-se para breve mais uma dose. Daqui a um ano, quando estivermos a fazer o balanço de 2022, veremos o ponto da situação em relação a tudo isto.
Mas, apesar de tudo isto, não posso dizer que 2021 não tenha sido um ano memorável.
Foi durante o confinamento que fizemos o nosso livro Diário de uma Avó e de um Neto Confinados em Casa, que chegou aos pontos de venda nos finais de agosto. Se muitos vão na 3º dose da vacina, o livro tem tido um sucesso tão grande, que, em poucos meses, vai a caminho da 3ª edição.
A exposição Retratos Contados de Alice Vieira, da qual tenho o privilégio de ser Curador, inaugurou na Ericeira, passou por Lisboa, pela ForEver Art Gallery, esteve no Casino Estoril, e, para terminar o ano da melhor maneira, está patente em Torres Novas, mais uma das tuas terras.
A exposição Retratos Contados de Ruy de Carvalho inaugurou com estrondo na casa do Artista, também passou pela ForEver Art Gallery, e termina o ano em Leiria.
Organizei a festa de Aniversário dos 85 anos de Anita Guerreiro.
Como tal, não me posso queixar! Só agradecer à vida e a todos os que me ajudaram a tornar sonhos em realidades.
Como dizes tantas vezes «Saúde e Paz», o resto a gente faz.
Espero que em breve possamos viver os loucos anos 20 deste século.
Bom ano querida avó.
Bjs
Querido neto,
E cá estamos no fim deste ano. Ainda um ano terrível – mas esperemos que o próximo seja, ao menos, ligeiramente melhor. Como se costuma dizer, a esperança é a última a morrer.
Apesar de tudo, tu ainda recordas coisas boas que também aconteceram – o nosso livro, o êxito que tem tido, as tertúlias para que temos sido convidados, as exposições na Ericeira, Estoril, Torres Novas.
Claro, tudo isso é verdade, e não podemos esquecê-lo.
Mas, para mim, foi também um ano em que perdi muitos amigos.
Quase todos os dias morria um. Foi terrível. A última foi a Leonor Xavier. Deves lembrar-te dela: foste comigo a um daqueles encontros que ela organizava na Capela do Rato, onde, em cada semana, juntava um crente e um não crente para conversarmos. Para além de ser uma pessoa de uma fé inabalável, era também muito divertida. Às vezes estávamos ao telefone até de madrugada. «Achas que alguém é capaz de estar como nós, na converseta, até altas horas?». Ríamos muito – e continuávamos. E organizava tertúlias em casa dela – aí nunca foste… – com gente de todos os partidos, e aí todos nos dávamos muito bem. Vai fazer-me muita falta.
E agora está a acontecer-me uma coisa terrível. Às vezes vejo qualquer coisa na rua, ou na televisão, e pego no telemóvel para falar disso a um amigo que eu sei que sabe do que estou a falar. Começo a ligar – e depois desligo: já morreu. E vou ligar para outro: também já morreu. Acabo por guardar o telemóvel. E acredita que há assuntos que eu agora já não posso partilhar com ninguém. Por exemplo: eu tinha um amigo que todas as noites me ligava a contar uma anedota, para eu passar a outro amigo nosso – e o último acabava sempre por contar ao primeiro, e ríamos muito. Era uma palermice, claro, mas gostávamos de fazer aquilo. Já morreram todos.
Mas vamos pensar em coisas positivas: provavelmente, em 2022, vão haver muitas mais edições do nosso “Diário” e novas temporadas. Afinal, assuntos nunca nos faltam!
Bom ano!