O Presidente Jair Bolsonaro enfrenta um cenário de pesadelo nas eleições presidenciais de outubro de 2022. Depara-se com um Inácio Lula da Silva livre e favorito na corrida, que não só luta para vencer, como pode até fazê-lo de uma forma esmagadora, logo na primeira volta, estando com 48% das intenções de voto, segundo uma sondagem recente da Datafolha, publicada pela Folha de S. Paulo, que dá ao Presidente brasileiro uns meros 22%.
Se muitos brasileiros descontentes com o Presidente – 63% desaprovam a sua governação, segundo uma sondagem do Poderdata – já cantam vitória, outros recomendam cautela. É que Bolsonaro «chegou onde está com todo mundo o subestimando», lembrou cientista político Creomar de Souza, professor da Fundação Dom Cabral, à BBC Brasil.
O facto é que, Bolsonaro tem sido acossado por tragédias como a escalada da inflação, o regresso da fome – num dos maiores exportadores de alimentos do mundo, 19 milhões de pessoas vivem com fome e metade da população, uns 116 milhões, sofrem de insegurança alimentar, segundo dados da Rede Penssan – e quase 620 mil mortes por covid-19, boa parte delas preveníveis caso o Governo federal tivesse agido, denunciam os seus opositores.
No entanto, «o que o Presidente tem feito é jogar a conta da inflação no discurso do ‘fique em casa durante a pandemia’», realçou de Souza. «Me parece ser uma manobra muito difícil, mas não é uma manobra que não possa colar», considerou, notando que Bolsonaro dispõe de uma extensa rede de apoiantes com grande presença nas redes sociais ou em canais de comunicação como o WhatsApp, prontos a disparar fake news. «Não podemos trabalhar com a ideia de que o eleitor é invulnerável a perceções que nós não consideremos objetivas da realidade», apontou o cientista político.
Além disso, o Presidente pode muito bem apostar tudo em tentar reverter a tragédia social em ano eleitoral, expandindo apoios devido à pandemia ou o programa Bolsa Família, como fez no início deste mês, aprovando o uso de 64 mil milhões de reais (10,2 mil milhões de euros). Aliás, Bolsonaro fez questão de mudar o nome do Bolsa Família, muito associado ao Governo de Lula, que aprovou o programa em 2003.
Contudo, por agora Bolsonaro claramente continua muito mal posicionado para as eleições. E ainda tem o risco adicional de ver parte da sua base eleitoral roubada por uma eventual candidatura de Sérgio Moro. Este velho aliado, seu antigo ministro da Justiça, o grande rosto da Operação Operação Lava Jato, que resultou na prisão de Lula da Silva, impedindo-o de concorrer às anteriores presidenciais, está com 9% das intenções de voto.
Mais que eleitorado, o grande perigo que Moro representa para Bolsonaro é a perda de apoio das elites e, como tal, de fundos de campanha.
«A única estrutura que ainda o sustenta é a figura já fragilizada de Paulo Guedes», notou o politólogo André Rosa, ao Correio Braziliense, referindo-se ao ministro da Economia, proponente de políticas neoliberais – que certamente não achará piada a que o Presidente aposte em apoios sociais – e que se viu envolvido no Pandora Papers.
Para piorar a situação de Bolsonaro, desta vez até a direita tradicional se vira contra ele, através do governador de São Paulo, João Dória, que se rebelou contra o Governo federal, furioso com a sua gestão da pandemia.