Por Luís Paulino Pereira, médico
Já se percebeu que o problema pandémico da covid-19 está para continuar. Há mesmo quem admita que, antes de 2024, não nos vamos livrar dele, por se pensar que só nessa altura será atingida a imunidade de grupo a nível mundial. Vale o que vale, pois certezas ninguém tem.
Seja como for, há um ponto em que toda a gente está de acordo: temos de aprender a viver e a ‘conviver’ com ele já que, com ou sem coronavírus, a vida continua. Então, o que fazer? A questão vai colocar-se cada vez mais, e são precisas respostas claras, concretas e inequívocas. E se a resposta ideal não existe, como havemos de proceder? Aí não me parece haver dúvidas: apenas com bom senso.
Esta ‘fórmula’, um pouco vaga e talvez abstrata para muitas pessoas, é a única que nos pode valer na travessia deste deserto de incertezas. Mais do que isso não está ao nosso alcance, visto que – como diariamente reconhecemos – o mundo não encontrou ainda a forma adequada de combater o vírus.
Presentemente, continuamos a identificar pessoas irresponsáveis, desleixadas, incrédulas, que não cumprem as suas obrigações cívicas nem respeitam diretrizes anunciadas a toda a hora. São os que não acreditam nos efeitos da pandemia e julgam que nada lhes vai acontecer, recusando, inclusive, as vacinas, até ao momento a única ‘via’ no caminho para a liberdade.
Conheço casos nestas condições que, por mais que se lhes faça ver o perigo que correm, permanecem irredutíveis, convencidos de que o seu caminho é que está certo.
A este grupo opõem-se os que pensam precisamente o contrário e vivem em pânico o dia-a-dia, num stresse constante, com medo de se infetarem – adotando estilos de vida fora do comum e fazendo testes por tudo e por nada, julgando que assim é que é correto.
Ainda existe outro setor: os que se isolam do mundo, fugindo de tudo e de todos, vivendo em segundas habitações onde não entra ninguém, qual Big Brother para covid, com compras feitas online, evitando qualquer tipo de contacto.
Em minha opinião, a todos estes grupos falta o inevitável bom senso. Os primeiros são quanto a mim inconscientes – e enquanto não forem atacados pelo coronavírus nunca entenderão a forma de estar na vida dos outros. Estão entregues à sua sorte, mas é a sua opção.
Quem vive em stresse constante, com medo de tudo e de todos, também corre outro tipo de riscos. O stresse e a ansiedade são por si só fatores de risco da doença coronária e cérebro-vascular – e, se as preocupações são levadas ao extremo, quem ‘não morre da doença pode morrer da cura’, como diz o povo. Convém ter presente que proteção a cem por cento é coisa que não existe, e por maiores que sejam os cuidados que se tenham há sempre possibilidade de uma infeção.
Viver longe do mundo é uma maneira de encarar a vida que não é a minha mas que respeito, tal como as anteriores. Conheço pessoas que se encaixam neste grupo e já pude comprovar que a capacidade psíquica é logo afetada, como não podia deixar de ser.
As pessoas, quando reaparecem, estão ‘paradas’, pouco comunicativas, desinteressadas, revelando os estigmas do isolamento. E, embora em menor grau, também não estão livres de uma ‘surpresa’.
Quanto aos testes, muito se poderá dizer, até por que há uma forte campanha para serem feitos regularmente. É um facto que podem ter um papel decisivo para travar surtos, mas não passam de exames complementares de diagnóstico e não são remédio para evitar a doença. Poder-se-ão justificar quando se frequentam ambientes fechados, com muita gente, e somos forçados a tirar a máscara. Mas o abuso desses instrumentos laboratoriais, à semelhança do que muita gente faz noutros contextos – andando constantemente a medir a pressão arterial, a controlar o peso, a verificar a temperatura e a fazer análises – leva a que se instale a confusão e não conduz a nenhuma conclusão definitiva.
Pela nossa parte, só temos de respeitar as regras impostas e, acima de tudo, não adotar comportamentos de risco. Para minimizar eventuais contágios, a solução possível passa pelo procedimento de cada um, onde prevalecerá sempre a sensatez, essencial para se lidar com a situação.
Um pouco por tudo isto, neste momento carregado de dúvidas e de interrogações, se dependesse de mim modificar fosse o que fosse, começava por lançar numa só frase o apelo que considero mais importante: «Bom senso, precisa-se!».