No próximo domingo, decorre o voto antecipado para as legislativas. O primeiro round de umas eleições que acredito que, qualquer que seja o resultado, poderão ser históricas. A polarização existente e o (à primeira vista, paradoxal) número elevado de partidos que terão assento parlamentar depois de 30 de janeiro fará com que vários cenários de governação ou viabilização governativa se coloquem em cima da mesa, numa tentativa de alcançar a estabilidade. Algumas das combinações que agora se anteveem possíveis não se imaginavam exequíveis há uns anos. Nem eram sequer conjeturáveis. E, no entanto, tudo está em negociação. É a democracia a funcionar e a permitir a combinação de todas as variáveis. Acima de tudo, é um privilégio viver estes tempos políticos.
Não há certezas sobre o que ditarão os resultados eleitorais, e quem as diz ter ou está em pleno exercício de oratória ou tem poderes de adivinhação. Ao comum dos mortais, resta expressar feelings e fazer apostas. Ou acreditar, se defendermos assertivamente uma cor política. Como é o meu caso. Mais do que achar que a conjuntura levará à vitória do PSD, o que tenho é esperança que ela aconteça. Porque manda a minha veia académica que não confie no racional daqueles que me parecem ser sinais e evidências, quando a minha observação pode padecer de enviesamento. Nesta reta final, fico-me (cautelosamente) no campo da fé.
1. O debate dos debates.
Entre mais de três dezenas de debates, destacou-se naturalmente aquele que se esperava que se destacasse, de formato mais longo e propositadamente combativo, que opôs os dois putativos candidatos a primeiro-ministro. Costa vs. Rio já foi sobejamente comentado e analisado, dos gestos à indumentária, do estado de espírito ao estilo mais ou menos bonacheirão dos protagonistas. No balanço, foi quase unânime a opinião sobre quem ganhou (à exceção do PS e daqueles que não beneficiam com a vitória de Rio, todos concordaram que o líder do PSD esteve melhor). Há até quem diga que Rui Rio pode ter dado ali o Knock out final com um sprint decisivo para a vitória a 30 de janeiro. É possível. Diria até que possa ser provável (se não soubesse que a fé me pode toldar o pensamento).
Mas uma coisa foi evidente: Costa ganhou no campeonato de quem mais mente. Depois de seis anos no poder, seria de esperar que o líder do governo tivesse alguns factos reais para apresentar e se escudasse de recorrer às inverdades. Por desespero ou taticismo, fez o contrário. Usou e abusou do tempo de que dispunha para elencar um chorrilho de mentiras, ora sobre o estado do país e as suas opções de governação, ora sobre as alegadas entrelinhas que o programa do PSD inclui, mas só o PS consegue ver. A estratégica compra da TAP para evitar a falência, o exponencial aumento do salário médio dos portugueses nos últimos anos de governação socialista, e até o pedido de maioria absoluta nas legislativas anteriores (que Costa jura a pé juntos que nunca fez) são exemplos das ilusões que o líder socialista tentou vender.
Costa saberia que seriam desmentidas, obviamente. Mas nunca a verdade seria ouvida pelas 3,3 milhões de pessoas que assistiram ao debate. Por isso, por umas centenas de votos vale a pena comprometer a dignidade da palavra dada. Certo?
Perdido por cem, perdido por mil. Mas, no final, quem perde mais é toda a classe política.
2. Metsola na Presidência do Parlamento Europeu.
A eurodeputada maltesa Roberta Metsola, do Partido Popular Europeu, foi ontem eleita com maioria absoluta para a Presidência do Parlamento Europeu, na primeira volta. Concorreu com mais três candidatos: a sueca Alice Bah Kuhnke (dos Verdes/Aliança Livre Europeia), o polaco Kosma Zlotowski (Conservadores e Reformistas Europeus), e a espanhola Sira Rego (Grupo da Esquerda); tendo arrebatado 458 dos 690 votos.
Apesar de jovem, Metsola transmite grande credibilidade e segurança, e tem uma agenda ambiciosa. A terceira mulher a ocupar a liderança da assembleia europeia promete trilhar um caminho de proximidade com os cidadãos, fomentando um revigorado sentimento de pertença ao projeto europeu.
Esperamos que seja bem sucedida nos seus intentos, porque é urgente combater os crescentes movimentos antieuropeístas e as narrativas exacerbadamente nacionalistas que têm vindo a proliferar pelo Velho Continente.
3. O direito de não dar palco. É mais do que percetível o desdém que Ricardo Araújo Pereira tem pelo Chega, ainda mais evidente o desapreço por André Ventura. Faz questão de não o esconder, sempre que é convidado a opinar ou faz comentário político em jeito de rábula humorística. E, tratando-se de formatos de entretenimento e não de informação, como é o “Isto é Gozar com quem Trabalha”, sobre o qual tem poder de decisão programático, não está a quebrar nenhuma norma quando escolhe não dar palco a este protagonista em particular.
Ainda que assim seja, fica a pergunta: será que bani-lo tem melhor efeito prático nessa tentativa de branqueamento, do que tratá-lo como os demais e convidá-lo para o seu jogo, tendo total controlo sobre as regras? Não seria mais eficaz RAP convidar Ventura e, caso ele tivesse o arrojo de aceitar (acredito que sim, porque o seu ego o trairia e não permitiria que vislumbrasse qualquer risco de cair numa armadilha), encurralá-lo com a inteligência que o caracteriza? Assumir que não o convida não é dar-lhe mais palco? Distingui-lo entre os outros como o agrilhoado não é perversamente destacá-lo como vítima de um sistema injusto que ele tenta combater?
Ricardo Araújo Pereira devia ter pensado duas vezes. Tinha a faca e o queijo na mão para realmente entalar Ventura no enredo das suas próprias fraquezas, incoerências e contradições. E tem o engenho para o fazer de forma brilhante.
Assim, acabou por endeusá-lo, fortalecendo-o perante a sua comunidade, já evangelizada, de descontentes e oprimidos.