Por Elsa Severino, arquiteta paisagista
Em plena época eleitoral todas as forças políticas inscrevem nos seus programas causas ambientais, que remetem para um plano mais vasto das alterações climáticas.
Mas o que se passa em Portugal? Sabemos da inter-relação dos fenómenos ambientais a um nível global, mas isto não invalida que não tenhamos de fazer o nosso trabalho de casa. O território português é um livro aberto, no qual vemos todas as opções que fizemos nas últimas décadas, e que nos abriram caminho para um certo caos ambiental hoje instalado, mercê da inércia do Estado e da ausência de regras objetivas, consequentes e enquadradas na lei, para os privados.
Estamos em janeiro e em período de seca. Sempre aconteceram estes fenómenos cíclicos, mas a cada ano serão piores as consequências.
Sabemos da importância da floresta clímace na conservação do solo e da água, mas a dura realidade em Portugal é a cavalgada do eucalipto no mundo rural. Quem percorre a A23, na zona de Abrantes, uma das regiões onde se registam as mais elevadas temperaturas no verão, observa estupefacto a recente plantação de eucaliptos, em montes e vales sem qualquer ordenamento, sem a devida proteção das linhas de água, das cabeceiras dos montes, garantindo a infiltração água da chuva e a tão necessária recarga dos aquíferos e nascentes, e a manutenção da biodiversidade. Temo que após os três cortes que o eucalipto permite, daqui a 30 anos, teremos uma paisagem desértica. O Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), deveria intervir urgentemente, pois tem toda a legitimidade para isso, já que na Constituição Portuguesa está consagrado o «direito a um ambiente sadio e ecologicamente equilibrado, cabendo ao Estado promover o aproveitamento racional dos recursos naturais, salvaguardando a sua capacidade de renovação».
A par da desertificação, cresce o despovoamento. Recentemente, algumas famílias estabeleceram-se nas zonas rurais, mas temo que após viverem o drama dos fogos florestais, especialmente ativos após um período de seca, abandonem os campos mais uma vez, rumo à cidade, que abominam, pois o urbanismo dos subúrbios não é amigável para as pessoas.
As florestas clímaces, com o seu manto vegetal, deveriam cobrir zonas declivosas, segurando-lhe o solo e aumentando a sua fertilidade, a infiltração da água da chuva, evitando a torrencialidade, mas também na proteção das linhas de água e decisivamente protegendo as bacias hidrográficas dos nossos rios. Esta floresta não sendo rentável a curto prazo, é da maior importância para a gestão da água, entre outros fatores já enunciados, devendo por isso ser apoiada estatalmente.
O aumento das disponibilidades de água útil é das maiores exigências dos tempos atuais, tanto para a agricultura, para a indústria, como para os gastos domésticos, mas também para a fixação e bem-estar da população em meio rural e não só. Fala-se do aumento da energia, com especial impacto na indústria, mas esquecemos os efeitos dramáticos das secas, fenómeno recorrente em Portugal. Temos de saber ler a paisagem e retirar conclusões; quando ouvimos dizer que as nascentes estão a secar no chuvoso Norte de Portugal, e que as formações clímaces estão em declínio, isso deveria constituir um alerta, porque das boas ou más ações sobre o território depende o nosso nível de vida e a prosperidade do país, que não passa pela aplicação de ‘fundos de resolução’. Assim, como as cheias não são só o resultado da forte precipitação, também a seca não é só fruto da ausência desta, mas de um país que não faz uma correta gestão da água.