«Quando falei no prolongamento da linha, sabia que é lógico e normal que ficasse uma estação aqui na Estrela. Podia ser no Hospital Militar ou noutro lugar. Estou é a ver os problemas que isto vai trazer», começa Manuel (nome fictício). O septuagenário, que vive no primeiro quarteirão da Calçada da Estrela, em Lisboa, desde que nasceu, relatou ao Nascer do SOL o impacto das obras daquela estação de Metro no bairro.
«Ao longo desta vida que vou tendo, quando penso no que vem a seguir… Na maioria das vezes, preferia não ter razão», refere, adiantando que no início desta semana conversou com lojistas que lhe disseram que ainda não começaram a ser construídos os túneis por debaixo dos prédios. No entanto, os problemas têm vindo a agravar-se e cada vez mais brechas surgem em edifícios próximos da estação.
«Por exemplo, há uma família que tem uma casa no exterior e procurou fugir. Há crianças pequenas e não aguentaram mais o barulho, até porque já se abriam rachas no quintal», avança, destacando que os habitantes até podem sentir-se felizes com o futuro da Estrela por virem e beneficiar do Metro, mas nem todos estão dispostos a passar por agruras até esse dia chegar.
Manuel realça que existem quatro situações a que tanto o poder local como o central devem estar atentos, pois provam que aquela zona está tudo menos preparada para suportar uma obra de tamanha envergadura. «A meio da Calçada resolveram construir os prédios recuados, mas só fizeram num porque era quase uma missão impossível transformar todos. Um deles, que é muito mais recente do que os de azulejo, é o do colégio ‘O Nosso Jardim’ e teve de ser evacuado», observa, notando que o colégio se encontra agora sediado na Rua da Bela Vista à Lapa, a pouco mais de 300 metros.
«Quando fizeram as novas instalações do ISEG, uma empena ameaçou ruir, a que dá para a Miguel Lupi. Isto é, o prédio de esquina, que estava naquele cotovelo muito perto das novas instalações, ameaçou cair se a empena caísse. Então as casas foram evacuadas. O trânsito da rua Miguel Lupi esteve impedido durante muito tempo», aponta, falando da rua que dista aproximadamente 400 metros do centro da Estrela, realçando um terceiro ponto: o das obras no Terreiro do Paço, a poucos quilómetros da Estrela.
«Numa das torres, havia serviços do Ministério das Finanças e as pessoas tiveram de sair com urgência, tanto que os militares puseram lá uma ponte metálica. Os transportes públicos passaram a circular na Rua do Arsenal e só após passarem o sítio onde tinha havido o desnível é que passavam novamente no sentido inverso», indica, aludindo a acontecimentos que tiveram lugar no ano de 2000, quando os trabalhos sofreram um aluimento de terras que atrasou o prolongamento da linha azul até Santa Apolónia, com inauguração prevista para o fim de 2001, «e obrigou a uma ligeira deslocalização da estação», como frisava a TVI a 16 de julho de 2004.
«Depois de terminada hoje a betonagem da laje do fundo da estação, estão finalmente reunidas as condições de segurança para concluir a obra, sublinhou o ministro. De acordo com o ministério, a estação «é agora uma estrutura estanque, capaz de suportar as solicitações hidroestáticas que estiveram na origem dos acidentes» que obrigaram à inundação do túnel, que só em Janeiro de 2003 foi totalmente esvaziado», noticiou a estação televisiva de Queluz de Baixo, sendo que este ponto está diretamente ligado ao último que Manuel pretende que seja tido em conta pelo Metropolitano de Lisboa, pela Junta de Freguesia da Estrela, pela Câmara Municipal de Lisboa e por todos os órgãos e entidades envolvidos nesta obra.
«A pessoa que trabalha em minha casa há 30 anos vive na rua Poiais de S. Bento e as traseiras do prédio dela dão para as traseiras dos prédios mais recentes da Rua D. Carlos. E, quando estavam a construir esses prédios, havia poços de água. Os bombeiros foram chamados variadíssimas vezes para retirarem a água de lá», comenta, acrescentando que no edifício do antigo banco BPI «na cave havia bombas para retirarem água», algo que se afigura especialmente preocupante porque o mesmo tem-se vindo a verificar a cerca de 500 metros de distância «na parte alta da Calçada, onde se acumula água também».
«As traseiras da minha marquise dão para a Travessa da Oliveira à Estrela, para as traseiras de um prédio. Este ameaçou ruína e os inquilinos tiveram de sair todos. Agora há um novo de esquina e aquele logo acima, em que os inquilinos tiveram de sair igualmente todos», lamenta, salientando que as brechas que se têm aberto nesses edifícios parecem ter sido pintadas por cima para que o risco não seja tão facilmente percetível.
«Se continuarem sem nos ouvir, tentaremos embargar o prolongamento do túnel do metro até Santos. Eu e os restantes residentes estamos a pensar em recorrer à Presidência da República, porque alguém tem de perceber que corremos risco de vida», garante, prometendo não baixar os braços e questionar as afirmações políticas feitas por personalidades como Marcelo Rebelo de Sousa que, aquando da votação acerca da construção da linha – com apenas um voto a favor proveniente do PS -, afirmou que não se justificava um recurso ao Tribunal Constitucional por causa da linha circular, declarando que o Executivo somente formulara uma recomendação e dela não adviria a suspensão de qualquer decisão administrativa.
Contactada pelo Nascer do SOL, na semana passada, a Câmara Municipal de Lisboa disse que não tinha «nenhuma informação» acerca da trepidação sentida nos edifícios. Já Luís Newton, presidente da Junta de Freguesia da Estrela, também não havia recebido qualquer informação relativa a este assunto.
«Apesar da ausência de feedback, isto caía muito dentro daquilo que dissemos que ia acontecer. Estamos preocupados com os moradores de toda a encosta. Solicitámos documentos ao Metropolitano sobre a segurança dos edifícios e não recebemos nada», denunciou, frisando que «as fundações dos edifícios não assentam na rocha» e, devido a esse problema, a JF terá contactado com engenheiros. «Colocámos essa questão e não obtivemos qualquer resposta por parte do Metropolitano».
«A verdade é que ninguém os tranquiliza. Não há cuidado com as pessoas», explicou então, apelando aos habitantes da Estrela para que confiem na sua Junta de Freguesia e a informem das questões que os preocupam.