«O meu bisavô era japonês e a mulher dele inglesa. Já não o conheci e nem sequer sabíamos de que nacionalidade era. Os meus avós conheceram-se durante a Segunda Guerra Mundial e o meu avô nunca disse à minha avó que era de ascendência japonesa. Dizia que o apelido era francês», começa por explicar a arquiteta Margarida Shiroi, esclarecendo que a avó desempenhava funções enquanto enfermeira, no entanto, casou e deixou de trabalhar. Dedicando-se à família, era o marido que tratava de todas as burocracias. Por isso, a verdade só foi conhecida quando o avô de Margarida morreu.
«Até houve uma situação engraçada em que uma pessoa disse à minha mãe que o nome dela era japonês, ela disse que era francês e ficou zangada. ‘É um nome bastante conhecido no Japão’», terá insistido, sendo que, atualmente, a família brinca com a situação mas recorda que, nos últimos dias de vida, o patriarca «tinha emagrecido muito e já apresentava umas feições mais nipónicas. É que antes tinha uma cara mais redonda».
«O meu avô era excessivamente metódico, tinha uma divisão em que só tinha ferramentas, estavam todas organizadas por cores, tamanhos, etc. Todo esse perfeccionismo que adquiri vem dele. Funciona um bocadinho contra nós porque o perfeito é inimigo do bom», assume a profissional de 44 anos que constata que foi extremamente influenciada pelo avô paterno, com quem passou muito tempo até aos 15 anos.
«Foco-me naquilo que é estritamente necessário para o dia-a-dia porque a casa reflete aquilo que nós somos: o design tem de estar a nosso favor e funcionar para o nosso bem-estar diário. Nos meus projetos, tento sempre que as coisas façam sentido e que não seja só colocar x ou y porque é bonito ou faz sentido esteticamente»,declara, não escondendo que a simplicidade se encontra aliada ao minimalismo nos quais apostou depois de se formar em Arquitetura de Interiores pela Fundação Ricardo Espírito Santo Silva.
«Tenho um filho de 14 anos e uma de 10. Eles gostam muito de viver num espaço organizado e arrumado, estão habituados a isso. Notam a diferença quando estão na casa de amigos, por exemplo. Percebem que é mais difícil a vivência num quarto onde não se encontra nada e está uma coisa para cada lado», observa Margarida, contando que não são raras as vezes em que está no supermercado com a filha e, quando se apercebe, esta encontra-se a organizar as latas de atum por logótipos.
«Até gozam comigo porque tiram coisas do sítio e veem quanto tempo deixo que estejam assim. Acho que ajuda, em termos dos brinquedos, da logística, da organização em casa, etc. que haja uma organização para serem mais autónomos». E este é exatamente um dos motivo pelos quais a autora do projeto ‘In To Place’ não é capaz de relegar as experiências pessoais para segundo plano quando trabalha com os clientes que a procuram.
«Por não haver arrumação nem uma organização sistemática, as pessoas nunca sabem de nada e os miúdos são menos autónomos porque fazem muitas perguntas. Tento sempre que essa realidade mude», sublinha a cascalense que já ajudou personalidades conhecidas como a apresentadora Carolina Patrocínio, mas considera que os seus serviços são frequentemente mais procurados por quem pertence à classe média e não às classes média-alta ou alta, negando que o home design, o home styling e o home organizing sejam elitistas.
«Faço design de interiores, home styling – há pessoas que sentem que a casa tem móveis a menos, a mais, querem só dar uma lavagem de cara – porque utilizando as peças que já existem, consigo mudar tudo. O home design envolve obra ou não, às vezes pode ser só mesmo pintar a casa toda, comprar sofás novos, etc. E quase sempre este meu trabalho está aliado à organização das coisas porque é indissociável do design», adianta, elucidando que, em primeiro lugar, realiza uma visita técnica pela qual não cobra qualquer montante. «Vejo exatamente qual é o problema pelo qual me contactaram. Tento ver quais são as zonas que vamos trabalhar e perceber aquilo que falta na vivência daquelas pessoas e aquilo que gostariam de atingir com a organização e o home styling», afirma, destacando que o seu objetivo primordial passa sempre por contribuir para a melhoria da vida diária de cada agregado familiar.
«Pergunto sempre as idades dos filhos, se têm animais domésticos, etc. Faço um orçamento daquilo que é necessário e, depois, avançamos se as pessoas quiserem. Tem de haver um primeiro contacto porque vou estar a mexer naquilo que é mais íntimo e os clientes têm de confiar em mim», avança, salientando que ouve constantemente «Não há ninguém com um roupeiro pior do que o meu!», porém, acredita que «não há culpas nem culpados». «Estou lá para ajudar e resolver os problemas. Há uns tempos, converti um quarto de visitas num closet inteiro de sonho. Foi todo desenhado, pormenorizado, etc. Faço a contabilização das peças, decidido onde é que vai ficar cada coisa».
«Começo por fazer uma filtragem. Divido tudo por categorias – as saias para um lado, as calças para outro, etc. – e depois, das duas uma: quando vou fazer a organização, a pessoa já fez essa limpeza ou então faço essa triagem juntamente com ela. Há pessoas que querem que veja peça a peça e outras fazem a escolha enquanto organizo outra parte. Na maior parte dos casos, encontram coisas que não viam há não sei quanto tempo», narra, recorrendo a um caso de uma cliente que a deixou surpreendida, pois esta comprava um top branco cada vez que precisava de um. «No final, tinha uns 15 tops! Este serviço não é uma coisa supérflua. As pessoas, para além de perceberem as peças que têm e usarem-nas, prestam atenção para lá daquilo que está à mão de semear».
Assim, Margarida considera que, acima de tudo, é essencial que os clientes aprendam métodos que se encaixem no seu quotidiano. «Há vários modos de dobrar roupa – uns mais fáceis, outros mais difíceis; eu consigo dobrar tudo rápido porque tenho prática, mas não quero que alguém que não tem sinta frustração por não conseguir e saber que um método não vai avançar –, e explico-os. Se for muito complicado, sei que aquilo não vai acontecer!», remata, asseverando que aquilo que mais deseja é continuar a receber fotografias, vídeos e mensagens de quem sente que tudo pode ficar bonito e à vista «mas que tal seja possível através de tarefas práticas e exequíveis».
«Como as pessoas passam mais tempo em casa desde o início da pandemia, percebem aquilo que não funciona. Há quem tenha mudado há pouco tempo de casa ou pense ‘Quero mudar aquela casa de banho’ ou ‘Um dia tenho de mudar aquele quarto’. E, com tantas horas em casa, entendem que já não aguentam mais. Há colegas minhas que explicam o método e a pessoa tem de o colocar em prática, mas eu faço tudo», garante, acrescentando que também é apologista da criação de moodboards com cores, texturas, ideias e imagens parecidas com aquilo que será o projeto final para que os clientes visualizem mais facilmente aquilo que ambicionam e se sintam mais motivados para participarem, darem dicas e, no fundo, contribuírem para que «o projeto fique muito mais giro».
«Para mim, nenhum projeto é igual. Faço questão de fazer tudo à medida de cada um. Quando comecei, era mais via Instagram e, agora, é por lá e também passa palavra. Neste momento, estou a fazer três projetos de amigas e conhecidas de clientes minhas», continua a mãe que, em março de 2020, compreendeu que seria ideal deixar os projetos de maior dimensão para trás e dedicar-se àqueles que são mais pequenos para conseguir dar o apoio necessário aos filhos que ainda se estavam a adaptar ao ensino à distância.
«Entretanto, surgiu a possibilidade de fazer uma reabilitação na aldeia de São Gregório, no Alentejo. É turismo de aldeia. Fui para lá morar dois meses porque não dava para fazer de outra maneira. Levei a minha família comigo. Foi interessantíssimo porque nunca tinha feito nada parecido e muito menos vivido no sítio onde trabalhava», confessa, admitindo que, a par disto, o facto de se ter inscrito num curso online lecionado por uma pessoa formada pela consultora de organização Marie Kondo constituiu um passo essencial na sua carreira.
«Quando nos propomos a fazer um serviço, temos de ter alguma formação. Depois de fazer o curso, abri a página e há pessoas que me perguntam para que é que me contactam mais. É um bocadinho de tudo. Às vezes, vou arrumar o closet, as pessoas percebem o método e, depois, fazem o closet do marido, das crianças, etc. E eu fico contente porque quer dizer que funcionou e que estiveram atentas», afiança Margarida, que não é apologista de lemas cliché como «Se não veste esta peça há seis meses, tem de ir embora», tentando levar a cabo um trabalho sério e cuidadoso. «Eu mesma não faço isso porque sei que há peças que nunca mais conseguirei comprar. Não é a minha roupa, não é a minha vida, não são as minhas memórias, não me posso impor».
«Eu trabalho de Norte a Sul e fora também. Já aconteceu fazer projetos só online para o Porto ou Algarve e faço projetos de styling, não é complicado porque recorro às videochamadas. Faço as minhas sugestões e, se for preciso, alguém da minha equipa desloca-se ou até mesmo eu», frisa, considerando que gostaria de apostar em remodelações nos arquipélagos dos Açores e da Madeira para sair ainda mais da sua zona de conforto. «São possibilidades».
«Tenho sempre cuidados e minimizo ao máximo o risco, quero que trabalhemos da forma mais segura para que ninguém esteja em perigo. Mesmo em pandemia, as pessoas podem confiar em mim e permitir que esteja em casa delas porque sei que estamos protegidos e, simultaneamente, a construir um ambiente melhor e uma casa mais organizada e minimalista», conclui a profissional que pode ser encontrada por meio da conta oficial @intoplacehomestyling no Instagram e na página homónima de Facebook, estando atualmente a desenvolver um site.