Cheira bem, cheira a confusão. A famosa família dos perfumes Guerlain tem estado envolvida num imbróglio de acusações ao longo dos anos – e parece não ter fim. O perfumista Jean-Paul Guerlain, de 85 anos de idade, já se encontra aposentado numa mansão a cerca de 50 quilómetros de Paris, e está diagnosticado com a doença de Alzheimer. Mas não há distância que o consiga livrar dos confrontos que duram há décadas entre Christina Kragh Michelsen, sua companheira de 63 anos, e o seu único filho, Stéphane Guerlain, de 61. Agora, a tensão entre a família ficou com um outro cheiro, mais forte, mais tenso, mais sério: uma acusação de tentativa de homicídio que os levou, mais uma vez, a tribunal. Christina Michelsen apresentou uma queixa em dezembro do ano passado, em que acusa o filho do seu namorado de a ter tentado atropelar quando estava a fazer uma caminhada perto da mansão, em novembro. Mas comecemos pelo início. E é mesmo desde o início, praticamente desde que a madrasta e o enteado se conhecem, que começou uma guerra aberta entre os dois, por volta dos anos 2000. Jean-Paul Guerlain foi e continua a ser uma cara icónica do mundo dos perfumes – criando trabalhos reconhecidos por toda a França e fora dela. Mas depois de andar 47 anos a criar novos cheiros, que acompanharam corpos e roupas de todo o mundo, 2002 foi o ano em que decidiu descansar: reformou-se. De notar que a empresa já havia sido vendida oito anos antes ao grupo Louis Vuitton Moët Hennessy (LVMH). Três anos mais tarde, em 2005, o empresário de 85 anos começou uma relação amorosa com Christina Kragh Michelsen. Têm coisas em comum, como a paixão por cavalos, já que a franco-dinamarquesa é dona de cavalos de corrida, e terá sido principalmente esse o fator que terá juntado os dois. Por outro lado, uma coisa que os distingue é a idade: Michelsen tem 63 anos de idade, apenas mais dois do que o seu enteado – um fator que não agradou muito a Stéphane. Não foi preciso muito tempo para que o novo amor de Jean-Paul Guerlain se mudasse para Mesnuls, a mansão da família na qual viveram as últimas gerações.
E vieram as suspeitas
Também não foi preciso muito tempo até que Stéphane Guerlain começasse a suspeitar da madrasta e da sua vontade de ficar com toda a fortuna da família. Em 2013, o filho de Jean-Paul Guerlain recebeu uma chamada de uma galeria de arte, em Paris, que informou que a namorada do seu pai teria alegadamente tentado vender um quadro que fazia parte da coleção da mansão. Após este incidente, que interpretou como uma ameaça, Stéphane Guerlain – advogado especializado em propriedade intelectual – não baixou mais os braços e solicitou que o seu pai fosse colocado sob sua tutela, devido ao agravamento do Alzheimer. Decisão essa que acabou por ser aprovada pelo tribunal.
A luta pelo casamento
Michelsen e Jean-Paul Guerlain já tentaram casar várias vezes, mas sem sucesso. Os advogados de Stéphane conseguiram impedir sempre a junção através dos tribunais. E frisam que o casamento é apenas uma maneira de apropriação da fortuna da família por parte da sua madrasta. Os mesmos advogados, segundo diz a imprensa espanhola, também afirmam que Jean-Paul teria já explicado em frente a testemunhas que não tinha vontade de casar. Mais: sentia-se pressionado pela namorada. Mas há sempre o contraditório. A equipa de advogados de Michelsen contrapõe, dizendo que a empresária, além de namorar com o seu companheiro há quase 20 anos, é a cuidadora principal do seu namorado. Além disso, argumentam ainda que a recusa de Stéphane de não querer permitir o casamento se deve ao facto de não aguentar ver o pai casado com outra mulher. E o que torna esta versão mais curiosa é que uma outra namorada de Jean-Paul, que esteve com ele entre 1985 e 2003, alegou o mesmo, segundo os jornais franceses: terá sido vítima de perseguição por Stéphane.
Já em 2016, o filho de Jean-Paul Guerlain processou a madrasta por «quebra de confiança, falsificação e uso de documentos falsos», mas o caso acabou por ser arquivado. Três anos depois, em 2019, foi a vez de Michelsen levar o enteado a tribunal, acusando-o de violência. Mas acabou com o mesmo final. O enteado logo ripostou, quase como se estivéssemos a falar de uma luta de boxe. Desta vez, o advogado processou-a por «abandono, perigo e negligência de uma pessoa vulnerável» – e pediu uma pena de 18 meses de prisão para a namorada do seu pai. O ano passado, em outubro, o tribunal decidiu absolvê-la.
A luta não chega ao fim e cada vez cheira pior, com o filho do conhecido perfumista a ter de responder pelas alegadas tentativas de homicídio da empresária. A defesa do filho tem negado todas as acusações. Mas para saber o que se passa, o Ministério Público de Versalhes abriu uma investigação para apurar o caso. Quem ganhará a nova briga? E será a última?