Um dia destes, enquanto esperava que o meu filho saísse da escola, estive a ver as crianças a brincar no recreio. Dois amigos do primeiro ano corriam atrás um do outro, abraçavam-se e riam à gargalhada. Que bom que é ter amigos. Que boas são as verdadeiras amizades, que fazem rir desalmadamente, sem razão aparente. Apenas de felicidade. De ter o outro, de estar ali com ele, de partilhar a alegria e a tristeza, de dizer adeus e saber que se encontram no dia seguinte para mais umas horas de paródia. Como almas gémeas (ou ‘génias’, como diz um dos meus filhos mais novos), são quase um prolongamento uma da outra, uma continuidade que oferece conforto e alegria.
Quando os meus filhos contam as desavenças normais que têm com os colegas, falo-lhes da importância dos amigos. De manter as amizades, de respeitar, de ajudar, de perdoar, de entender e de aproveitar, claro. Tal como a família, as amizades são um bem precioso. E em alguns casos os amigos chegam a oferecer a segurança, conforto e estabilidade que algumas crianças têm dificuldade em encontrar em casa. Todas as verdadeiras amizades podem ter um papel importante no desenvolvimento, mesmo em tenra idade, e até ajudar a superar algumas falhas.
Quem me diria que a minha amiga Ana Luísa (que na minha cabeça se chamava Ana Cores, por ser alegre e gostar de pintar), que me ensinou a fazer casinhas em perspetiva com quatro ou cinco anos, seria a mesma que, vinte e quatro anos depois, viria a fazer mais de cinco mil quilómetros para vir ao meu casamento? Ou que a Raquel e a Ana, com quem brincava com as Barbies e tachinhos, partilhava todos os segredos e ficava horas ao telefone, continuariam a ser hoje quase como irmãs, como já nos considerávamos na altura? É um grupo de amigos que se foi formando, que foi aumentando, que cresceu em conjunto e com uma enorme proximidade.
O grupo das meninas e o grupo dos rapazes, que são dois grupos e é um só, quando estamos todos juntos. Que foi recebendo e enriquecendo com os namorados, namoradas, maridos, mulheres e amigos de cada um. E agora com os filhos! Que acompanhou e respeitou as fases de todos, as aproximações e afastamentos, as alegrias e as rezinguices. O grupo das salas de aula, dos corredores, dos desportos, das noites de estudo, das saídas à noite, dos recreios, das férias e que sempre se manteve junto, mesmo à distância, através de cartas, do telefone ou do pensamento. Trazemos todos em cada um de nós.
Um grupo de várias pessoas diferentes, que se perdem nas horas quando começam a conversar, que falam como se estivessem todos os dias mesmo que não se vejam há anos – como o Miguel que está na Austrália –, que adoram divertir-se juntas, que se respeitam e entendem, que aprendem umas com as outras e que riem até às lágrimas com as coisas mais simples, muitas vezes só da felicidade de estarem juntas, de existirem na vida umas das outras de uma forma tão certa e especial.
Acho que as verdadeiras amizades são essas. As que se prolongam ao longo dos anos, que crescem juntas, mesmo com separações físicas ou emocionais, que podem seguir diferentes caminhos e ideais, mas que continuam unidas, num vínculo cada vez mais forte, que um dia percebemos que é indestrutível e que nos vai acompanhar até ao fim, com a mesma alegria e genuinidade das crianças que brincam e se abraçam no recreio.