La madre que los parió

No século passado a minha catequista ameaçou um menino que a usou de que iria para o purgatório se voltasse a proferir semelhante ordinarice.

Por João Cerqueira 
Escritor

 

A língua espanhola tem expressões poéticas muito interessantes como a que dá título a esta crónica. Na versão galaico-portuguesa, onde a madre se dedica à mais velha profissão do mundo, a poesia dá lugar à grosseria. Logo, não pode ser dita. Aliás, no século passado a minha catequista ameaçou um menino que a usou de que iria para o purgatório se voltasse a proferir semelhante ordinarice. Por isso, nunca digo palavrões. Como bom minhoto e natural de Biana, disponho naturalmente de um arsenal de turpilóquios que remontam ao Condado Portucalense e enriqueceram as Cantigas de Escárnio e Maldizer. Mas não os digo, tão só os penso. A última vez que arrisquei o purgatório foi na noite das eleições quando liguei a televisão e descobri que o PS conseguira a maioria absoluta – e lá saiu a versão galaico-portuguesa.

Esta breve reflexão lexical vem a propósito das modas da linguagem neutra ou inclusiva que pretendem substituir a palavra Mãe por Pessoa Lactante. Como me custa a acreditar que alguém que não seja parecido com o Putin possa renegar e insultar a sua progenitora, parece-me evidente que estas pessoas não devem ter tido uma mãe.

Poderão ser homúnculos fabricados pelos descendentes de Paracelso, ter sido o Dr. Frankenstein quem lhes deu vida no seu laboratório ao descarregar correntes eléctricas em criaturas feitas de pedaços de cadáveres, Replicants tipo Blade Runner, ou ainda, tal como o Golem judaico, esta gente pode ter sido criada a partir da lama ou – e esta é a hipótese mais provável – tendo como matéria-prima um monte de bosta.

Assim, como não sabem de onde vêm, tão pouco sabem para onde vão. 

Esta mudança de palavras – como substituir leite materno por leite humano – tinha como objectivo acabar com a discriminação – suponho que contra as mulheres – e promover a inclusão – de quem? Ou seja, tornar o mundo melhor – mais uma tentativa. Porém, sucede que os prosélitos do mundo melhor querem quase sempre fazê-lo à custa de proibições e da liberdade dos outros. Por isso, as verdadeiras mães que deram à luz e amamentaram os seus filhos não quiseram fazer parte desse mundo melhor e não pactuaram com os seus salvadores. E os bebés, quando souberam que iam ser criados por uma pessoa lactante, obviamente desataram a berrar. Alguns, tentaram até voltar para dentro da barriga da mãe, aterrorizados ante a possibilidade de terem de chuchar nas mamocas de alguém que, além de pessoa lactante, também pode ser corpo com vagina (revista Lancet), pessoa menstruada, e ainda ser homossexual, bissexual, assexual, pansexual, cisgénero, transgénero, não binário, raiz quadrada de Pi e o raio que o parta.

É demasiada informação para uma cabeça que ainda não fechou a moleirinha.

Admito que haja bebés que mal nasçam queiram imediatamente mudar de sexo ou se recusem a usar meiinhas cor de rosa, mas a maioria só quer mamar o leite da mãe, bolçar e dormir.

Aliás, esta designação de pessoa lactante enferma de outro problema: como designar, então, as mulheres que deixaram de lactar? No passado, poderia ser Pessoa que usa ama de leite. Mas no presente terá que ser Pessoa que lacta leite em pó – o que irá apavorar ainda mais os bebés. E onde ficam as avós, das quais se diz que são mãe duas vezes? Passaram a ser Pessoas lactantes a dobrar? Quanto à mudança do nome Pai, sou forçado a  ter tento na língua pois a ideia que me ocorre poderá ferir mais a susceptibilidade do público – e eis uma palavra inclusiva que não é tonta – do que expressar numa só palavra a mais velha profissão do mundo.

Por estas razões, a esta nova trupe de salvadores do mundo, mesmo suspeitando de que não tem mãe, desejo-lhes que vão fazer experiências com a linguagem para o lugar indicado pela expressão espanhola do título.