Os media têm um papel decisivo na construção de perceções, opiniões e tomadas de decisão. São a nossa janela do mundo e para o mundo. Dão a conhecer, produzem conteúdos, informam e explicam, condicionando de forma muito significativa a perceção e consequente opinião das pessoas sobre um determinado fenómeno. Por princípio são isentos. Na prática os conteúdos são produzidos por pessoas, num determinado contexto, que lidam com diferentes pressões.
Temos assistido à guerra em direto. Não é um fenómeno novo, recordo imagens de um repórter a falar para a câmara com mísseis a sobrevoarem a zona, aquando da invasão do Kuwait pelo Iraque no início dos anos 90. Mas hoje é diferente. Hoje a guerra acontece no palco das redes sociais, o que faz toda a diferença. Neste ambiente não há compromissos deontológicos com a isenção e rigor de informação. Desde que respeitando um conjunto de regras, que não são particularmente exigentes, qualquer um é livre de manifestar e difundir a sua opinião. E, a partir de um certo número de likes, comentários e partilhas, há uma forte probabilidade de qualquer disparate se poder tornar verdade, aceite por todos os que não têm recursos – tempo, vontade, capacidade… para investigar. É então que, a coberto da multidão, ganham autoridade e razão, repetindo o que ouviram ou leram. E se muita gente diz o mesmo, é porque deve ser verdade.
Outro canal direto para o cenário de guerra são os comentadores e respetivos comentários. Também estes não são isentos, tendo a vantagem de não precisarem de o ser. Porém, as interpretações que elaboram transformam-se nas opiniões que as pessoas difundem, sem conhecerem outras opiniões e doutrinas que os comentadores defendem. Se por um lado ganha o pluralismo, em todos as divergências dando lugar a diferentes perspetivas, por outro torna-se muito mais difícil conhecer e interpretar os factos de uma forma isenta, ou até adotarmos posições, cujo alcance não compreendemos, ao seguirmos a retórica de outros, porque é mais elaborada ou consistente do que a nossa.
Há também a informação das esplanadas. Sem factos e sem filtros, explanam-se opiniões e visões sobre o conflito, à laia de conversa fácil. Discute-se uma crise humanitária e um confronto militar no mesmo nível de emoção, menos até, com que se discute um cartão vermelho mal mostrado num qualquer jogo da última ronda do campeonato.
Não é fácil encontrar as melhores fontes, credíveis, isentas e rigorosas sobre o conflito na Ucrânia. O que parecem ser imagens reais e em direto, podem facilmente ser adulteradas. Provavelmente são. Certamente o que os russos entendem sobre o conflito, através da informação que lhes chega nos canais oficiais em pouco ou nada coincide com aquela que os ucranianos e o mundo ocidental partilham.
A narrativa em que acreditamos estará provavelmente mais próxima da realidade do que a versão russa. Assim o espero. Mas não devemos esquecer que tudo o que nos chega carece de confirmação e foi editado (filtrado) por alguém que também tem uma opinião e um compromisso. E é impossível apreender o conteúdo de um discurso de horas num vídeo de um minuto, por muito boa que possa ser a edição.
Neste conflito os media desempenham um papel decisivo. A mobilização de apoio humanitário à Ucrânia, nomeadamente aos seus refugiados, depende muito da cobertura mediática e da história que se conta do conflito. Já a perpetuação de Putin enquanto líder da federação russa também depende do controlo da informação. Se os russos soubessem o que se passava…