Depois de filas caóticas de espera e da subida na abstenção houve “fumo branco” para a primeira volta das eleições francesas. Emmanuel Macron e Marine Le Pen vão repetir o que aconteceu em 2017 e vão voltar a enfrentar-se na segunda volta, a disputar no dia 24 de abril, para decidir quem será o próximo Presidente francês. O atual Presidente e líder do partido A República em Marcha, venceu a primeira volta com 28% dos votos, seguido pela candidata de extrema-direita, com 23%. Em terceiro lugar ficou o candidato da esquerda radical, Jean-Luc Mélenchon, do partido França Insubmissa.
Apesar do início da campanha presidencial ter dado quase como garantido a vitória a Macron, de centro-direita, o percurso sofreu um desvio por estar ocupado com os compromissos da guerra da Ucrânia – afirmando-se como um dos principais interlocutores europeus – e pouco se preocupou com o ato eleitoral, nos últimos meses e o “feitiço acabou por se virar contra o feiticeiro”, resultando numa vitória com uma distância curta da líder do Reagrupamento Nacional.
Apesar de ter obtido grandes vitórias durante o seu primeiro mandato a nível social e económico, como a redução do desemprego e dos impostos, assim como um maior investimento em segurança ao implementar medidas mais rígidas contra o terrorismo avançou com algumas medidas que revoltaram a população. Um dos momentos mais controversos da sua presidência foi a implementação de um imposto sobre o combustível, em 2018, o que gerou semanas de protestos alimentada pelo grupo de manifestantes que ficou conhecido como “coletes amarelos”.
O mais jovem Presidente francês, antes de se tornar Presidente da França, foi banqueiro e ministro da Economia, No entanto, é frequentemente acusado de estar afastado e insensível em relação à população mais carenciada.
Limpar a imagem da extrema-direita
Um dos maiores sucessos da carreira política recente de Le Pen foi a forma como mudou a sua imagem e a do seu partido de extrema-direita. “Le Pen assumiu a então Frente Nacional em 2011 e começou a lavar sua imagem, manchada por bandidos neonazis xenófobos com cabeças rapadas e botas de cano alto”, escreve a jornalista Kim Willsher do Guardian, que acompanhou a candidata de extrema-direita nos últimos dias da campanha eleitoral.
“Foram expulsos membros que fizeram comentários racistas e antissemitas ou que defenderem Philippe Pétain, chefe do governo francês de Vichy na década de 1940. Le Pen chegou inclusive a expulsar o próprio pai em 2015”, notou a jornalista.
Willsher nota que a grande mudança da candidata aconteceu após a derrota de 2017 contra Emmanuel Macron. “Mudou o nome do partido para Reagrupamento Nacional. Desde então, deixou de exigir a pena de morte e a saída da França da União Europeia. Apesar de continuar a defender a discriminação nacionalista do movimento ‘francesa em primeiro lugar’ também fez compromissos económicos típicos de uma política mais de esquerda, incluindo o aumento das pensões, a oposição à privatização de serviços públicos e protecionismo como alternativa à globalização. A candidata deixou de apoiar o movimento ‘zero imigração’ e colocou de parte a oposição do partido em relação à igualdade no casamento e ao aborto”, pode ler-se no Guardian.
Esta aposta chegou a complicar a vida de Le Pen. Correu o risco de não ser a candidata presidencial mais votada à direita, com o seu eleitorado mais centrista a cortejar Valérie Pécresse, candidata de Os Republicanos, a direita tradicional, e Éric Zemmour, um comentador acusado de racismo e xenofobia, ainda mais explícito quando comparado com a líder do Reagrupamento Nacional.
Contudo, todas estas mudanças, aliadas à campanha pela “France profonde” – ou “França profunda” – onde conheceu eleitores em zonas rurais, permitiu discutir problemas quotidianos, como o aumento dos combustíveis, que mesmo não tendo muita cobertura da imprensa nacional, acabaram por ter “um grande eco na imprensa local”, explicou Mathieu Gallard, investigador da empresa de sondagens Ipsos, ao Politico. Tudo isto, enquanto Macron se debruçava sobre os riscos da invasão russa para a arquitetura da segurança europeia, dando “uma impressão de proximidade, que é muito importante para os eleitores franceses”.
Todas estas alterações contribuíram para que o nome Le Pen deixasse de ver visto “com desdém”.
Voto útil
Com os candidatos da segunda volta já decididos, agora está na altura dos franceses, que acabaram por não atingir os níveis de abstenção esperados, ao caírem 4%, decidiram em quem é que vão votar e alguns dos derrotados da primeira volta já se estão a posicionar contra Le Pen de forma a evitar que o país siga um rumo comandado pela extrema-direita. “Sabemos em quem vamos votar. Não podemos dar o nosso voto a Le Pen”, disse Mélenchon, que acabou em terceiro lugar.
“Acredito, tal como Jacques Chirac, que tudo na alma de França rejeita o extremismo. O projeto da Marine Le Pen irá conduzir este país à desordem, fraqueza e falhanço”, disse Valérie Pécresse, candidata do partido de direita conservadora, que obteve 5% dos votos. “Apesar de rejeitar fortemente com as ideias de Macron, vou votar nele de forma a impedir a eleição de Marine Le Pen”.
“De forma a impedir que a França não caia no ódio de todos contra todos, peço solenemente que votem no 24 de abril contra a extrema-direita de Marine Le Pen”, disse a candidata socialista, Anne Hidalgo.