por João Maurício Brás
A designada extrema esquerda e direita alcançaram perto de 50% dos votos em França, nestas eleições. Não é um epifenómeno, mas um sintoma de algo mais profundo.
Le Pen e Melenchon são criações e netos de Mitterrand, que foi também o coveiro do socialismo e um dos grandes promotores da ideia de União Europeia Maastrichtiana, a Europa como centro comercial sem direito a soberania ou identidade… O republicanismo e o socialismo destruíam-se.
Mitterrand, que curiosamente veio da extrema-direita, acabou por desmantelar o partido socialista francês, e falsificar os princípios com o ardil dos epítetos sinuosos da “geração moral”, que herdaria o desencanto do Maio 68.
Com a ‘geração Mitterrand’ a esquerda afasta-se dos trabalhadores e do povo, até da França e de uma identidade nacional. Esses conceitos como Michel Onfray muito bem explica, foram arrumados como Petanistas, os Vichystas e Marechalistas e mais tarde desceram mais uns degraus, fazendo já só parte dos nacionais-socialistas, extrema-direita, etc..
A identidade de um país, os seus melhores valores ficaram não só órfãos, como foram colados a ‘um passado execrável’ e a um ‘futuro a evitar’. Restariam os belos discursos e um hiperliberalismo económico globalista com a caução multiétnica e a caução do festival dito progressista.
O ideal francês que foi republicano e socialista será doravante colado ao colaboracionista, a nova França é a do resistente, do imigrante. Tudo construções que têm uma má relação com o plano dos factos. Mais uma vez como nos relata Onfray, o projeto da identidade francesa , dos direitos e deveres do cidadão francês, o projeto de nação e identidade francesa, o projeto nacional e comunitarista, foram abandonados. Quem o aproveitou foi a contestação antissistema, que é um produto da desestruturação do próprio sistema.
Em seu lugar surge o projeto multicultural e pluriétnico e assimilacionista, projeto pan-étnico de tipo americano e do direito a ser francês para todos e das questões societais.
A Europa económica e esse projeto societal substitui um projeto social e o respetivo enraizamento. A narrativa gaulista, republicana e socialista matriciais são agora racistas e fascistas… O inimigo não é o que se recusa assimilar-se para se tornar francês, mas sim o francês típico, como os ‘pequenos brancos’, o trabalhador e o povo… Como resultado, o socialismo e os republicanos desaparecem e os seus ‘valores’ agora execrados foram adotados por partidos considerados extremistas, e que também o são… O povo, o francês típico ficou órfão, uma orfandade violenta no plano social, económico e cultural.
O grande problema é que a orfandade persiste e os Le Pens e os Mélenchons deste mundo não são os verdadeiros herdeiros dos valores que filiavam e que foram abandonados. Fazem parte do problema.
Esta União Europeia, com a invasão Russa, revelou um fôlego inesperado. Apenas momentâneo? Ainda há valores e esperança? Duvido, mas neste momento concreto a instabilidade seria destruidora.
O projeto europeu falhou no fundamental. A Europa da cultura, da liberdade, dos valores, das ideias e da democracia foi dominada pela Europa do mercado económico e um totalitarismo económico-jurídico mascarado de tecnocracia progressista assente num projeto de desenraizamento de um ideal cultural que respeitaria as soberanias e as identidades nacionais e culturais.