No bairro Hakaniemi, no centro de Helsínquia, a 25 metros de profundidade, esconde-se um dos mais modernos bunkers da Finlândia: o abrigo Merihaka. Em tempos de paz, este espaço subterrâneo de 14.750 metros quadrados comporta um parque de estacionamento, um centro desportivo, um ginásio, vários campos de floorball – uma modalidade semelhante ao hóquei – e um parque infantil.
No entanto, num hipotético cenário de guerra, este mesmo espaço pode, em menos de 72 horas, ser convertido num refúgio com capacidade para 6 mil pessoas. A Finlândia possui cerca de 54 mil no total, com capacidade para abrigar até 4,4 milhões de pessoas, ou seja 80% da população do país.
Só na capital finlandesa, com 650 mil habitantes, existem cerca de 5.500 abrigos, com capacidade total para 900 mil pessoas. Além destas infraestruturas que se assemelham a autênticas cavernas, entre paredes de granito, rugosas e impenetráveis, há ainda uma extensa rede de 400 túneis que percorrem as ruas a uma profundidade de 20 a 80 metros e cujo diâmetro é um pouco superior à largura de um carro. Muitas dessas passagens servem de corredores para se deslocar pela cidade em dias de inverno mais rigorosos, ligando o metro a parques de estacionamento, centros comerciais, e até mesmo ao aeroporto.
O vizinho incómodo A construção de uma Helsínquia subterrânea teve início nos anos 60, em plena Guerra Fria entre os blocos soviético e ocidental. Receando uma precipitação nuclear, e ciente da sua proximidade à Rússia – somente 200 quilómetros separam a capital da fronteira com o país vizinho –, a Finlândia começou a escavar bunkers e túneis onde a população pudesse abrigar-se em caso de um desastre.
Esta estratégia de defesa e proteção civil ganhou, porém, renovada relevância desde que Moscovo invadiu a Ucrânia a 24 de fevereiro, desencadeando a maior crise geopolítica na Europa desde a Segunda Guerra Mundial.
Com uma guerra às portas da Europa e perante uma nova ameaça russa ao seu território, a Finlândia acelerou o processo de adesão à aliança militar da NATO, procurando maior segurança e proteção militar contra o inimigo. O pedido deverá ser formalizado em conjunto com a Suécia em meados do próximo mês de maio. Só que a concretização desta vontade crescente é entendida como uma confrontação direta pelo Kremlin, que já ameaçou com “sérias repercussões políticas e militares” caso os dois países nórdicos decidam aderir à Aliança Atlântica.
Num cenário em que a hostilidade suba de nível, o governo finlandês diz-se preparado para proteger a população do país, com o seu grande trunfo: bunkers capazes de resistir a bombardeamentos – incluindo nucleares –, bem como a ataques químicos, equipados com sistemas de filtração do ar, reservas de mantimentos, camas, canalização e equipamentos para assistência médica.
O receio de um conflito nuclear não escapa nem aos países militarmente mais bem equipados, como é o caso da China, que concebeu o bunker subterrâneo mais profundo do mundo. Localizado no Centro de Comando Militar em Pequim, encontra-se a 2 mil metros de profundidade e tem capacidade para abrigar um milhão de pessoas.
O cofre da Noruega Com o aumento dos riscos de uma crise climática e de conflitos à escala global, os bunkers são hoje considerados uma peça importante para assegurar a vida no planeta. Não só numa perspetiva de proteção da população, mas também no que se refere à subsistência. É sobretudo neste campo que os bancos de sementes são cada vez mais um recurso inestimável que poderá um dia evitar uma crise alimentar mundial.
Duas em cada cinco espécies de plantas do mundo estão em risco de extinção e, embora a comunidade científica estime que existam pelo menos 200 mil espécies de plantas comestíveis, dependemos de apenas três – milho, arroz e trigo.
Apelidado de “cofre do juízo final” ou “arca de sementes de Noé”, o Silo Internacional de Sementes de Svalbard, na Noruega, alberga mais de 1,14 milhão de amostras de sementes de cerca de 6 mil espécies de plantas diferentes.
Enterrado numa camada de gelo e rocha que formam o permafrost daquele arquipélago norueguês, a esperança é que as amostras neste banco de sementes permaneçam congeladas, salvaguardando a biodiversidade em caso de uma catástrofe.
O bunker secreto em Monsanto Em situação de crise, em Portugal conhece-se apenas a existência de dois bunkers no pulmão de Lisboa, no parque de Monsanto, que têm como objetivo principal o controlo e comando militar. No entanto, se isso for solicitado à Força Aérea, poderão ser adaptados em tempo recorde para receber as mais altas figuras do Estado, como o primeiro-ministro e o Presidente da República – transformando-se assim no cérebro militar e político do país.
Se a lotação não for superior a 40 pessoas, os dois espaços subterrâneos têm autonomia para garantir a sobrevivência de quem lá estiver durante 30 dias. Equipadas com sistemas de telecomunicações, filtragem de ar, geradores e mantimentos, são as únicas instalações do país desenhadas para a sobrevivência em situações NBQ (Nuclear, Biológicas e Químicas).
Um dos espaços concentra a área de controlo militar, ou seja, onde chega toda a informação do tráfego aéreo, civil e militar, e toda a informação dos sensores de defesa aérea. No outro bunker estão as estruturas de apoio, como por exemplo os quartos.
A entrada é estritamente reservada a militares autorizados e as exceções têm de ter luz verde do chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas. E quem lá entra está sujeito a um protocolo de segurança apertado: são proibidos telemóveis, computadores ou tablets no interior.