O crush de liceu, a procura por um lugar de pertença, as dúvidas existenciais e o que vai acontecer a seguir… Muitos de nós acabamos inevitavelmente por esbarrar nesta que é uma das fases mais desafiantes do crescimento: a adolescência. Há também aqueles que, durante esse período, se refugiam num “universo de fantasia” que os protege das adversidades e de todas as emoções que, durante esta altura, possam parecer ainda mais intensas. Por isso, muitas são as dúvidas que acabam por invadir o pensamento e, às vezes, até mesmo pequenos inconvenientes podem fazer com que sintamos que o mundo vai acabar.
Esse foi o caso de Iman Vellani, uma jovem com 19 anos, com cidadania paquistanesa e canadiana, depois de acabar o liceu. O que não sabia, era que não precisava de se preocupar. Em setembro de 2020, Vellani – que durante toda a infância e adolescência foi fascinada pelo Universo Cinematográfico Marvel (MCU) -, recebeu uma notícia que mudaria para sempre o rumo da sua vida: foi escalada como Kamala Khan, a primeira super heroína muçulmana da Marvel na nova série de seis episódios do Disney+, Connected: Ms. Marvel, que estreia na quarta-feira, dia 8 de maio, na plataforma de streaming. “É como quando entras numa sala onde não devias estar, mas ninguém te expulsa. É isso que está a acontecer aqui!”, afirmou numa entrevista ao All Things Considered da NPR.
O nascimento de Kamala Criada pelos editores Sana Amanat e Stephen Wacker, a roteirista G. Willow Wilson e os artistas Adrian Alphona e Jamie McKelvie, Kamala Khan – que apareceu pela primeira vez em 2013 nos livros de banda desenhada da Marvel Comic -, é uma adolescente paquistanesa-americana de 16 anos de Jersey City, que concilia ser uma rapariga normal e, ao mesmo tempo, uma super-heroína, enquanto tem de lutar contra o preconceito que recebe pela sua fé muçulmana. Nesse ano, o livro ofereceu aos fãs a possibilidade de se verem neste universo superpoderoso, dada a precoce idade da super heroína – ao mesmo tempo em que mostrava como é crescer como imigrante nos EUA. A personagem irá também aparecer no filme The Marvels, que deverá chegar aos cinemas no dia 28 de julho de 2023.
Segundo o The New York Times, Sana Amanat – que foi editora da Marvel antes de se tornar executiva de produção e produtora executiva da Ms. Marvel -, expressou em várias conversas com o então colega Stephen Wacker, que também ajudou a criar o personagem, o seu desejo de ver uma heroína que, como ela, fosse muçulmana e filha de imigrantes paquistaneses. Esta queria que as suas histórias refletissem “algumas das tribulações de ser uma adolescente negra desajeitada”, que faz coisas como “ir ao baile sozinha, jogar basquete, usar meias compridas com calções, etc”. Nos livros, Kamala moldava-se muito à Capitã Marvel – uma das personagens mais conhecidas deste “universo” interpretada pela atriz Brie Larson – e, de acordo com Amanat, esse facto “pretendia ilustrar uma dinâmica da vida real que experimentou na sua juventude”. “Quando uma pessoa de cor olha para o mundo, quem são as pessoas que adora e que quer ser? Normalmente não se parecem nada com o que realmente são. E a Capitã Marvel é um grande exemplo disso, é loira, alta de olhos azuis. Kamala não… E a história começou a partir daí!”, lembrou.
Livro vs Série Na série, antes de descobrir os seus superpoderes, a jovem é uma escritora dedicada de fanfics – narrativa ficcional escrita e divulgada por fãs -, já que era completamente fanática por super-heróis. No entanto, sente que não se encaixa nem na escola, nem em casa (a sua mãe é bastante rigorosa na educação que lhe dá e não gosta que a filha seja obcecada pelo mundo da Marvel). Nos quadrinhos, a personagem tem a linhagem dos Inumanos e, quando Jersey City é envolvida por uma “Névoa Terrígena”, desenvolve poderes de metamorfose, sendo capaz de alterar as partes do seu corpo como quiser. Além de conseguir aumentar e diminuir a sua estatura, esta também possui uma capacidade de se curar rapidamente. No entanto, para o conseguir fazer, precisa de voltar à sua forma normal. Outra característica da personagem é ser capaz de alterar a aparência, incluindo cabelo e roupas e conseguindo até imitar objetos inanimados para passar despercebida. Já na série, ao que parece, os superpoderes serão concedidos através de uma pulseira de “energia cósmica”: Kamala será capaz de construir figuras e lançar rajadas de energia cósmica, mas não mudará a estrutura do próprio corpo.
Segundo os responsáveis pela produção, a mudança de poderes da jovem foi mesmo uma das decisões mais controversas, mas necessárias do projeto e, no princípio, os fãs da Marvel acreditavam que o motivo da mudança era que Kamala tinha poderes muito semelhantes aos do Sr. Fantástico, super-herói da Marvel Comics e o líder do Quarteto Fantástico com o corpo dotado de uma incrível flexibilidade, podendo esticar-se, contrair-se ou deformar-se como quiser. Contudo, numa entrevista ao The Direct, Amanat, revelou que o verdadeiro motivo dessa mudança, era “conectar as origens da Ms. Marvel ao estado atual do MCU e vincular a história da sua família”. E Kevin Feige, produtor cinematográfico americano e presidente da Marvel Studios, reforçou: “A mudança da Ms. Marvel foi devido ao quão diferente a linha do tempo do MCU é da Marvel Comics. Nos quadrinhos, ela foi criada durante uma época em que os Inumanos estavam a receber um grande impulso, e parece que o estúdio ainda mantém a ideia de que as origens dela estão conectadas ao ‘universo maior’, mas mudando os detalhes dos Inumanos”, explicou.
De fã a protagonista Apesar de esta ser a sua estreia como atriz, não tendo muita experiência profissional, na verdade, Vellani sempre esteve bastante ligada ao mundo da sétima arte, principalmente ao universo Marvel, que em muito contribuiu para que esta se quisesse tornar atriz. Embora tivesse apenas cinco anos quando o primeiro filme do MCU, Homem de Ferro, foi lançado, segundo a mesma, “cresceu devota dos super heróis”. Quando fez o casting para o grupo de teatro da sua escola, aos 13 anos, chegou mesmo a afirmar que o papel dos seus sonhos seria qualquer um no MCU. “Era o meu mundo inteiro! Eu só falava da Marvel”, contou ao The New York Times. “E agora as pessoas vão realmente ouvir-me a falar sobre isso!”, acrescentou. Em 2020, a jovem estava a estudar no liceu em Markham, Ontário, dois anos depois a dar entrevistas sobre a realização do seu sonho.
O momento alto do percurso, foi a sua visita à sede da Marvel. “Senti que estava realmente do lado de dentro. Tive esse gostinho de como a vida poderia ser. Depois disso pensei: ‘Eu não posso ir para a faculdade depois disto! Não consigo pensar em mais nada que eu queira fazer!”, explicou. Dias mais tarde, depois de ter sido aceite na faculdade, Vellani estava a dar uma volta de carro por Markham com amigos quando recebeu uma chamada de Feige. Foi nesse momento que soube que tinha sido aceite e que seria a nova protagonista da saga. “Os meus amigos sem saberem o que se passava, perguntaram-me se eu tinha ganho a lotaria. Disse que sim!”, lembrou.
Mas mesmo assim, ao que parece, a jovem não se deslumbra. Pois mesmo ao poder escolher se assiste aos novos filmes do MCU na sua cidade natal com os seus amigos ou em exibições exclusivas para os funcionários da Marvel que trabalharam neles, Vellani prefere permanecer no lar.
Ao assistir à exibição do filme Doutor Estranho no Multiverso da Loucura, que foi organizada para toda a equipa Marvel, a protagonista da nova produção admitiu que também há desvantagens em assistir às produções com o “fervoroso esquadrão do universo de super heróis”: “Percebi que gosto muito mais de assistir a esses filmes com um grupo normal de nerds. Nessas exibições as pessoas aplaudem por tudo! Eu entendo… Eles estão a aplaudir os colegas, mas ainda assim, preciso de me concentrar quando estou a assistir a este tipo de filmes”, revelou.