Querida avó,
Recentemente, estava eu num evento, liga-me a Manuela Maria e desata a falar… que gostou muito de ver o que tinha passado na SIC, a dar-me os parabéns pela minha reportagem…
Eu bem tentava falar! Mas ela não me deixava emitir uma palavra, apenas sons.
Até que eu consegui dizer:
– «Mas está a falar de quê D. Manuela Maria?».
– «Da reportagem que acabei de ver na SIC!».
Eu pasmo: «Deu uma reportagem sobre o meu trabalho na SIC?».
– Não foi sobre o seu trabalho, mas sim uma reportagem assinada por si. Muito bem-feita por sinal.
Até que se fez luz e respondi-lhe:
– «D. Manuela Maria, lamento desapontá-la! Mas a SIC tem um repórter com o mesmo nome que eu».
– «Não acredito! Aquele trabalho só podia ser feito por si. Ver se marcamos um chá para esclarecer tudo isso. Traga a sua avó Alice. Beijos para os dois».
E desligou.
Tudo isto fez-me lembrar outra história, com cerca de 30 anos, que aconteceu no estacionamento do antigo Alcântara Mar.
Na altura toda a gente me abordava na rua pois achavam que eu era o Rui Costa, que hoje é Presidente do Benfica. Tive imensas situações por causa destas parecenças, mas nenhuma tão caricata quanto esta!
Ao meu lado estaciona a Catarina Furtado, que já na altura era bastante conhecida.
Vem o arrumador de carros pedir as moedas da praxe.
Ambos dissemos que no final da noite dávamos-lhe a gratificação.
Ao que criatura responde: «Isto hoje não está fácil! É a Catarina Furtado, é o Rui Costa… mas ninguém dá uma moeda ao desgraçado!».
Por falar em nomes, sabes que o verdadeiro nome da Ágata é Fernanda?
Já o nome de baptismo do Marco Paulo é João Simão da Silva. O Dino Meira é Armandino, a Tonicha (da Zumba na Caneca) é Antónia de Jesus, o Tony Carreira é António Antunes e o Emanuel é Américo Monteiro, imagina.
Tudo isto já me está a causar uma crise de identidade como o Abílio, o personagem do teu livro Viagem à Roda do Meu Nome.
Bjs
Querido neto
Quando eu era nova – ou seja, na pré-história – não era permitido pessoas conhecidas (ou a trabalharem no mesmo ramo) terem o mesmo nome.
Por isso o meu marido nunca pôde usar o seu nome verdadeiro – Manuel Nunes da Fonseca – porque já havia um autor de manuais escolares que tinha o mesmo nome. Teve de arranjar um pseudónimo. Penso que devia continuar a ser assim, mas eles lá sabem.
Por acaso já vi o teu homónimo na RTP e, da primeira vez, fartei-me de rir.
Também há um jornalista da RTP chamado José Gomes Ferreira – mas esse não faz mal porque o poeta José Gomes Ferreira já morreu há muitos anos.
Por isso é que existe uma organização internacional de textos didáticos sobre literatura – chamada “Academia” – que, de vez em quando, nos envia artigos onde o nosso nome é mencionado, para dizermos se somos nós ou não. Muitas vezes o meu nome é realmente o meu nome, mas doutras vezes não é. (Por acaso esta organização tem-me ajudado muito porque às vezes publica textos de críticos estrangeiros a respeito de livros meus, que eu nem sabia que existiam!)
E troca de nomes comigo, já tem acontecido… Uma vez estava numa esplanada em Caminha e o empregado olhava muito para mim, depois voltava a entrar no café depois saía e voltava a olhar, até que me perguntou:
– Desculpe, a senhora não é escritora?
– Sou.
Um sorriso de orelha a orelha.
– Eu bem sabia! Já disse ao meu patrão «Está ali a Lídia Jorge».
O meu livro Viagem à Roda do Meu Nome (que na edição alemã se chama A Partir de Hoje Chamo-me Luis) tem mais a ver com um miúdo que não gostava nada do seu nome. Era colega da minha filha no liceu, e era horrível quando cá fora, à espera dele, a avó desatava a berrar ‘Abilinho! Abilinho!’.
A partir daí fiz a história.
E vou à vida, que tenho muito que fazer.
Divertiste-te no Rock in Rio? Conta tudo a esta tua avó que tanto te ama.
Trabalhas tanto! Quem sai aos seus…
Bjs