Julgamento Ryan Giggs. Traições, computadores a voar e uma cabeçada

A lenda do Manchester United enfrenta acusações de violência e de conduta coerciva. Em tribunal, a ex-namorada disse que tentou pôr fim à relação após descobrir que foi traída com oito mulheres diferentes, mas acabou chantageada.

Ao longo dos 24 anos em que esteve ao serviço do Manchester United (1990-2004), Ryan Giggs conquistou tudo: treze campeonatos (mais do que qualquer outro jogador), quatro taças de Inglaterra e duas ligas dos campeões. O recorde de assistências continua a pertencer-lhe: 162. Rápido e combativo, mas de uma correção exemplar, tornou-se uma verdadeira lenda do clube. Viu apenas um cartão vermelho em toda a carreira e nas mais de 900 partidas que disputou na Premier League nunca foi expulso.

Mas as coisas podem ter sido diferentes fora das quatro linhas. Giggs está agora a ser julgado num tribunal de Manchester, no Reino Unido, num processo em que é acusado pela ex-companheira, Kate Greville, de agressões físicas e “controlo coercivo” entre agosto de 2017 e novembro de 2020. “Uma litania de abuso, tanto físico quanto psicológico, de uma mulher que ele professava amar”. Foi com estas palavras que o procurador que formulou a acusação resumiu o comportamento do ex-jogador de futebol sentado no banco dos réus, no dia de abertura de um julgamento que entrará esta segunda-feira na sua terceira semana, onde já foram ouvidos Alex Ferguson e alguns dos maiores nomes da história do Manchester United.

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Giggs é acusado de ter agredido a antiga companheira com uma cabeçada quando esta tentou pôr um ponto final no relacionamento. Além disso, é ainda acusado de ter agredido a irmã mais nova de Greville, Emma, com uma cotovelada na mandíbula durante o mesmo incidente. Durante o julgamento, Giggs negou todos os crimes, tendo afirmado que as irmãs “exageraram e fabricaram” as acusações.

Violência ou exagero? De acordo com o procurador Peter Wright, o incidente remonta a 1 de novembro de 2020. Mas o antigo futebolista já teria um histórico de “comportamentos coercivos” antes disso, tendo inclusive “assediado” Greville com mensagens nas quais “ameaçava enviar imagens íntimas para os seus amigos e colegas de trabalho” quando esta ameaçava deixá-lo ou aparecia sem avisar na sua casa e no ginásio, disse o advogado.

“Este foi um comportamento obsessivo para ele conseguir o que queria”, classificou Peter Wright, acrescentando que Giggs chegou a expulsar a ex-namorada e a retirar todos os seus pertences da sua residência quando esta o enfrentou.

No tribunal, Kate Greville relatou várias ocasiões em que o casal discutira acaloradamente, argumentando que por muitas vezes o jogador mais celebrado da história do United se encontrava sob o efeito de álcool.

Perante o juiz, a britânica, de 36 anos, assumiu que se sentiu como uma “escrava” numa relação que era “tóxica” e que por várias vezes tentou deixar Giggs devido à infidelidade com pelo menos 8 mulheres e pelo comportamento “controlador e agressivo”, mas sentia-se sempre “pressionada” a voltar, uma vez que ele lhe enviava “50 mensagens por hora” a chantageá-la.

Greville contou ainda um episódio que terá tido lugar num hotel em Londres em que Giggs lhe arremessou uma bolsa com um computador à cabeça, tendo-a depois arrastado do quarto para o corredor de hotel enquanto esta estaria nua.

A defesa do galês rebateu as acusações, alegando que se tratariam de “mentiras e exageros”. Depois de Greville ter descrito algumas das agressões de que terá sido vítima, os advogados de Giggs explicaram que os hematomas e demais sinais de violência que a ex-companheira do antigo futebolista apresentou foram consequência das relações sexuais “à bruta” que o casal mantinha.

“Foi uma contusão causada por ‘sexo à bruta”, explicou o advogado de Giggs, Chris Daw, dirigindo-se a Kate Greville no tribunal, acrescentando que ela teria pedido ao antigo futebolista que fosse “mais assertivo na cama”. O advogado tentou demonstrar ainda que Giggs comprou brinquedos sexuais a pedido da ex-namorada, exibindo uma série de mensagens privadas do casal.

Durante o seu depoimento em tribunal, Giggs confessou que nunca foi fiel a nenhuma ex-namorada e definiu-se como alguém que “namorisca por natureza”, admitindo que é “incapaz de resistir a uma mulher atraente” independentemento do seu estado civil. Enquanto ainda era casado com Stacey Giggs, chegou a ter uma aventura de oito anos com a mulher do irmão, Natasha e até tentou seduzir a mãe desta, Lorraine Lever.

Quanto ao que está em causa no julgamento, Giggs negou alguma vez ter batido numa mulher, mas admitiu que, durante a discussão a 1 de novembro de 2020, a sua cabeça “tenha chocado acidentalmente” com a da ex-companheira. “Estou seguro de que não foi intencional”, vincou perante o juiz.

“Temperamento fantástico” Na última semana o ex-jogador galês ganhou uma testemunha de peso no julgamento, com o ex-técnico do Manchester United Alex Ferguson a depôr a seu favor. 

“Ryan Giggs sempre teve um temperamento fantástico, foi sem dúvida o melhor exemplo que tivemos no Manchester United”, declarou Ferguson no tribunal. 

Questionado pela defesa se alguma vez tinha visto Giggs a “perder a paciência ou a tornar-se agressivo”, Alex Ferguson respondeu que não.

O julgamento de Ryan Giggs entra agora na terceira semana, numa altura em que o futebolista francês Benjamin Mendy também está a ser julgado, após ter sido acusado de oito violações, uma tentativa de violação, e um crime de abuso sexual que terão sido cometidos entre outubro de 2018 e agosto de 2021, em “salas de pânico”.

Segundo o procurador britânico encarregue do caso, o jogador que foi suspenso do Manchester City terá abusado da sua fama e riqueza para atrair mulheres para a sua mansão no condado de Cheshire, violando-as quando rejeitavam qualquer avanço sexual ou estavam tão bêbedas “que tinham pouca ou nenhuma memória dos incidentes”.

O internacional francês de 28 anos não terá atuado sozinho. De acordo com a acusação, Mendy tinha um cúmplice, Louis Saha Matturie, com quem visitava várias discotecas e cuja função era “encontrar mulheres jovens e criar situações em que essas mulheres jovens pudessem ser violadas e agredidas sexualmente”.

Cinco das mulheres que testemunharam em tribunal alegam ter sido violadas somente por Mendy, e seis exclusivamente por Matturie. Outra mulher, que acusa os dois homens, afirma que tinha 17 anos na altura em que foi violada.