Querida avó,
No passado dia 1 de novembro, inevitavelmente, ouvimos falar do Terramoto de 1755.
Esta data é recordada ano após ano. No entanto, ao longo do ano nunca mais é falada.
Somos inundados, diariamente, com notícias pessimistas. Para bem da nossa saúde mental, não é preciso estarem sempre a recordarem-nos que a grande Lisboa (e não só) “vive por cima de um barril de pólvora”.
No entanto, não podemos ignorar este facto!
Para que possamos descobrir mais sobre o Terramoto de 1755, sobre a Lisboa daquela época, e sobre eventos sísmicos, abriu junto ao Museu dos Coches, em Lisboa, o Quake – Centro do Terramoto de Lisboa. Um espaço que deve ser visitado por miúdos e graúdos.
Claro que este teu neto tinha que ir visitar este espaço e viver esta experiência que nos permite ver, sentir e compreender o Terramoto de 1755.
Gostei imenso. Entrar no “Quake” é como entrar numa máquina do tempo. É, ao mesmo tempo, uma experiência lúdica, sensorial e pedagógica. Nada foi deixado ao acaso. Alguns dos nossos sentidos fazem-nos acreditar que, efetivamente, estamos em Lisboa, no dia 1 de novembro de 1755, a celebrar o Dia de Todos os Santos.
Gostei do rigor histórico e de ser uma experiência imersiva.
Já imaginaste a Lisboa daquela época? Como seriam as pessoas? As ruas imundas, os mercadores, as vendedoras, as centenas de cães vadios de que tanto se fala, os escravos, a aristocracia… as centenas de padres que existiam.
Por falar em aristocracia, sabias que era comum os aristocratas terem os “seus” pobres, a quem ajudavam?
Sempre ouvimos na escola que, após o terramoto, o Rei D. José passou a dormir numa tenda.
Essa tenda foi sendo cada vez mais luxuosa, ficando conhecida como Real Barraca.
Tudo isto e muito mais pode, e deve, ser recordado nesta espaço.
Agora vou aproveitar o fim de semana para reler o belíssimo livro Quando Lisboa Tremeu do Domingos Amaral.
Bjs
Querido neto,
Quando leres o livro do Domingos Amaral, ficas a saber tudo. Por isso é que eu leio todos os livros históricos que ele escreve!
Um terramoto seguido de um tsunami – não havia hipótese de salvação.
D. José teve a sorte de se ter retirado horas antes com a família real para Belém e o Marquês de Pombal estava também longe dali.
Esse foi o verdadeiro reconstrutor da cidade, aquilo a que ainda hoje se chama a Baixa Pombalina, apoiado pelo Engº Manuel da Maia (quando passares por esta rua, lembra-te dele)! Um dos palácios logo destruídos foi aquele que ficava em frente ao rio, no lugar a que alguns hoje chamam Praça do Comércio, mas que muita gente – incluindo eu – chama Terreiro do Paço – mesmo que do Paço não exista nada.
Conta-se que alguém um dia, ao olhar para os planos de reconstrução da cidade terá perguntado ao Marquês de Pombal porquê mandar fazer ruas tão largas. Ao que ele terá respondido «há-de vir um dia em que as acharão estreitas».
O terramoto teve repercussão no mundo inteiro. Voltaire, por exemplo, ficou profundamente abalado porque aquilo ia contra tudo o que ele pensara ser possível, e sobre isso escreveu o romance “Candide” e o “Poema Sobre Desastre de Lisboa”.
Mas agora, deixando um pouco de lado o terramoto, fartei-me de rir com o teu espanto de haver “aristocratas que tinham os seus pobres de estimação”.
Não é preciso recuares tanto na história!
Bastava teres ido um dia a casa dos tios que me criaram para encontrares na porta da rua (a chamada “porta de serviço”) a pobrezinha das 5ªas feiras, “a pobrezinha dos sábados”, etc. Cada uma tocava à porta a uma dada hora, e dizia “sou a pobrezinha das 4ªs feiras” e, uma das nossas empregadas (“criadas”, naquela altura) já sabia o que havia de lhe dar. Claro que a minha tia nem as via, era só o que faltava.
E pronto. Tal como tu, vou voltar ao livro do Domingos Amaral.
Quando for a Lisboa levas a avó ao Quake?
Bjs