Enquanto toda a gente fala dos abusos contra pessoas LGBT+ no Qatar, o seu antecessor como anfitrião do Campeonato do Mundo parece não ter querido ficar para trás. A Duma, ou Parlamento russo, já tinha proibido “propaganda LGBT” dirigida às crianças, em 2013, e esta quinta-feira aprovou a criminalização de “propaganda LGBT” para adultos. Uma manobra vista como uma tentativa de silenciar esta comunidade.
A nova legislação penaliza em até 400 mil rublos (o equivalente a 6,36 mil euros) os russos que “propagandizem relações sexuais não-tradicionais”, seja em filmes, livros, anúncios ou meramente em público. Chegando aos cinco milhões de rublos (80 mil euros) no caso de organizações, enquanto os estrangeiros arriscam ser condenados a 15 dias de prisão e depois expulsão do país, aumentando o clima de medo entre as pessoas LGBT+ que ainda não tenham fugido da Rússia.
Há muito que Vladimir Putin se tenta afirmar como um defensor dos supostos valores tradicionais, face àquilo que vê como a degeneração ocidental. É uma cruzada nos costume, por uma Rússia purificada, que ultimamente o regime tem tentado relacionar com a sua invasão da Ucrânia (ver página 7), ou “operação militar especial”, como o Kremlin lhe costuma chamar.
“LGBT hoje é um elemento de guerra híbrida. E nesta guerra híbrida temos de proteger os nossos valores, a nossa sociedade e as nossas crianças”, salientara Alexander Khinshtein, dirigente do Rússia Unida e um dos deputados proponentes da nova legislação contra a “propaganda LGBT”. Explicando que “a operação militar especial tem lugar não só no campo de batalha, mas também nas mentes e almas das pessoas”.
Se o regime de Putin já contava com o apoio do líder da Igreja Ortodoxa russa, Cirilo de Moscovo, este ainda ficou mais cimentado com esta legislação, entusiasticamente apoiada pelo patriarca. Aliás, nos últimos meses o regime tem pintado a sua invasão em tons cada vez mais religiosos. O Kremlin já não fala tanto em querer exterminar nazis, nos seus canais de propaganda ouve-se cada vez mais referência a “dessatanizar” a Ucrânia, como descreveu um dos ideólogos favoritos de Putin, Alexander Dugin. Algo repetido pelo líder checheno, Ramzan Kadyrov, cujas milícias têm ganho destaque com a guerra e que há anos era conhecido mundialmente pela brutalidade com que perseguia pessoas LGBT+.