Lula da Silva é experiente, sabe das coisas. Pressionado por um imenso leque de tendências que fez de sua coligação no segundo turno uma verdadeira arca de Noé, vinha ganhando tempo e sentindo a situação, mas a marcha do tempo é inexorável. Mesmo com limitações para falar em função do problema nas cordas vocais, assumiu a coordenação geral, segundo ele «para pôr ordem na casa». O grupo oficial que trata da transição já conta com mil membros, que precisam de anos e não menos de um mês para levantar a situação do país e programar as primeiras medidas. Na coordenação política, vai cooptando o centrão que sustenta Bolsonaro, liberando alguns nomes para o Ministério. E já disse que não quer medidas fortes na área econômica e social nos primeiros cem dias. Embora tenha dito que não iria governar para agradar a Faria Lima – avenida em São Paulo onde estão os bancos e fundos –, não quer turbulências nos mercados. Por isso estaria condicionando nomear gente mais à esquerda com o compromisso de pouco falarem. Muita pressão e vários problemas.
VARIEDADES
• A posse de Lula da Silva, apesar da data inconveniente, 1.º de janeiro, deve reunir muitos chefes de Estado. Confirmados os Presidentes de Portugal, Argentina, Alemanha, Honduras. Os EUA podem ser representados pela vice, Kamala Harris. A embaixada americana já reservou um hotel inteiro em Brasília para a data.
• Os militares informaram aos interlocutores do futuro Governo que o Brasil não autorizará pouso do Presidente da Venezuela, Nicolas Maduro, para a posse. O Brasil não reconhece o Governo venezuelano. Lula no fundo, dizem, gostou de ter se livrado do constrangimento do amigo isolado no mundo na posse.
• Controlar a inflação pode ficar difícil com o aumento dos gastos públicos pedidos por Lula sem fontes de receita. Os juros no Brasil já estão altos, 13,75%. Estima-se que o tesouro pagará, em 2023, cerca de 120 mil milhões de euros de juros no mercado interno. A inflação está ainda sob controle, devendo fechar o ano em mais ou menos 6%.
• A renúncia de Luís Palha ao Conselho da Oi, como representante da Pharol, aponta para maiores dificuldades da administração da empresa. Palha era o membro mais respeitado do Conselho.
• Henrique Meirelles, o brasileiro que presidiu o Banco de Boston mundialmente e foi presidente do Banco Central nos dois mandatos de Lula da Silva, ficou de fora deste mandato. Lula teria dito que com 77 anos não podia ser ministro, pois de velho no governo bastava ele. Lula também está com 77 anos.
• O general Villas Boas, ex-comandante do Exército e nome altamente respeitado, disse que os militares não tinham de opinar sobre resultado das eleições, mas que no futuro podem ter de agir. Já o vice de Bolsonaro, e senador eleito, Hamilton Mourão, general também, afirmou que Lula ganhou e tem de governar. Bolsonaro continua a resistir a reconhecer a derrota, mas sem aliados na posição que não seus mais íntimos, de pouca relevância no conjunto de políticos. Não vai transmitir o cargo.
• A oposição a Bolsonaro tem dado mostras de intolerância desnecessárias. Quer anular a aposentadoria do atual presidente como deputado, que foi por 28 anos. Direito mais do que adquirido, líquido e certo.
• Já a família Bolsonaro não para de gerar problemas. A presença do deputado Eduardo Bolsonaro no Catar, assistindo aos jogos do Brasil, foi muito criticada. Justamente quando a Câmara está cuidando de aprovar recursos para os programas sociais.
Rio de Janeiro, dezembro de 2022