A marcha (no Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra a Mulher) foi bonita. A noite de 25 de novembro pôs-se fria. Não a ia perder por nada. Faço a luta no terreno diário.
Conheço as sobreviventes pelo seu primeiro nome, as filhas e os filhos que não sobreviveram também. Este ano, continuamos a pôr mais pequenos traficantes na prisão, pessoas que escolhem usar drogas, do que agressores e violadores. Alguns coletivos começaram a marchar, eu esperei que uma amiga chegasse e marchámos. Ela foi autora do que considero o hino das sobreviventes de violência doméstica com a música: Maria da Graça. Eu e a Joana, caminhámos. Mais uma vez, gritei em plenos pulmões até ficar sem voz. Pelas mulheres que morreram este ano em contexto de violência doméstica, pelas crianças, por homens e pelas mulheres que foram violadas porque não apresentaram queixa a tempo ou simplesmente o Ministério Público não se conseguiu decidir quanto à sua autodeterminação. A verdade é que gritei por todas elas ao longo de todos os anos em que os gritos não se ouviam nas ruas e apenas silêncios abafados cobertos por maquilhagem e sangue pisado se observava em casa.
Sei que as honrei, sei que muitas vezes, sentem falta do meu abraço, ou das horas de conversa a contarem-me as memórias que deviam ser momentos presentes a serem vividos e que lhes foram para sempre brutalmente roubados. Estou sempre a fazer algo por elas, seja a denunciar, a tentar mudar uma lei, a criar uma campanha, a criar uma homenagem, um conceito, um legado que elas por si próprias já o são. Elas são um legado. Mulheres e crianças. Dessa noite, em que fiquei não só rouca como doente, foi mais uma purgação de todos os males que rodeiam estes temas que combato todos os dias, ora a violência doméstica, ora a violação, ora o assédio, ora fazer diferente!
Quantas forças temos que ter dentro de nós, para combater todas estas batalhas? Toda! Coletivos juntam-se, mulheres, no entanto, acho que devemos mudar o rumo da marcha. Até porque a verdadeira guerra pela justiça, não se faz naquelas ruas, faz-se dentro de quatro paredes, para dentro de outras quatro paredes, as dos tribunais. Continuar a marchar nas ruas, será sempre o objetivo de quem nos quer ver protestar de forma controlada, não incomoda. E tanto a violência doméstica como a violação têm mais que a obrigação de ser incomodas. Mais que incomodas, bandeiras assentes na nossa luta por uma sociedade que seja igual!
Por mais bonitas que sejam as marchas, temos de ser alvo da mudança, temos de fazer crer que esta carnificina não está para ficar. Uma mulher ou uma criança são demais. Já vamos nas 23. Ou 24 mulheres. Fora as crianças mortas este ano ou homens este ano. Fora as mulheres abusadas e violadas. Diria que foram cinco por dia. Nada, nada chega! E tudo se faz… tudo se chora, por mais uma vida salva, ou uma vida que se perdeu! E eu não nasci para me ficar, nasci para lutar!