Custa-me tremendamente falar sobre este caso. Predestinado desde o início. Evidente até nas falhas de quem não conseguia ver a totalidade das culpadas/os. Neste caso, da maior e principal responsável, a progenitora, que não era nada mais nada menos, que alguém à espera na escuridão, para se mostrar.
Tenho escrito sobre vocês. Sobre ti Jessica, sobre a pequena Lara. Sobre os horrores perpetuados pelos progenitores e cúmplices mas também pelo sistema que está avisado mas que não tem meios suficientes para vos proteger. Como se fosse desculpa, para que de forma tão bárbara, sejam mortas crianças de três e nove anos.
Dá-me algum alento, que conhecendo o terror pelo qual passavas, já não estejas mais aqui, as constantes tareias da tua progenitora, que te deixava dias a fio sem comer e que com apenas três anos já te tinha deixado ser violada para seres transformada num meio de transportar droga.
Nesta altura, só a luta e as atitudes são válidas, não os milagres e as promessas em vão. Não bastam palavras e apertos de mão. O Estado falhou-te! Sabes, nunca deves ter feito uma árvore de Natal, melancolicamente, muitas vezes, me vejo a pensar, no sofrimento alheio, de quem apenas sofre com olhos cor de mel e cara de porcelana, como todos a pudessem partir. Não sei quantas vezes deves ter chamado por alguém, nesses momentos, sozinha, encolhida e aterrorizada. É demais para alguém suportar, quanto mais um bebé. Nessa altura tinham começado a nascer os caracóis no cabelo da minha filha, será que foste correr na praia, com os teus pés pequeninos a tocar na areia? Dar de comer aos patos, que tanto assustam como encantam com os seus bebés? Será que comias gelados e festejavam os teus anos com um bolo? Não acredito que fizessem nada disso e acredito que sempre que visses algo novo, a tua felicidade era plena e contagiante. Desculpa Jessica. Desculpa.
São as minhas últimas palavras, para as sobreviventes de violência doméstica do ano, e o que quer dizer é: apesar do massacre, continuaremos a lutar. Para nos calarem, têm de nos silenciar a todas. Para nos amarrem, têm de nos amarrar a todas. Para nos espancarem, têm de nos espancar a todas. Para nos apagarem, têm de nos matar a todas. Enquanto uma de nós for viva, para perpetuar esta luta, ela vai continuar! Com mais força, com mais garra e certamente com mais responsáveis! Não nos calaremos e nunca vamos parar de lutar!
A Jessica era nosso dever e obrigação, mas mais uma vez falhámos, mais uma vez o estado sabendo da retirada das outras crianças a esta progenitora, deixou-te sozinha e desacompanhada! E eu não sei onde é que tu estás. Eu não sei onde é que tu estás. Apenas sei, o horror de onde é que tu vieste, até seres morta com três anos de idade, violada a servir de ‘mula’ de droga enquanto um dos teus carrascos cantava de noite num karaoke, sem qualquer preocupação, dó ou piedade!