Desde miúdo que se interessou por desportos radicais e praticou skateboard e snowboard. O seu gosto pelo design e apurado sentido estético levou-o à arquitetura. Só que esse não era o seu mundo. Determinado a viver as suas paixões, tornou-se um empresário de sucesso, lançou, em 1994, a marca DC Shoes de calçado desportivo, que foi um êxito enorme, e começou a fazer ralis nos Estados Unidos.
O norte-americano não era um piloto qualquer. Deixou a sua marca através de um estilo espetacular e grande carisma. O seu talento único para conduzir qualquer tipo de carro proporcionou algumas das imagens mais espetaculares e impressionantes do automobilismo. Ken Block tornou-se mundialmente conhecido pela mestria com que dominava carros de ralis e, mais tarde, pelas inacreditáveis acrobacias que fazia nos eventos de drift – na verdade, o que ele fazia não eram drifts, eram derrapagens controladas com uma perfeição que nenhum campeão do mundo de ralis consegue fazer. Mudou a forma como as pessoas veem o desporto automóvel, sem nunca ter sido campeão do mundo. Além da competição, trouxe entretenimento e mudou a forma como automobilismo e o marketing se relacionam. Deixou bem claro que não é preciso ser campeão para ter visibilidade mundial.
Ficou também conhecido pelas loucas manobras na série Gymkhana, que tem milhões de visualizações no YouTube. Tinha tudo sob controlo, menos uma maldita moto de neve que se virou a ele e o matou, com apenas 55 anos. De forma a homenagear o piloto, a Federação Internacional do Automóvel (FIA) decidiu retirar o número 43 – era o seu número favorito – do Mundial de ralis de 2023.
Carros absurdos
Ken Block começou a dar espetáculo nos ralis com o Subaru Impreza WRX STI. Na primeira época, em 2005, foi considerado o Rookie of the Year nos Estados Unidos. Dois anos mais tarde, estreou-se no Mundial de ralis e, em 2010, assinou contrato com a Ford para participar no Mundial de ralis com a equipa Monster World Rally. No total, disputou 25 provas, mas sem grandes resultados. Posteriormente, criou a Hoonigan Racing Division com o objetivo de apoiar as suas participações no Mundial de rallycross com o Ford Focus RS RX.
O piloto tinha na sua garagem carros verdadeiramente icónicos como é o Ford Mustang de 1965, modificado pela Hoonicorn. O motor V8 de 6.7 litros recebeu dois turbo compressores e a potência disparou para os 1420 cv! Foi com este carro absurdo que disputou a célebre rampa Pike Peakes, nos Estados Unidos, algumas vezes ultrapassando os limites da estrada. Na sua garagem moram também o Ford Escort Cosworth (370 cv), a pick up Ford F-150 Hoonitruck (926 cv), o Ford Bronco V8 (435 cv), o Porsche 911 Hoonipigasus (1400 cv) e o Audi S1 Hoonitron com dois motores elétricos (1400 cv). Andava sempre no limite, mesmo quando não precisava e, por vezes, faltava-lha a estrada. Foi isso que aconteceu no Rali de Portugal de 2011, quando no shakedown de afinação do Ford Fiesta WRC capotou várias vezes e destruiu o carro. E o Rali de Portugal ficou por fazer.
Ken Block esteve a um passo de fazer das suas ao volante de um Fórmula 1 em 2011. A Toyota convidou-o a experimentar o monolugar, mas a sua elevada estatura (1,83 m) não o permitiu – o carro tinha sido desenvolvido para pilotos bastante mais baixos – e, sobretudo, o facto de as suas pernas bloquearem os movimentos do volante inviabilizaram o teste. Ficaram todos a perder, não é difícil adivinhar o que faria Block com um Fórmula 1 nas mãos…
Drift King
O drift tornou-se a sua especialidade, fazer piões, curvas apertadas a fundo, saltos e outras acrobacias eram brincadeiras de crianças. A série “Gymkhana” teve início em 2008 e foi um enorme sucesso. O primeiro vídeo foi há 14 anos com o Subaru Impreza WRX STI (585 cv), usado no Mundial de rallycross. Fica na história o quinto vídeo realizado em San Francisco, nos Estados Unidos, com o Ford Fiesta de 650 cv preparado pela sua equipa. Foi, talvez, o vídeo mais audacioso realizado por Block, que obrigou a fechar grande parte da cidade. Foram 9 minutos de uma intensidade e espetacularidade extremas, com manobras de cortar a respiração. O vídeo tornou-se viral no YouTube com mais de 113 milhões de visualizações. Para os fãs de Block, o nono vídeo, realizado com o Ford Focus RS de 600 cv, num terminal ferroviário em Nova Iorque, foi o mais arriscado ao atravessar a linha do comboio quando se aproximava uma locomotiva – foi mesmo à tangente e, depois, com piões assustadores num pontão, chegou a ter uma roda fora do asfalto… A última criação aconteceu em Las Vegas, só que desta vez a borracha queimada foi causada pelo Audi S1, um modelo elétrico desenvolvido pela sua empresa e pela Audi Sport propositadamente para o evento, que teve um custo estimado de 12 milhões de euros.
Ken Block deixou também um legado importante no mundo dos videojogos. Participou no “Dirt” 2 e 3 e ficou eternizado no “Need for Speed” e “Need for Speed Heat”, fazendo inclusive atuações como piloto convidado, inspirou ainda os criadores do jogo “Art of Rally” e inspirou a série “Forza Horizon”.
Um dos seus principais colaboradores e amigo, Michael Blabac, prestou-lhe uma sentida homenagem: «Era um visionário, um pioneiro, um ícone. Via as coisas de uma maneira que mais ninguém via e ajudava os outros a concretizarem as coisas que pensavam não ser possíveis. Era um amigo e um mentor incrível para todos aqueles que tiveram a oportunidade de o conhecer e de trabalhar com ele». Oliver Solberg afirmou: «Meu herói e amigo. Foste uma verdadeira inspiração e estarei eternamente grato pelas oportunidades e ajuda que me deste», disse o jovem piloto.
O espetáculo continua, mas nunca mais será o mesmo.