Albert Fish: “Adoro crianças! São muito saborosas!”

Começou por gostar de beber urina e, depois, tirava um prazer especial em devorar pratos de fezes. Passou em seguida para o canibalismo – raptava crianças, levava-as para locais ermos, torturava-as e amputava-as de partes do corpo que cozinhava com cebolas, cenouras e nabos…

Quem olhava para Albert diria estar frente a frente com qualquer manga-de-alpaca como os que Bernardo Soares se alimentou para fazer sobreviver O Livro do Desassossego. Magro, enfezado, de bigodes curvados para cima, tez clara, cabelos com um toque ligeiramente arruivado, boas maneiras, quase cavalheiresco na forma como descobria o cocuruto para cumprimentar as senhoras que com ele se cruzavam. E, no entanto, estávamos na presença de um daqueles canalhas camilianos, canalha de pai e mãe e família até à quinta geração. O príncipe dos canalhas!

O macabro pedófilo e assassino de Washington, de nome completo Hamilton Howard Albert Fish, decidiu um belo dia que já não aguentava mais tanto segredo. Quando a polícia recebeu um envelope estranho, entregue pela mãe de Grace Budd, uma moça entretanto desaparecida sem deixar rasto, teve a certeza de que o serial killer que procurava há anos só podia ser o autor daquele arrazoado de converseta à toa carregado de erros de ortografia. O envelope vinha selado com uma pequena marca hexagonal com as letras N.Y.P.C.B.A, cujo significado era New York Private Chauffeur’s Benevolent Association, isto é, uma associação de condutores pro-bono que se dispunha a transportar pessoas com deficiências. Grotesco? Bastante. Mas o que é que na vida de Fish não foi grotesco? Eu não sei responder. Vão ter de perguntar ao próprio embora este tenha sido condenado à morte e eletrocutado na prisão de Sing-Sing no dia 16 de Janeiro de 1936. Provavelmente não estará em condições de se explicar. Já antes de morrer não tinha muita capacidade de comunicação.

Ora bem, esta sinistra figura que viria a transformar-se num dos mais asquerosos criminosos da América e do Mundo veio ao mundo a 19 de Maio de 1870, precisamente em Washington. Hellen, a mãe, tinha por via dos antepassados, sangue escocês e irlandês o que, naturalmente, fez dela um mamífero teimoso como um muar. Deu-lhe na gana casar-se com Randall, um figurão pescador que era mais conhecido pelos sarilhos e pela cenas de pancadaria que provocava do que verdadeiramente pela sua capacidade de trabalho. Além de estoira-vergas já não caminhava para novo. De tal ordem que quando Albert nasceu o seu progenitor somava a bonita idade de 75 anos. Como se percebe, não era de esperar dele um grande apoio paterno nem uma compreensão particular sobre os sentimentos que revolveram a infância e a adolescência do desgraçado Fish Jr. E, como tal, a coisa descambou. E de que maneira! Para quem aprecia determinados pormenores mais requintados, direi que Randall Fish tratava o filho mais velho (Albert viria a ter dois irmãos) por Ham & Eggs, o que não é propriamente simpático para alguém que anseia que a sua vida vá para além do pequeno-almoço. Ham & Eggs colou-se a Fish como um pedaço de pastilha elástica na sola de um sapato numa tarde de Verão. Nos seus anos de colégio primário até os professores o tratavam dessa forma. Pode não servir de atenuante, não há atenuantes para um assassínio a sangue-frio, mas confesso que nem eu me importaria de apertar os fagotes ao primeiro ordinário que resolvesse tratar-me por ovos-com-presunto. Há limites para tudo, ora diacho!

 

Uma família levada da breca

A família de Fish era do piorio. Mais uma vez desejo enfatizar que tal não é desculpa para sustentar os seus comportamentos animalescos, mas o pormenor regista-se para que todos saibamos como e porque Albert mergulhou tão fundo no oceano da barbárie. Era o que faltava, evidentemente, que por ter um pai devasso, um par de tios bêbados como carroceiros, uma mãe infeliz que levava cargas de porrada de criar bicho do marido e um grupo de amigos maltrapilhos sempre prontos a roubarem o que pudessem nas mercearias e frutarias vizinhas da zona de Potomac Railroad Station onde, por acaso, Randall fazia de conta que trabalha e de onde sacava uns cêntimos, servisse para tornar Albert Fish num mártir. Ainda por cima uma besta de 128 patas que não teve qualquer pejo em declarar, quando foram descobertos os restos mortais, bastante triturados e mastigados, de um garotita chamada Beatrice Kiel, de apenas oito anos de idade: «Gosto muito de crianças! São muito saborosas». Francamente! Ultrapassava bastante o limite da decência. Mas Beatrice foi apenas um pequeno pormenor na vida sanguinária de Ham & Eggs. Antes de se dedicar a rapazinhos e rapariguinhas teve uma obsessão irresistível por velhotes. Foram muitos aos quais antecipou a morte.

 

O começo da carnificina!

O ano de 1882 foi muito importante para o desenvolvimento deste indivíduo enquanto velhaco. Com apenas 12 anos criou uma amizade com um moço que trabalhava no posto de telégrafos dos correios. Tinha acabado de sair do orfanato onde, sem dúvidas, foi vítima de abusos sexuais e intelectuais e trazia dentro de si uma quantidade de ódio que dava para distribuir por todos os homicidas dos Estados Unidos e ainda sobrar um frasco cheio até cima. O traste do telégrafo também era uma bela peça, sim senhor. Um bocadinho mais velho do que Alfred, tratou de o fazer experimentar algumas cenas que acabaram por produzir nele uma reação tão inesperada como satisfatória. A urolagnia, por exemplo, esse prazer sublime de beber a urina própria e a alheia. Ou a cropofagia, que consiste em comer fezes. Ou seja, aos 12 anos já Albert Fish era um porcalhão do mais badalhoco que o céu cobria. Mas, atenção!, ainda não matara ninguém. E, até ver, um copázio de mijo e um prato de sopa de caca, ainda que deglutidos com o prazer intrínseco de quem dá uma saltada ao fim da noite ao Café do Paço, ali ao Paço da Rainha, em Lisboa, para comer um prego e beber uma imperial, não eram suscetíveis de atirar com quem quer que fosse para os calabouços de qualquer esquadra da velha Washington industrial. E, assim sendo, Fish continuou a seguir os maus exemplos do jovem telegrafista que aos sábados de manhã se introduzia nos banhos públicos para se refastelar com a abundante visão de pénis e de testículos, algo que Alfred tornou indispensável para a sua muito pouco normal mas cada vez mais repentina educação sexual.

 

Cada vez mais porco

Aos 20 anos, Albert Fish estava em Nova Iorque. Soubera instalar-se no universo da prostituição masculina e não tardou a dar um passo decisivo na sua vida nojenta: começou a molestar miúdos adolescentes e muitos deles nem isso. Daí à violação de meninos com menos de dez anos foi um salto de gafanhoto. A mãe, apesar de viver no fundo de uma garrafa de Bourbon, tanto insistiu para que ele se casasse que conseguiu encontrar-lhe uma noiva, Anne Mary Offman, nove anos mais nova do que o bandalho do marido, isto é, uma adolescente abandalhada que desatou a engravidar sem intervalos, vindo a parir seis crianças no espaço de seis anos, Albert, Anna, Gertrude, Eugene, John e Henry. Pobres garotos! Ainda o mais velho mal sabia andar direito e já o pai tinha ido dar com os costados na cadeia de Sing-Sing, acusado de roubo e destruição de propriedade alheia. Alheio ele também a tudo o que se ia passando em seu redor, escreveu para um dos seus companheiros de farra, agradecendo-lhe encarecidamente tê-lo levado a um museu de cera onde estava exposta a estatueta de um homem completamente nu: «Acho que a partir desse dia fiquei com a certeza absoluta de que preciso de entrar pelo caminho da mutilação sexual para obter todo o prazer físico de que necessito». Parece que ninguém lia as cartas dos prisioneiros naquela altura. E se tal descrição e respeito para intimidade dos reclusos é de aplaudir, talvez se alguém tivesse gasto uns segundos a espreitar para o seu conteúdo Albert Fish não seria posto na rua com tanta brevidade.

Fish sofria de alucinações. Uma delas era a visão de Cristo dependurado na cruz. Frequente e insistente. Quando, finalmente, já com 60 anos, foi encarcerado por uma longa lista de crimes houve quem se arrepiasse por ter percebido tão tarde que vivera paredes-meias com tamanha cavalgadura. Houve até um pobre néscio que lhe pôs a alcunha de Bom Velhinho. E como Bom Velhinho atraía endezes para locais ermos e casas abandonadas onde lhe tratava da saúde no verdadeiro sentido do termo.

Depois de estar nas mãos das autoridades, Albert Fish começou a desfiar a enorme lista das suas insanidades, sublinhando-as com um certo tom de orgulho. Um miúdo chamado Billy que lhe caiu nas garras assassinas foi chicoteado com tal violência e frequência que nacos inteiros de pele e carne ficaram espalhados por todo o espaço de um celeiro onde o manteve fechado vários dias, tirando um prazer supino do sofrimento do petiz. «Despi-o primeiro e dei-lhe chicotadas até que o sangue começasse a escorrer pelo corpo e pelas pernas», contou o sádico Fish na sua tão merencória confissão. «Amputei-lhe as orelhas e o nariz e fiz-lhe um corte longo, de orelha a orelha (já retiradas). Ficou com uma boca enorme. Depois extraí-lhe os olhos mas percebi que já estava morto. Foi um bastante aborrecido. Tinha esperança de que fosse mais resistente. Bebi todo o sangue que espichava das partes amputadas do cadáver e senti um enorme alívio de toda a minha sede. Que sentimento maravilhoso. Cortei o corpo do miúdo aos bocados, separei as partes nobres, como os testículos e os rins, por exemplo, e levei-as ao forno com cebolas, cenouras, nabos, sal e pimenta. A carne era suave e quase se desfazia na boca. Foi certamente melhor do que qualquer peru assado que já tinha comido».

A maneira como Fish descreveu grande parte das suas barbaridades, com um semblante perfeitamente inerte como se estivesse a falar de assuntos banais, levaram à tentativa do seu advogado de tentar que fosse dado como louco varrido e, como tal, destinado mais a um hospício do que a uma cadeira elétrica. No dia 11 de Março de 1935, o procurador Elbert F. Gallagher desferiu nas suas alegações derradeiras um fortíssimo ataque contra o castelo construído pelo responsável pela defesa, James Dempsey. Já tinha provado, através do testemunho do médico Fredric Wertham que Albert era dado à autoflagelação e que tinha, segundo um Raio-X, 29 agulhas debaixo da epiderme. O júri não teve contemplações: condenação à morte por eletrocussão. Ironicamente, todas as agulhas que Albert Fish tinha espetado em si mesmo arranjaram um sarilho dos antigos na sala da execução já que provocaram um curto-circuito que obrigou a interromper o procedimento. Fish ainda conseguiu soltar uma frase bem reveladora da sua atitude psicótica: «Esta vai ser a minha sensação suprema!». À segunda descarga, a corrente elétrica fritou-lhe o cérebro. Há quem diga que por todo o lado se podia cheirar um terrível fedor a porco assado…