Por Alice Vieira e Nélson Mateus
Querida avó,
Desde o início do ano que temos visto notícias sobre a “Invasão a Brasília”.
Que vontade de entrar numa máquina do tempo e voltar ao Brasil, a preto e branco, que nos entrava em casa, na década de 70, com o ‘Sítio do Pica-Pau Amarelo’.
Lembras-te? Claro que te deves lembrar! Deu durante uns 10 anos.
Havia a avó Dona Benta, uma avó que vivia no Sítio do Pica-Pau Amarelo, longe da azáfama e do barulho das grandes cidades. Com ela vivia a neta Narizinho e a Tia Anastácia, que cozinhava e cuidava da avó e da neta. Ao viver sozinha, tendo apenas a companhia das duas mulheres muito mais velhas, Narizinho cria um mundo de fantasias. Faz-me lembrar a história da tua vida.
Ainda bem que mais tarde, em 1980, chegou a televisão a cores. Pois assim conseguimos ver as cores da boneca Emília, a melhor amiga (imaginária) de Narizinho, feita por Tia Anastácia com restos de pano. Também viviam no sítio o velho Tio Barnabé e seus ajudantes responsáveis pela manutenção do sítio.
Durante as férias escolares Narizinho tinha como companhia Pedrinho, o seu primo que estudava na cidade grande onde vivia com a mãe.
Dada às artes manuais, Tia Anastácia também fez um amigo para o Pedrinho, o Visconde de Sabugosa, feito de uma espiga de milho velha, que também ganha vida.
No sítio do Pica-Pau Amarelo tudo era possível. A Fantasia misturava-se com a realidade. Recordas-te do Saci-Pererê, da Cuca, e de outros personagens fantasiosos?
Que triste realidade a que nos tem chegado através das notícias! Que falta de “Ordem e Progresso”.
Bem melhor viver no mundo da fantasia do Sítio do Pica-Pau Amarelo! Não concordas?
Bjs
Querido neto,
Realmente 2023 começou com imensa falta de “Ordem e Progresso” no Brasil.
É uma vergonha não aceitarem a democracia. Mesmo que a democracia tenha imensos defeitos, é bem melhor do que vivermos com ditaduras!
É muito triste vermos tudo destruído. Assim se apagam (ou tentam apagar) décadas da história do Brasil.
Claro que me lembro do ‘Sítio do Pica-Pau amarelo’.
Tal como tu, os meus filhos, que são da tua geração, também eram fãs da série.
Lá em cada passávamos a vida a cantar o genérico:
«Marmelada de banana, bananada de goiaba; Goiabada de marmelo; Sítio do Pica-Pau Amarelo»
«Boneca de pano é gente, sabugo de milho é gente; O sol nascente é tão belo; Sítio do Pica-Pau Amarelo»
«No país da fantasia; Num estado de euforia; Cidade polichinelo; Sítio do Pica-Pau Amarelo»
Esta letra foi escrita por Gilberto Gil. Mas existiam muitas mais.
Gostei muito que Gilberto Gil tenha sido Ministro da Cultura do Brasil, entre 2003 e 2008.
O que eu me ria com a Cuca, a bruxa em forma de jacaré, ou “jacaroa” como dizia a boneca Emília.
O meu personagem preferido era o Saci-Pererê. Um menino só com uma perna que usava um gorro encarnado na cabeça, fuma um cachimbo (imagina se hoje era possível tal coisa) e andava em redemoinhos de vento e folhas secas.
Era no gorro que estavam os seus poderes. Se não o usasse não consegui andar no redemoinho nem fazer magia.
Como não podia deixar de ser, o personagem preferido do meu filho era Visconde de Sabugosa, que já referiste. Penso que era devido ao personagem viver no meio dos livros, ter uma admirável sabedoria, tornando-se intelectual e cientista.
Claro que, tal como a Narizinho, a minha filha adorava a boneca Emília.
Quando for a Lisboa vou procurar ambos os bonecos.
O que nos vamos divertir a recordar fascículos do século passado.
Cuidado com o frio!
Bjs