Por Luís Ferreira Lopes
Ex-Assessor para Empresas e Inovação do Presidente da República e Ex-Editor de Economia da SIC / SIC Notícias
Temos motivos para preocupação com os efeitos da guerra ou de terramotos (ex: Turquia e Síria) nas vidas dos que mais sofrem com essas tragédias, em primeiro lugar, mas também nas vidas das famílias e das empresas e organizações que, não estando no campo de batalha da Ucrânia, sentem as consequências económicas, financeiras e sociais da invasão da Rússia de Vladimir Putin ao território europeu que pertence ao povo ucraniano.
Assistimos incrédulos, ao longo de um ano, aos bombardeamentos a alvos civis. A novas vagas migratórias de gente que perdeu todos os bens. Ao horror das crianças mortas, feridas ou que perderam os seus pais. À frieza, de inspiração stalinista, na técnica do ‘general Inverno’ que Putin recupera para matar pessoas pelo frio, enquanto bombardeia unidades de produção energética essenciais para as populações. Neste canto ocidental e ensolarado da Europa, preocupamo-nos com a elevada inflação, os juros altos e os empréstimos mais caros ou a subida do preço das matérias-primas. E temos motivos para preocupação porque estamos fartos de crises, pandemias, guerras e, claro, menos dinheiro na carteira.
Com a pandemia covid-19 e agora com a inaceitável invasão da Rússia à Ucrânia, percebemos na pele que, em situação de emergência ou de guerra (perante inimigos visíveis ou invisíveis), é uma necessidade e imperativo apostarmos na proteção dos nossos e na defesa dos valores inegociáveis. Pragmaticamente, o único mérito desta guerra que dura há um ano foi o de despertar a opinião pública e os líderes europeus e ocidentais para as questões da segurança energética, da Defesa em prol da paz, da relevância das relações transatlânticas ou da solidariedade para com povos irmãos.
Se temos essa consciência cívica mais desperta, isso deve-se, em boa parte, ao trabalho do jornalismo livre, sério e independente (e não ao ‘esgoto’ de quem destila ódio e intimidações amadoras nas redes sociais). No dia em que escrevo esta crónica (16 de fevereiro), celebra-se o dia do Repórter, ou seja, do jornalista que, pela escrita, voz e imagem, pesquisa, investiga, transmite factos de interesse público que podem e devem chegar aos recetores da mensagem através dos mais diversos canais e formatos. É uma necessidade básica das sociedades contemporâneas.
Sem repórteres independentes e objetivos, sem a pena (agora a caneta e o computador), a lente (fotográfica ou câmara de TV e vídeo ou telemóvel) e a voz (ex: rádio tradicional, TV, sites, podcasts), a opinião pública não teria acesso a informação credível sobre tudo o que se passa de errado e de positivo à nossa volta. Porque não há notícias boas ou más. Há factos relatados sobre a forma de notícia, reportagem, entrevista, crónica… e isso tem valor, sobretudo, pelo que significa de Direito fundamental de liberdade de expressão e de imprensa.
Sem repórteres e sem historiadores e outros cientistas sociais, não teríamos conhecimento, nem veríamos, o início da primavera árabe na Líbia, a 17 de fevereiro de 2011, que levou à queda e morte de Muammar al-Gaddafi. Não teríamos memória de que, neste mesmo dia, em 1919, a República Popular da Ucrânia pediu ajuda à França e ao Reino Unido (pilares da Tríplice Entente, da qual fazia parte a Rússia dos czares) e aos Estados Unidos da América contra as forças bolcheviques /soviéticas que invadiram aquele território, tal como agora a história se repete sob a liderança de Vladimir Putin – que envergonha até os comunistas que acreditavam no homem novo.
Sem repórteres, cronistas ou historiadores, não celebraríamos os feitos de Gago Coutinho (nascido a 17 de fevereiro de 1869), o destemido militar e geógrafo que atravessou, com Sacadura Cabral, o Atlântico Sul num ato heroico e pioneiro para a aviação mundial. E, na cultura, não teríamos eco das notas inesquecíveis da guitarra de Carlos Paredes, o genial guitarrista e compositor, nascido a 16 de fevereiro de 1925 – e que tive o prazer e a honra de ouvir várias vezes, inclusive num célebre concerto na aula magna da Universidade de Lisboa, onde entrou a não querer pisar o longo manto das capas negras dos estudantes universitários.
E, sim, o repórter – que relata os factos com a imparcialidade possível – também se emociona, é humano e, sem qualquer dúvida, escreve de forma diferente do ‘repórter’ ChatGPT. Mas no dia do Repórter é relevante lembrar a crise económica e financeira dos media e as dificuldades dos proprietários dos órgãos de comunicação social em pagar salários e celebrar contratos dignos a Jornalistas que não confundem a profissão com práticas anti-éticas de dar media training ao empresário ou ao político que vão entrevistar a seguir ou aqueles que passavam férias na neve durante largos anos com banqueiros que depois arrasaram nas televisões e jornais, quando esses empresários foram acusado de crimes pela Justiça. E tanto haveria a falar / escrever sobre isso…
Os media são um negócio que, sim, tem de ser viável. Para produzir e partilhar conteúdos noticiosos que são relevantes e fundamentais para a Democracia e a Cidadania. E, sim, para pagar custos salariais aos repórteres e outros profissionais que, sem agendas escondidas, trabalham para honrar a Liberdade que, como (quase) tudo na Vida, tem valor e tem um preço.
É também por tudo isto que continuamos a acreditar (e a fazer acontecer) num Portugal bem melhor, com Confiança e Esperança – valores (essenciais para os Cidadãos da Polis que queremos ver renascida) que não se compram, nem vendem em pacotes de açúcar.