Na semana passada num outro semanário um político e um dos colunistas principais desse jornal davam o mote, os casos de pedofilia de homens que usaram Igreja são a consequência inevitável da doutrina e da moral cristã. Quase que parece que foi para isso que serviu a ‘Comissão Independente’.
Todos os estudos rigorosos demonstram que a pedofilia acontece maioritariamente no seio da família, pais e padrastos são os principais violadores. É a família e Portugal pedófilo?
A tentativa de tornar a igreja pedófila tem-me feito pensar muito no cristianismo…Gostava de conseguir tornar-me cristão, não sou, penso que nunca o conseguirei ser…Deus a existir não será acessível, só o concebo numa teologia apofática, mas toda a mensagem do cristianismo condensa o mais admirável sistema ético já concebido. Se homens como Dostoiévski, Bernanos, Peguy entre tantos outros eram crentes, alguma coisa de profundo e admirável haverá. Não consigo ficar indiferente a vivência distintas, mas semelhantes no essencial, em gente como Bento de Nursia, Simone Weil, Maximiliamo Kolbe e tantos outros. Penso na descoberta recente de Rob Dreher e nessa mensagem da opção beneditina e de como este tempo, materialista, niilista e relativista é o mais estimulante dos tempos para ser cristão…Dreher fala na importância de reviver o percurso de São Bento, um mundo cada vez mais desumano que tem de ser abandonado para se refazer a fé e a opção pelo cristianismo em pequenas comunidades de genuínos crentes.
Refiro dois livros de Rob Dreher, A Opção Beneditina, e um outro que toma para si um título de Soljenítsin, Não Viva por Mentiras. Esse Soljenítsin que para explicar as grandes catástrofes do regime comunista recordava sempre o que ouvira em criança de pessoas mais velhas: «Os homens esqueceram-se de Deus; é por isso que tudo isso aconteceu». Ora, também na igreja e não só, muitos homens se esqueceram de Deus e esse esquecimento explica as principais catástrofes do século XX e XXI.
Penso na ditadura do relativismo e no vazio frívolo do que é o liberalismo e as falsificações do progressismo. Por exemplo, nas pessoas que falam de Dostoiévski, que o admiram, um dos mais sábios dos homens, e não o compreendem, não se percebe Dostoiévski sem o cristianismo. Quando este diz que a beleza salvará o mundo, não está a referir-se a um qualquer estado estético perante a existência, está a falar da beleza da fé, do cristianismo…Quando diz que se Deus não existe tudo é possível, não está a fazer um jogo de palavras, está a afirmar que sem fé e sem Deus o mundo e a existência são desprovidos de sentido.
O ateísmo tendo de modo agravado todos os defeitos das religiões, não oferece nenhuma das suas qualidades. O que produziu a religião ateísta até hoje? O jacobino, o homem soviético, o homem liberal progressista de Mill, a besta superior do nazi, o empreendedor amoral do neoliberalismo, o egoísta de Ayn Rand. Todos esses modelos são aberrações.
O ateísmo contemporâneo é uma degradação aprofundada do monoteísmo, daí a profusão de cópias em negativo do cristianismo. A providência é agora o progresso, Deus é agora o homem, o que é patético, o caminho da salvação é o consumo e o wokismo… A humanidade, a ciência, a tecnologia, até os transhumanismos, mais não são que simulacros de religiões sem deus, a procura condenada ao desespero e ao absurdo de substitutos de Deus.