Portugal é um dos países em que se trabalha mais horas e, curiosamente, também um daqueles em que a produtividade é menor. É o país do almoço de duas horas, da pausa para o cafezinho, para o cigarrinho e das reuniões intermináveis para tratar assuntos que se resolviam em poucos minutos. Uma conclusão rápida e lógica seria a de que muitas pessoas gostam mais de estar no trabalho do que de estar em casa ou noutro sítio qualquer. O que é verdade para algumas, mas nem para todas. O problema é que é um modo de estar e de trabalhar já enraizado, difícil de mudar. E se para alguns não faz diferença, há quem gostasse de ter um ritmo diferente, de fazer outras coisas a seguir ao trabalho, acabando por ficar preso naquela cadência.
Independentemente da razão, a realidade é que passamos demasiado tempo no trabalho e que a vida familiar se organiza em função dele, em vez de ser o trabalho a adaptar-se à vida pessoal e familiar. Assim, há por exemplo mães que após o nascimento de um filho regressam ao trabalho angustiadas, pagando a alguém para fazer o que devia ser a sua prioridade; há crianças que passam demasiado tempo na escola; outras que não veem os pais à noite; as que têm de dormir em casa dos avós porque os pais saem muito cedo ou trabalham até muito tarde; pais que não têm tempo para brincar com os filhos, para os ajudar e acompanhar com os trabalhos da escola, para estarem simplesmente com eles, de os ver crescer, de aproveitar este período que passa tão depressa.
Ter um trabalho que possibilite ir buscar os filhos à hora normal de saída da escola é quase uma utopia e por isso veem-se muitas vezes outros familiares ou alguém que ajuda em casa a fazer esse papel ou, na pior das hipóteses as crianças ficam na escola até às sete da noite, chegando algumas a permanecer lá durante 12 horas. Uma brutalidade e um absurdo! Tal como é absurdo às 20h ainda haver trânsito nas estradas das pessoas que regressam a casa.
O trabalho é essencial para a sociedade e também em termos pessoais e familiares. Não só financeiramente, mas porque traz realização, reconhecimento, aprendizagem, superação, crescimento, sociabilização, abre o pensamento e horizontes. Mas não é suposto que o trabalho se sobreponha a tudo o resto e que seja mais importante do que a família, por exemplo. As duas coisas podem e devem ser conciliáveis para que se tornem também mais recompensadoras e promotoras de bem-estar a todos os níveis. Seria de repensar a produtividade e tempo de trabalho no nosso país, de fazer um esforço para que esse tempo seja útil para que a seguir se possa folgar; de considerar, promover e valorizar os trabalhos a tempo parcial, que são os únicos possíveis para algumas famílias; de ter mais trabalhadores com um horário menos abusivo. Para que haja bem-estar, motivação e bom ambiente no trabalho e também em casa, para que as crianças possam crescer ao pé dos pais e que um dia estes não se arrependam de não terem vivido a infância dos filhos por terem estado fechados no escritório.
Viver em esforço leva muitas vezes as pessoas ao limite, a depressões, a ambientes familiares complicados, a mal-estar e doença em adultos e crianças. Pode haver uma conciliação racional e saudável, para que se possa estar bem nos dois contextos e que se chegue a casa com ânimo, disponibilidade e vontade para iniciar um novo período do dia.