por Luís Ferreira Lopes
Centenas de empresários e gestores reuniram-se, em Carcavelos, e afirmaram ao que vêm e o que querem para o país, em tempos conturbados de crispação social e político-institucional e de prolongada turbulência económico-financeira mundial. Vale a pena refletir sobre algumas das mensagens e conclusões da conferência do Business Roundtable Portugal (BRP) que teve lugar na Nova SBE, a 20 de março.
Esta entidade visa defender a causa das grandes empresas (ainda) existentes em Portugal e apresentar propostas e reflexões para o crescimento económico forte e sustentado do país, sem o qual (não é demais sublinhar) não há geração (e distribuição) de riqueza e emprego. Finalmente, após meses de estudos preparados por grupos de trabalho, a direção do BRP defendeu e debateu as suas propostas, contando com a presença do Presidente da República no encerramento, em Carcavelos.
É óbvio que uma pequena e aberta economia como a portuguesa necessita de empresas com escala e dimensão internacional e de um modelo de crescimento assente nas exportações de valor acrescentado. Os pressupostos básicos para esse crescimento são conhecidos, em especial quanto à redução de custos de contexto há muito identificados como a incerteza fiscal, justiça lenta, carga fiscal elevada, burocracia na administração central e local e a nem sempre falada corrupção aos mais diversos níveis do Estado.
Além disso, é preciso garantir variáveis relevantes como segurança, telecomunicações e vias de transporte funcionais e de padrão europeu; resolver o problema grave da falta de mão de obra (em quase todos os setores) e reter/captar talento, em especial pessoas qualificadas, o que passa também pela aposta na formação universitária e dos cursos técnico-profissionais; investir em inovação, construção de notoriedade do país e marcas fortes; executar uma estratégia ambiciosa a dez ou vinte anos (que tem de existir!) que não esteja refém de efémeros fundos comunitários, para que os empresários, os gestores, os quadros e os trabalhadores que vivem e descontam em Portugal sintam que faz sentido estar aqui e não noutra qualquer geografia ou num mercado que pague melhor.
O conteúdo dos dois parágrafos acima é algo que defendo há mais de três décadas no jornalismo económico, em livros, trabalhos académicos e na mais recente e desafiante missão pública em Belém, mas a conferência do BRP, pela representatividade dos seus protagonistas, vem colocar os pontos nos i’s. E isso acontece no momento certo de uma inexplicável letargia de chefias na esfera pública portuguesa (política e militar), de uma desorientação político-institucional que é totalmente dispensável e de uma tempestade perfeita de custos de produção caríssimos, juros e inflação a níveis recorde e de uma guerra aparentemente interminável na Europa – veremos os efeitos da visita do Presidente da China a Moscovo, mas remeto para a crónica que aqui escrevi a 28 de janeiro, intitulada: Guerra: Pequim obrigará Moscovo a fazer a paz?
O movimento BRP recorda que apenas 1% das (grandes) empresas gera 57% do valor acrescentado (VAB) e 71% dos impostos, em sede de IRC. E avisa: com mais 150 grandes empresas, o VAB do país poderia crescer mais 4%, as exportações aumentariam 10% e a receita fiscal agregada 5%. A missão da associação liderada por Vasco de Mello é a de «apoiar o nosso país a crescer» (ler notícia sobre conferência BRP, nesta edição). Curiosamente, isto mesmo foi afirmado tantas vezes por Rui Nabeiro, fundador da Delta Cafés, cuja morte aos 91 anos, no simbólico dia 19 de março (dia do pai), comoveu grande parte da população portuguesa pela sua liderança de traço humanista e solidária que, convém lembrar, nem sempre está associada aos empresários e gestores em Portugal. O país perdeu um notável líder empresarial autêntico e genuíno, sonhador que sabia fazer, empreendedor que cresceu a pulso e nunca perdeu o traço de humildade que só os grandes homens de carácter conseguem manter ao longo de uma vida verdadeiramente inspiradora.
O seu exemplo e legado foi recordado por milhares de personalidades da vida política e empresarial, trabalhadores da Delta, amigos de todos os estratos sociais e população de Campo Maior e do Alentejo. Através dos media, os portugueses perceberam a dimensão daquela despedida e homenagearam quem criou riqueza e emprego com clara preocupação pelas suas gentes e pelo território do interior do país – mesmo tratando-se de uma grande empresa com forte presença internacional que, sob a liderança de Rui Nabeiro, nunca aceitou ser vendida a multinacionais estrangeiras.
Para quem critica ferozmente os empresários e gestores que trabalham e criam riqueza em Portugal, por motivos ideológicos, a partida de Rui Nabeiro foi um alerta irónico num país cada vez mais empobrecido e em revolta social. Deveríamos respeitar mais quem gera riqueza e cria ou mantém postos de trabalho, com o esforço desproporcionado de ser empreendedor num país de impostos pesados, onde existe um estigma contra os empresários e onde a inveja quase mata, qual fogueira que atraía as turbas nos autos de fé. Desta vez, o povo juntou-se para agradecer a quem fez o bem – porque era essa a sua forma de estar na vida e não para ficar bem nos relatórios de responsabilidade social que hoje estão na moda. Partiu um senhor (que não era doutor ou engenheiro) que era um sábio pela obra feita e pelo sorriso afável.