A inflação e a consequente subida dos preços dos bens alimentares têm transformado a realidade de milhares de portugueses, que sentem cada vez mais dificuldade para encher o frigorífico. Se antes se podiam “dar ao luxo” de comprar um queijo melhor ou um bom vinho, talvez agora a prioridade seja levar apenas o “essencial”.
Mas se há quem entre nos supermercados com o dinheiro contado, optando pelos produtos mais económicos e à espreita dos descontos, há, por outro lado, quem continue em busca da melhor qualidade possível, sem olhar para os preços, quer seja em secções especiais de supermercados, seja através de sites estrangeiros ou em mercearias tradicionais espalhadas pelo país.
Vinhos a mais de 6 mil euros, caviares a mais de 800, bifes a 190, melancias a 70 e até águas com tampas revestidas por 500 cristais Swarovski. E, ao contrário daquilo que se possa pensar, não é assim tão difícil encontrá-los.
Produtos de luxo em hipermercados
Vagueando pelos corredores do supermercado do Continente do Cascaishopping, chegando à zona das bebidas alcoólicas, o visitante depara-se com duas portas de vidro a proteger as garrafas mais exclusivas. Pode abri-las. Lá dentro, duas garrafas na prateleira mais alta chamam a atenção. Perto de outros vinhos e bebidas espirituosas mais comuns, a garrafa do lendário Petrus – objeto de fascínio entre enófilos do mundo inteiro (apesar de plantada em todo o mundo, é no Pomerol, sub-região de Bordeaux, na França que a casta Merlot se destaca) – está à venda por 6,900 euros. Ao seu lado, o Cognac Rémy Martin Louis XIII – misturado a partir de mais de 1200 eaux-de-vie oriundas da região de Champagne, e envelhecidos até 100 anos em barricas – custa 3,225 euros.
Já no El Corte Inglês, é no Club del Gourmet que os paladares mais exigentes encontram produtos de exceção com uma etiqueta de três ou mais dígitos. Começando nos caviares, uma unidade de 100 gramas de Caspian Pearl Caviar Beluga, por exemplo, custa 819 euros (8,190 € / Kg), enquanto a mesma quantidade de Calvisius Caviar Beluga custa 748,99 euros (7.489,90 € / Kg). Nos presuntos, uma peça de 6,5 kg de Porco Preto Presunto de Barrancos Selecção Gourmet DOP chega aos 578,50 euros (89 € / Kg) e uma peça de peso idêntico de Presunto 100% Ibérico Bolota custa 499 euros (76,77 € / Kg). Mas se falarmos daquele que é considerado o melhor presunto do mundo, da casa Joselito, da região de Salamanca, uma embalagem de Presunto de Bolota Ibérico Vintage custa 33,99€, o que perfaz 485,57 € / Kg.
Já o queijo mais caro, um quilo de Queijo Azul importado dos EUA_pode custar 136,95 euros, seguindo-se o Fromi Queijo Moliterno Al Tartufo ½, com trufas, a 66,89 euros o quilo.
Mas é definitivamente na garrafeira que os preços disparam. O Taylor’s Vinho do Porto Very Old Tawny, uma garrafa de 50 cl, atinge 3,095 euros. Já o vinho nacional mais caro custa 1,890 euros:_é o Barca-Velha Vinho Tinto do Douro na versão magnum (garrafa de 1,5 L). Quando passamos para champanhes, o mais caro (Champagne Salon Le Mesnil 12), custa 1,190 euros, enquanto na secção de licores e destilados, o whisky mais caro (The Macallan Whisky Single Malt 30 anos) custa 5,890 euros. Uma bagatela, se tivermos em conta que uma garrafa de Macallan de 1971 (fine & rare cask 7556, disponível em plataformas especializadas online), custa 24500 euros.
Mercearias tradicionais
Além dos hipermercados, que cada vez mais têm produtos diferenciados, também nas mercearias tradicionais se encontram estas iguarias de luxo. Em Lisboa, por exemplo, perto do Rossio, com presuntos pendurados por cima do balcão, a Manteigaria Silva é considerada uma “pérola do comércio tradicional lisboeta”. A loja abriu portas em 1890, na atual Rua D. Antão de Almada, na altura apelidada Rua dos Correeiros. Foi em 1922 que adquiriu o nome atual. À época vendia-se unicamente manteiga e seus derivados. Porém, atualmente, o espaço é atrativo sobretudo pela sua charcutaria, além do famoso bacalhau.
O Presunto Bolota Vintage 60 meses custa 1,250 euros, sendo o mais caro da loja. Segue-se o Presunto Porco Alentejano Bolota a 490. No que toca ao preço do queijo, este não é tão alto como aqueles que encontramos no Club Del Gourmet. O mais caro é o Queijo de Ovelha Reserva 4 Meses, 750gr custam 50,90 euros. Já os vinhos mais caros não chegam aos 2 mil euros.
Ali ao lado, na rua mais pequena de Lisboa, na Rua da Betesga, entre o Rossio e a Praça da Figueira, encontra-se a Mercearia Manuel Tavares, que abriu portas em 1860. Aqui o preço dos queijos não faz arregalar os olhos, já que não passa dos 30 euros, enquanto os presuntos não ultrapassam os 50. Já na garrafeira, o Croft vintage 1936 está a 3,990 euros, seguido pelo Niepoort vintage 1945, a 3,330 e pela Barca velha colheita 1991 (1,5 lt) a 1,395 euros.
Mas não é apenas nos presuntos, queijos e nos vinhos que os preços surpreendem. Há também quem goste de comer uma boa carne, mesmo que tenha que pagar centenas de euros por um bife. No Home Butcher – talho que abriu no Mercado de Arroios em 1988 e que agora funciona também no espaço virtual – as opções vão desde o bovino às aves, ao porco, às carnes maturadas. Um dos ex-libris é a carne Wagyu, que significa “vaca japonesa”. Considerada uma das carnes mais tenras e saborosas do mundo, o preço de uma peça inteira pode ir até aos 190 euros por quilo. Ou seja, um bife pode custar facilmente 50 euros.
Frutas “raras”
E a fruta? Segundo a Eurostat, embora a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomende o consumo de, pelo menos, cinco porções de fruta e legumes frescos por dia, apenas 13,9% dos cidadãos da União Europeia atinge essa meta.
Nessa lista, Portugal destaca-se pela positiva: é o segundo país onde se come mais fruta, 79,3% da população consome, pelo menos, uma porção de fruta e legumes por dia. 61,3% consome entre uma e quatro porções, enquanto 18% consomem cinco porções ou mais. Com o aumento dos preços, talvez vejamos o país cair do top da lista. Contudo, há sempre exceções à regra e há mesmo quem procure as melhores frutas do mundo, sem se preocupar com o preço. Em Portugal, uma das frutas mais caras é o maracujá amarelo que, no El Corte Inglês, por exemplo, se encontra a 15,99 euros o quilo. Também a pithaya é vista como uma fruta que abrilhanta as mesas mais abonadas: no mesmo local, o quilo custa 14,49 euros.
A Grande Consumo, revista dos negócios da distribuição, possui uma lista daquelas que são as frutas mais caras do mundo. Entre elas encontram-se as melancias japonesas em forma de cubo, vendidas a 10000 Ienes no país de origem, o equivalente a 70 euros. Os ananases oriundos dos Jardins Perdidos de Heligan, em Inglaterra, levam cerca de dois anos a ser cultivados e, por isso, apresentam um preço de cerca de mil dólares por ananás, o equivalente a 927,49 euros. Da lista das frutas mais exclusivas fazem também parte as uvas japonesas Ruby Roman. Cada cacho tem cerca de 30 uvas e cada uma pesa cerca de 20 gramas. O preço de leilão chega a ser de 9,350 dólares por cacho, cerca de 8 mil euros.
Água com cristais
E até a água pode ser sinónimo de requinte. A empresa de garrafas BKR lançou a 500 Collection que inclui quatro modelos de garrafas de água disponíveis nas cores rose gold, rosa pastel, branco e preto, todas com tampas revestidas por 500 cristais Swarovski.
Criada em 2011 por Tal Winter e Kate Culter, a BKR acredita que desenhar produtos – neste caso, garrafas de água – com um design apelativo pode mudar o mundo, ao incentivar mais pessoas a beberem água. Os lucros de vendas da garrafas que custam 150 libras, o equivalente a 170 euros, são doados à organização Water for People, para fornecer água potável a quem precisa.
Portanto, se há quem faça uma mesa de entradas com menos de 10 euros, há quem, em presuntos, queijos, bebidas, caviar e algumas frutas, gaste mais de 10 mil.