Trump e escândalos de braço dado

Donald Trump é o primeiro antigo presidente dos EUA a ser detido. No centro da polémica, encontra-se a atriz de filmes pornográficos, Stormy Daniels, que garante ter sido amante do ex-presidente e que este lhe pagou pelo seu silêncio. Contudo, mesmo acusado e até indiciado, o político continua a poder recandidatar-se ao mais alto cargo…

Trump e escândalos de braço dado

Se há quem goste de escândalos é ele. Umas vezes criados pelo próprio, outras vezes a perseguirem-no como o gato ao rato. A verdade é que andam de mãos dadas. E o princípio do mês foi marcado por um momento histórico. O empresário Donald Trump, ex-presidente dos EUA, enfrentou o tribunal de Nova Iorque – esta é a primeira vez que um ex-chefe de estado do país vira réu num processo judicial que pode levá-lo à cadeia.

Mas, ao contrário das investigações que surgiram durante o seu tempo na Casa Branca – quando enfrentou acusações sobre as suas táticas ostensivamente agressivas no cenário internacional, as suas tentativas de derrubar a eleição de 2020 e a sua convocação de uma multidão para invadir o Capitólio dos EUA – o caso que o levou às barras da Justiça criminal é construído em torno de um episódio espalhafatoso que antecede a sua gestão na Casa Branca.

Trump está a ser acusado de ter cometido 34 crimes de falsificação de contas de forma a justificar o suposto suborno de 130 mil dólares, o equivalente a 119,10 mil euros, à atriz de filmes pornográficos, Stormy Daniels, que garante ter sido amante do ex-presidente. Contudo, o político afirma ser «inocente», e isso tem gerado um verdadeiro frenesi por parte dos seus apoiantes e opositores.

A denúncia indica que o pagamento a Stormy aconteceu nas vésperas das eleições presidenciais que resultaram na vitória de Trump, em 2016. A ideia era que ela não revelasse para os meios de comunicação o caso extraconjugal que teve com Trump 10 anos antes.

Numa entrevista em 2011, a atriz deu detalhes de como teria acontecido o encontro entre os dois. A entrevista foi dada à revista In Touch Weekly e só foi publicada em janeiro de 2018. Na altura, Daniels contou que o empresário a convidou para jantar. Encontraram-se num quarto de hotel na Califórnia. «Ele estava esparramado no sofá a ver televisão ou algo assim. Estava vestido com as calças de pijama», disse à publicação. A atriz admitiu também ter-se envolvido sexualmente com Trump. O encontro aconteceu quatro meses após o nascimento do filho, Barron, fruto do relacionamento do multimilionário com Melania Trump.

Recorde-se que Michael Cohen, advogado de Trump, à época, acabaria por se declarar culpado de 8 acusações criminais (incluindo uma violação de financiamento de campanha pelo pagamento de Daniels em agosto de 2018). Sob juramento, o advogado admitiu que a pagou «em coordenação com e sob a direção de um candidato a um cargo federal». Porém, tanto Trump quanto o seu advogado, Rudy Giuliani, afirmaram que Trump reembolsou Cohen pessoalmente em 2017 e não usou dinheiro de campanha. Cohen acabou condenado a três anos de prisão federal por várias acusações.

De acordo com a imprensa norte-americana, além de ter pago o silêncio desta mulher, a investigação alega que Trump pagou a outra mulher para impedir que fizesse declarações negativas sobre si e, segundo a CNN, pelo menos 26 mulheres, desde os anos 1970 o acusam de má conduta sexual, incluindo assédio. Uma das frases que ficará para a história e que lhe valeu uma onda de ódio por parte das feministas de todo o mundo, foi dita em 2005, numa gravação revelada apenas em 2016, em que afirmava que «era preciso agarrar as mulheres pelos genitais».

Além de tudo isto, as acusações dizem que este realizou pagamentos através de empresas fantasma e assinou declarações falsas, incluindo de pagamentos de impostos.

Stormy Daniels deverá ser chamada como testemunha dos procuradores, durante o julgamento, que poderá só acontecer dentro de um ano. O processo inclui 16 páginas, apresentadas a Trump e à sua equipa de advogados. O político deverá regressar ao tribunal dia 4 de dezembro.

Antes de chegar ao tribunal, o ex-presidente reagiu nas redes sociais. «É surreal. Não acredito que isto está a acontecer na América», escreveu no Twitter. Logo após a audiência, o seu advogado, Todd Blanche, reforçou essa mensagem: «É um dia triste», afirmou, acrescentando que não foi surpreendido pelas acusações e que o seu cliente, «está frustrado» e «transtornado».

Segundo as informações da Reuters, o total de acusações renderiam uma sentença máxima de 136 anos, no entanto, «é improvável que Trump fique tanto tempo preso no caso de condenado pela investigação».

Rússia, covid, Capitólio e futuro

Para além deste escândalo, a bolha estourou também quando este foi acusado de beneficiar de uma suposta intervenção russa nas eleições presidenciais de 2016.

Segundo os meios de comunicação internacionais, o FBI James Comey revelou perante o Congresso uma investigação sobre uma possível conspiração entre membros da campanha de Trump e Moscovo para sabotar as aspirações presidenciais de Hillary Clinton. Seguiu-se uma exaustiva investigação de mais de 400 páginas, com mais de 2.800 intimações, indiciamentos e prisões de colaboradores de campanha. Contudo, o magnata saiu impune, já que de acordo com o documento, «não havia evidências suficientes para considerar uma conspiração de Trump ou da sua campanha com o governo russo».

Trump também é conhecido pelos problemas que teve para lidar com a pandemia da Covid-19. No auge da disseminação da covid-19, o político além de demorar para implementar as medidas para minimizar o problema, demonstrou abertamente a sua indiferença ao vírus: participou em eventos públicos sem usar máscara e, em muitos momentos, não respeitou as medidas sanitárias. Consequentemente, acabou por testar positivo no final da campanha eleitoral.

No leque de tempestades que teve de enfrentar durante a sua estada na Casa Branca, Trump tornou-se ainda o terceiro presidente da história dos EUA a sofrer impeachment, após as acusações contra Andrew Johnson (1868) e Bill Clinton (1998).

Foi revelada ainda uma conversa entre Trump e o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, na qual supostamente pressionou o presidente ucraniano a investigar Joe Biden e o seu filho Hunter, em troca de mais de 300 milhões de dólares.

No seguimento da revelação, os democratas acusaram-no de abuso de poder e a Câmara dos Deputados aprovou o seu julgamento no Senado. Contudo, os republicanos do Senado impuseram a sua maioria, acabando por absolver o então presidente no início de 2020.

Poucas semanas após a sua saída, houve outro escândalo que deu origem a um novo impeachment, depois do assalto ao Capitólio ocorrido a 6 de janeiro. Segundo a Câmara dos Deputados, Trump instou os seus apoiantes a manifestarem-se contra os resultados da eleição presidencial vencida por Joe Biden.

Em setembro do ano passado, o The New York Times divulgou uma reportagem em que revelava que o empresário americano pagou apenas 750 dólares em impostos federais em 2016, quando foi eleito presidente, e o mesmo valor em 2017. Além disso, conta a investigação, este não pagou impostos de renda em 10 dos últimos 15 anos, utilizando um método de otimização fiscal alavancado no reporte de inúmeras perdas.

Trump havia afirmado anteriormente que continuaria na luta pela liderança do Partido Republicano, mesmo se fossem levantadas acusações criminais contra ele.

De acordo com uma sondagem Reuters/Ipsos, divulgada na segunda-feira passada, mesmo com todas estas polémicas, cerca de 48 por cento dos republicanos afirmam que querem ter Trump como seu candidato, acima dos 44 por cento da semana anterior