Um género de catequização

O Chega não só trouxe a ideologia de género para a agenda parlamentar, como achou normal que os impostos pudessem ser gastos na criação de milhares de casas de banho das escolas de 713 agrupamentos.

Por Nuno Melo

Em Portugal há escolas sobrelotadas, com cantinas sem condições, salas onde a chuva entra, outras exíguas, sem serem intervencionadas, por não existirem recursos financeiros suficientes.

Os professores, com salários baixos, por vezes incompatíveis com as despesas que suportam, enredados em trabalhos administrativos, muitos deslocados e longe da família e com a contagem do tempo de serviço congelado, estão na rua em protesto, profundamente desmotivados.

Neste momento, há cerca de 20.000 alunos sem professor a, pelo menos, uma disciplina.

Apesar disso, para o PS, PAN, BE, Livre e Chega, acompanhados pela IL, os escassos recursos dos contribuintes devem ser direcionados para a concretização da agenda forçada da ideologia de género, aplicada até a crianças necessariamente imaturas, que muitas vezes precisam dos pais para escolherem a roupa, mas poderão decidir sobre questões sensíveis e determinantes como as de um género desconforme com a biologia, ou a identidade sexual. Estão profundamente errados.

No caso do Chega, de resto, impressiona perceber como o discurso inflamado feito a pensar no consumo externo, bateu de frente contra a realidade de uma iniciativa legislativa – Projeto de Lei 705/XV/1 – que desmente cada palavra.

Na propaganda o Chega garantia que jamais aceitaria a ideologia de género nas escolas. Na prática e na verdade, só o Chega propôs a criação de instalações sanitárias e balneários «não caracterizados a que se pode aceder sem qualquer critério de género» (artigo 12.° -A), defendendo que «os estabelecimentos do sistema educativo, independentemente da sua natureza pública ou privada, devem garantir as condições necessárias (…) para que as crianças se sintam respeitadas de acordo com a identidade de género e a expressão de género manifestadas e as suas características sexuais».

Quer isto dizer que o Chega não só trouxe a ideologia de género para a linha da frente da agenda parlamentar, como achou normal que os impostos pudessem ser gastos na criação ou adaptação de milhares de casas de banho, tantas quantas as escolas de 713 agrupamentos, pressupondo-se que a regra não poderia deixar de se aplicar a todas. Tudo normal, num partido que se diz defensor das touradas, mas contratou uma assessora do PAN e que diz combater a subsidiodependência, mas propôs um apoio de 125 euros para todos os portugueses, ricos, pobres e remediados, durante todos os meses do ano 2023, nisso assegurando – tivesse sido aprovado o disparate –, um rombo nas finanças públicas superior ao orçamento do SNS.

Para o CDS-PP, fique claro, a obsessão catequizadora dos promotores da ideologia de género, transformada em tema político de primeira grandeza, não tem nada que ver com liberdade. Traduz uma inversão de prioridades errada, que desvia a atenção dos verdadeiros problemas do país, para além de expor crianças e jovens necessariamente imaturos a um experimentalismo social com consequências imprevisíveis.