As provas de aferição, que começam no próximo mês, voltam a dar que falar. Ainda mais porque este ano são em formato digital. Há professores a pedir à direção que não sejam realizadas, greves marcadas e muitos pais que já anunciaram que nesses dias os filhos não irão à escola.
Teoricamente estas provas existem para fazer uma avaliação do ensino, o que faz supor que com os seus resultados alguém fará alterações no que parecer estar menos bem. E, supostamente, também servirão para que os docentes e encarregados de educação possam ter uma visão das capacidades e dificuldades de cada aluno.
Acontece que, embora todos repitam que estas provas não contam para a avaliação e que não são motivo de preocupação, logo no início do ano são apresentadas as datas, regras e burocracias relacionadas com as mesmas, e com o aproximar da data começa o rebuliço: na maior parte das escolas, os docentes esforçam-se para que os alunos estejam preparados para as realizar; a matéria em atraso é posta em dia à pressão; os trabalhos de casa avolumam-se e este ano, pelo facto de as provas serem feitas em computador, muitos alunos estão a ser pressionados a aprender a manusear um. É que embora muitas crianças convivam diariamente com tablets, telemóveis e consolas, escrever num computador não é exatamente a mesma coisa. É verdade que a maioria das respostas são de escolha múltipla – o que também deixa muito a desejar da avaliação – mas algumas requerem respostas de desenvolvimento.
Com tantas coisas interessantes e divertidas para descobrir, explorar e aprender com sete anos, escrever no computador não devia ser uma prioridade. E exercer pressão e ansiedade nos alunos para realizarem as provas, muito menos.
Ora, se estas provas têm como objetivo avaliar o ensino, deviam ser o mais espontâneas possível para os resultados serem fiéis ao que cada aluno sabe. Se professores, alunos, e até alguns encarregados de educação, têm como preocupação tirar a nota máxima, o resultado vai estar viciado. Como provar que o programa é denso e extenso se todos parecerem bem preparados? Como justificar que não faz sentido introduzir formatos digitais no 1.º ciclo se as crianças se mostram aptas? Podemos então perguntar: por que ouvimos tantas vezes pais e professores queixarem-se que os programas escolares são demasiado extensos, impossíveis de implementar, confusos e demasiado abstratos e quando temos oportunidade de o provar através de resultados objetivos, os tentamos alterar e embelezar, tapar o sol com a peneira? Provavelmente porque ninguém quer que as crianças perante aquela prova tão solene – que alguns saberão que representa a sua escola e os seus professores –, se deparem com conteúdos desconhecidos. Porque todos querem evitar que estas crianças, muitas delas já fragilizadas por inúmeras razões, se sintam ainda mais ansiosas, incapazes ou frustradas. E porque alguns docentes também não querem passar por incompetentes. Enquanto as provas de aferição forem entendidas como uma forma de avaliação do aluno, do professor e da escola, não as podemos usar como arma ou ferramenta que possa lutar ao nosso lado por um programa mais adequado aos alunos.
S e enquanto instrumento de avaliação para pais, professores e mesmo alunos, sabemos que as provas não são úteis, porque aquele momento demasiado formal e gerador de ansiedade, com professores que não são os habituais – de cronómetro na mão –, em que os alunos carregam em cruzes, não nos oferece absolutamente mais nada do que já sabemos; se também não serve para melhorar o ensino (acho que nunca foram feitas mudanças com base nestas provas); se só servem para causar ansiedade nos alunos, roubar tempo de aulas e dar mais trabalho aos professores… Então qual é afinal a utilidade das provas de aferição?
Psicóloga na ClinicaLab Rita de Botton
filipachasqueira@gmail.com