A seca e o desafio da água subjacente interpelam-nos a um maior racionalismo e à procura de novos equilíbrios. É preciso um novo compromisso que esteja sintonizado com as expressões, os ritmos e as intensidades da natureza. Quem nasceu, cresceu e vive em compromisso com o Mundo Rural e com o meio ambiente que é pressuposto de todas as suas vivências, sabe que existem ritmos, que durante anos a fio foram respeitados, com os seus ciclos de cultura, de colheita e de pousio ou recuperação. A natureza tinha os seus tempos e os seus ritmos, respeitados e integrados nas atividades humanas como relógios suíços da valorização do potencial produtivo. Havia os cereais, a fruta e os legumes da época. Como havia um tempo próprio para muitas das criações agropecuárias do Mundo Rural, muitas das vezes associadas às festividades e vivências das famílias e das comunidades.
Durante anos, tocados pelo consumismo e pelo crescimento económico, com o apoio da ciência e do desenvolvimento do conhecimento, julgámos ser possível subverter os ritmos da natureza, ajustando aos ritmos, caprichos e necessidades dos seres humanos. Esse impulso de consumo e de globalização permitiu quebrar os compartimentos temporais dos ritmos da natureza e da produção alimentar e agropecuária, concorrendo em parte para a geração de fenómenos globais que colocam em risco o mundo como o conhecemos, por via da expressão das alterações climáticas, com impactos devastadores.
Alterámos os ritmos naturais do meio ambiente, agora esses tempos tradicionais, plasmados em tantos provérbios e ditos populares, forjados na sabedoria acumulada de anos de interação com os elementos e a natureza, já estão desfasados da realidade. A fiabilidade e previsibilidade desses tempos está moldada por novos fenómenos e expressões naturais que quisemos eliminar, depois mitigar, mas o melhor será mesmo trabalhar para encontrar um ponto de equilíbrio, com ajustes.
Sem perder a ambição de queremos continuar a incorporar investigação e conhecimento científico na procura de novas soluções de sustentabilidade e de produtividade, precisamos de nos ajustar aos ritmos e aos tempos da natureza com que interagimos para produzir e criar alimentos.
Entrar em choque com a realidade natural ou ignorar as suas expressões alteradas não é solução viável para quem continua a ter potencial produtivo e tem de criar sustentabilidade, nas atividades e nos ecossistemas.
É tempo de tomar todas as iniciativas que permitam uma melhor gestão da água, da sua retenção, distribuição e utilização eficiente.
É tempo de o fazer com a urgência que o tema merece pela relevância que tem para os seres vivos, os humanos e os outros.
É preciso ponderar tudo, ajustar e concretizar, para que consigamos acompanhar a mudança dos ritmos, sem colocar em causa o essencial dos tempos da natureza, das atividades humanas, da relevância ambiental dos territórios rurais habitados para a biodiversidade, da produção agroalimentar e das marcas de identidade das comunidades.
O novo ponto de equilíbrio é de ajuste, de acerto dos ritmos com os novos tempos da natureza. Esse caminho essencial não significa que não se continuem a procurar e a concretizar novas abordagens para a sustentabilidade da capacidade produtiva do Mundo Rural no quadro das alterações climáticas e da seca que fustiga já boa parte do nosso território ou que não se valorize ainda mais a importância estratégica social, económica e ambiental de quem vive, estuda e trabalha nessas paragens.
É tempo de ajustar os ritmos, os tempos e os termos das interações, por hoje e para amanhã.