por João Sena
Ni Amorim começou a correr aos 18 anos e foi dos melhores pilotos portugueses. Sagrou-se campeão nacional de velocidade quatro vezes antes de enveredar por uma carreira internacional como piloto oficial da Mercedes AMG, Ford, Chrysler e Opel. Terminada a carreira de piloto, seguiu outro caminho, mas sempre ligado aos automóveis. Em 2017, foi eleito presidente da Federação Portuguesa de Automobilismo e Karting (FPAK), e foi nessa condição que falou ao Nascer do SOL sobre o momento atual do desporto automóvel, que, a seguir ao futebol, foi a primeira modalidade a regressar à atividade durante a pandemia. «Apesar das dificuldades por que passámos, o panorama atual é animador. Nos últimos seis anos duplicou o número licenciados e de praticantes e aumentou o número de campeonatos federadas», referiu Ni Amorim. Atualmente, há mais de 12 mil licenciados e cerca de oito mil praticantes, e no ano passado a FPAK realizou quase 300 provas, entre as quais algumas pouco conhecidas, como trial, trial urbano e provas de arranque tipo dragster. «São números muito significativos para a realidade nacional», sublinhou o responsável da federação, que salientou: «Temos um conjunto de provas internacionais notável para a dimensão do país, e acredito que vamos continuar na mesma linha de crescimento». E não esqueceu a Fórmula 1: «Estávamos muito bem posicionados para ter o Grande Prémio de Portugal em abril, em substituição da China, mas foram as equipas que não quiseram ter 24 corridas, como estava inicialmente no calendário».
Apesar da pandemia e da instabilidade económica, houve fatores que contribuíram para esse crescimento: «A federação e os promotores têm feito um bom trabalho e os pilotos têm contribuído imenso para a divulgação do automobilismo através das redes sociais, coisa que não acontecia há 10 anos. Depois, o desporto automóvel continua a ter grande visibilidade a nível mundial». E deu um exemplo: «As apostas online da Fórmula 1 aumentaram cinco vezes e são os mais jovens que apostam».
Apoio aos jovens
Devido a dificuldades financeiras, houve um período em que a federação se limitou a fazer gestão corrente. A situação atual é bem diferente e, em 2022, a FPAK gastou meio milhão de euros no apoio aos associados. «Chegou o momento de devolver alguma coisa aos praticantes, foram eles que contribuíram para viabilizar a federação», afirmou Ni Amorim, explicando: «Lançámos um ambicioso programa de apoio a jovens talentos, fui piloto durante muito anos e nunca houve nada disto». O vencedor do FPAK Júnior Team de 2022 vai disputar cinco provas do campeonato nacional de ralis com um Renault Clio da categoria R5. «As inscrições nas provas, carro e os pneus são por conta da federação. Pretendemos levar o vencedor do Júnior Team o mais longe possível, e o mais longe é colocá-lo no Rallye 2, que é a principal categoria dos ralis em Portugal», afirmou Ni Amorim. O programa da FPAK vai ser replicado este ano no Campeonato de Portugal de Velocidade. Seis jovens (dois por carro) vão disputar três corridas com os Ginetta G40 GT5. A FPAK suportará os custos de participação dos três carros ficando o custo dos pneus e o seguro a cargo dos pilotos. «Foi uma corrida contra o tempo, mas que acreditamos vai valer a pena cada segundo gasto. Tendo em conta o fomento do desporto automóvel junto das camadas jovens, todos os investimentos são mais valias. Estamos certos de que será uma experiência e aprendizagem incríveis para todos. Deixam de competir em termos individuais para trabalhar em equipa, e a maioria sai dos circuitos de karting para se aventurar nos circuitos de automóveis», salientou o presidente da FPAK, que deixou um desejo: «Esperamos que fiquem aptos a dar continuidade à sua carreira».
Na atualidade, há poucos jovens e dar o salto para os campeonatos internacionais, seguindo o exemplo de Pedro Lamy e António Félix da Costa, entre outros. Ni Amorim deu-nos a sua opinião: «Existe qualidade e temos pilotos muito bons, mas a componente financeira é o grande obstáculo. Para participar na Fórmula 4 espanhola, que é o patamar a seguir ao karting, é necessário um budget de 300 mil euros e, em Portugal, é muito difícil obter esses apoios». O presidente da FPAK adiantou que «fazer o campeonato de velocidade em Portugal pode ser uma boa opção»: «Não é o caminho para a Fórmula 1, mas é forma de evoluir nos carros de turismo».
Ainda na velocidade, a falta do circuito de Braga «é uma lacuna que existe a norte, até porque a maioria dos praticantes estão do Mondego para cima». Segundo Ni Amorim, «a federação está a tentar sensibilizar um conjunto de empresários para construir um circuito no norte do país». O dirigente federativo deixou uma palavra para o Autódromo do Estoril: «Foi feito um grande investimento para renovar a pista, espero que continue nas mãos de quem pretende manter o circuito em atividade e que não vá parar às mãos de quem quer o autódromo só para ficar com os terrenos envolventes».
O campeonato de ralis está perfeitamente consolidado, mas a velocidade tem demorado a arrancar. «Não é fácil fazer bons campeonatos de velocidade», começou por dizer o presidente da federação, que adiantou que «a forma encontrada de juntar duas categorias no campeonato de velocidade é a correta para nivelar os andamentos e para que haja corridas mais disputadas, até porque o parque automóvel é extraordinário com marcas como McLaren, Aston Martin, Porsche, Mercedes e BMW». «Estou convencido de que o campeonato deste ano vai ser competitivo e vamos ter um número de pilotos interessante. Além disso, todas as provas vão cobertura televisiva», afirmou. O presidente da FPAK falou ainda do todo-o-terreno para sublinhar que «o seu crescimento tem sido uma surpresa»: «Temos o melhor parque automóvel da Europa, o que é impressionante para um país como o nosso. O karting atravessa uma fase muito boa, como novas competições e muitos praticantes».
Corridas no feminino
A FPAK tem dado especial atenção ao desporto automóvel no feminino. Há três anos que o número de mulheres tem vindo a aumentar, no ano passado foram passadas 824 licenças desportivas, o que representa um aumento de 216% e «tem havido uma grande adesão de praticantes e de oficiais de prova do sexo feminino». «Tentamos arranjar incentivos para atrair as mulheres para o automobilismo e fazemos regularmente formação com gente jovem», explicou.
A federação está igualmente atenta à sustentabilidade e tem trabalhado no sentido de atenuar o impacto das corridas. «Existe um programa que obriga os organizadores a tomar um conjunto de medidas para minimizar os impactos negativos no ambiente. Além disso, a maioria dos pilotos utiliza gasolina sintética, que polui menos do que a gasolina normal, e a partir de 2024 todos os carros terão de usar gasolina sintética, antecipamo-nos um ano à norma da FIA. Temos também um protocolo para plantar árvores na zona centro do país, bastante afetada pelos incêndios», disse Ni Amorim. A relação da FPAK com a Federação Internacional do Automóvel (FIA) «sempre foi muito boa e interessante». «No tempo do anterior presidente, Jean Todt, trabalhámos em conjunto para trazer a Fórmula 1 para Portugal. Em poucos meses conseguimos o que não era possível há 30 anos. Isso colocou Portugal no radar internacional do desporto automóvel», disse. Com o atual presidente, Mohammed Bin Sulayem, as relações continuam a ser boas: «Elaborei uma agenda muito cuidada com temas de interesse para Portugal e onde a FIA nos pode ajudar. Há pouco tempo lançamos a candidatura da jurista Matilde Costa Dias para uma das principais comissões da FIA e ela foi eleita». E há outros portugueses em destaque no desporto automóvel mundial: Eduardo Freitas é o diretor de corrida no Mundial de Endurance, Rui Marques é responsável pela Fórmula 2 e Pedro Almeida integra a comissão de todo-o-terreno. Portugal está presente em 13 comissões da FIA. «É importante estar presente nas áreas onde temos interesses», concluiu.