por João Cerqueira
«A TAP é uma companhia de interesse estratégico para o desenvolvimento económico do país e para a afirmação da língua e da cultura portuguesa. A TAP é o rosto de Portugal nos céus. Se Nossa Senhora voltar a Fátima, certamente requisitará um avião da TAP (numa altura em que não haja greve) capaz de aterrar numa azinheira. Como tal, a privatização da TAP pelo Governo neoliberal de Pedro Passos Coelho foi um crime económico e uma traição à pátria semelhante à de Miguel de Vasconcelos. Roma não pagava a traidores, mas nós tivemos de pagar a traição. Com enorme esforço financeiro, a reversão da privatização da TAP feita pelo Governo socialista foi, pois, um ato de salvação nacional. Nunca serão demais os louvores a tão corajosa decisão. Por isso, que fique bem claro o seguinte: a privatização foi má, a reversão da medida foi boa.
Nota da relatora – santificar a TAP é uma boa ideia, culpar o Passos resulta sempre, o povinho vai acreditar.
Dito isto, não podemos negar que os 3,2 biliões de euros enterrados na TAP pelo Governo, e que esta não irá devolver, é muito dinheiro. Muito dinheiro dos contribuintes portugueses com o qual se poderiam resolver imensos problemas da Saúde à Educação. Sim, é verdade. Porém, apesar do já referido ato de salvação nacional, é preciso ter em conta que se estes biliões não fossem enterrados na TAP poderiam ser desperdiçados noutra coisa qualquer sem pés nem cabeça, como construir campos de futebol onde não há jogos, aeroportos onde não aterram aviões, ou mais uma autoestrada sem trânsito. Ou, poderiam ser roubados (por membros de um governo de Direita, obviamente). Como o passado nos ensina, os governos de Direita quando chegam ao poder desbaratam o dinheiro dos contribuintes à toa em obras desnecessárias, projetos que nunca são concluídos e estudos inúteis, além de que muitos dos seus secretários de Estado e ministros se aproveitam dos cargos para se apropriarem do dinheiro público.
Nota da relatora – o começo é arriscado, mas depois há argumentos sólidos, o povinho deverá acreditar.
E é assim que podemos explicar uma nova privatização que contradiz tudo o que o Governo socialista defendeu anteriormente e que até parece contradizer este mesmo relatório. Então gasta-se os 3,2 biliões de euros com o argumento de que a TAP era indispensável para o país e depois, sem mais nem menos, muda-se de opinião sem reaver o dinheiro? Há algo mais disparatado e irresponsável na História de Portugal? Não, não haveria se não existisse a Direita portuguesa. Como já foi referido atrás, é preciso que seja um governo socialista a privatizar outra vez a TAP para evitar que o processo vá parar às mãos de um governo social-democrata. Além da incompetência habitual, os secretários de Estado e ministros sociais-democratas iriam decerto aproveitar-se da situação para, mediante esquemas sofisticados de corrupção, enriquecerem. Concluindo, a nacionalização da TAP foi boa para salvar Portugal das políticas de Direita e a nova privatização vai ser boa pelo mesmo motivo.
Nota da relatora – esta parte é ainda mais arriscada, mas, se acreditarem nesta treta, acreditam em tudo.
Como tal, a atuação dos ministros João Galamba, Fernando Medina e Pedro Nuno Santos foi irrepreensível e merece louvor.
Nota da relatora – é melhor cortar esta parte.
Estando cabalmente explicada a embrulhada da TAP e identificados os seus culpados, é importante referir o lastimável comportamento dos deputados da oposição durante a Comissão de Inquérito. Se havia alguma dúvida de que a Direita portuguesa, assim como a Esquerda quando não se alia ao PS, constituem forças políticas irresponsáveis que atuam de má-fé, esta Comissão dissipou-as. Desde o primeiro ao último segundo, os deputados da oposição mais não fizeram do que tentar deturpar os factos, mentir sem pudor, refugiar-se nos lapsos de memória e outros truques comuns entre os pantomineiros para tentar fabricar um relatório inverosímil e tendencioso que branqueasse as suas responsabilidades. Mesmo assim, falharam.
Nota da relatora – nesta parte vão acreditar porque dizer mal dos políticos resulta sempre.
Conclusão: o Governo socialista teve uma atuação irrepreensível na defesa dos interesses do país e do dinheiro dos contribuintes, o primeiro-ministro pode continuar a confiar nos membros do Governo envolvidos nas trapalhadas da TAP, e os portugueses, esses, podem dormir tranquilos».
Nota da relatora – chegado aqui, o povinho deve estar tão baralhado que já nem quer ouvir falar mais da TAP. A página foi virada com sucesso.