Por Pedro do Carmo, Deputado do PS
A vertigem da alegada modernidade e o ritmo vertiginoso do consumo nas sociedades atuais determinaram a incessante procura do novo como reflexo do desenvolvimento e da qualidade de vida, com relevantes impactos negativos nas tradições, nas interações humanas com a natureza e em tantas dinâmicas que existiram até ser fustigadas pelos novos tempos.
Essa procura do novo por contraponto com o antigo, também aditivado pela procura de novas oportunidades individuais e comunitárias, conduziu a boa parte dos desequilíbrios territoriais que se registam no país, com um litoral sobrepovoado e um interior com pouca gente. O aparente marcar passo e definhamento do Interior rural ao longo dos anos, apesar da resiliência das autarquias, das comunidades e dos cidadãos desses territórios, conduziu ao abandono de boa parte das terras e à emergência de riscos e problemas estruturais que não podem ser revertidos apenas com boas vontades e investimentos não sustentados no tempo, num país com recursos financeiros finitos.
Há uma nova consciência e iniciativas que contrariam o fatalismo do abandono, da despovoação e do esvaziar da alma dos nossos territórios rurais.
É claro que há novas abordagens na organização do trabalho, com o teletrabalho e os nómadas digitais, que sublinharam e sublinham ser possível viver fora do litoral urbano, mas que gere os territórios, trabalho o potencial produtivo e luta contra as tendências negativas no interior rural já provou ser possível recuperar o melhor do passado sem perder o sentido de futuro.
Veja-se o que acontecia com a fileira do porco alentejano, há pouco menos de duas décadas na rota da extinção do radar da produção rural e agora resgatado em Ourique, como pilar de desenvolvimento local. Sim, é possível mobilizar vontades e recursos para recuperar o melhor das nossas tradições rurais, incorporando conhecimento e valor. É claro que, também neste impulso se enfrentam obstáculos e há sempre quem queira que corra mal, mas a determinação fez com que a fileira do porco alentejano fosse resgatada, e se concretizasse um projeto de transformação em Garvão. O mesmo sentido de resgate e de afirmação do melhor do passado está a ser concretizado na valorização da vaca da raça garvonesa, mas poderíamos falar da recuperação de cereais ancestrais para a produção de pães de fermentação lenta, de massas associadas aos territórios ou da recuperação de outros produtos de excelência da nossa ruralidade.
E mesmo na dimensão florestal, está comprovada a maior resiliência ao fogo de espécies autóctones que no passado dominavam boa parte da paisagem do território nacional e não deixam crescer grande vegetação sob as suas copas, como acontece com os sobreiros, castanheiros, bétulas, cerejeiras e carvalhos.
O valor acrescentado destes resgates do passado, reforça a nossa identidade e tem de ser incentivado como impulso que compensa pelo retorno que confere a quem o desenvolve e pelo contributo que dá para a sustentabilidade, a biodiversidade e o desenvolvimento local. Tem de valer a pena aproveitar esse muito futuro que há no melhor do nosso passado rural.
Uma comunidade que considera o passado estará sempre em melhores condições de enfrentar o futuro, mesmo quando nos confrontamos com fenómenos extremos resultantes das alterações climáticas ou enfrentamos novos desafios com ecossistemas fundamentais para a produção, como acontece com o montado.
É bom que seja o Mundo Rural a impulsionar os resgates do melhor do nosso passado rural. É sinal de sabedoria e sentido de futuro.