PORT-OF-SPAIN – Aqui mesmo, nas ilhas de Trindade e Tobago, que distam cerca de três horas de ferry uma da outra, a festa foi de arromba quando a seleção do país se qualificou para a fase final do Campeonato do Mundo de 2006, na Alemanha. Havia razões superlativas para que os tobaguenhos festejassem como festejaram. Afinal eram apenas a terceira equipa das ilhas do Caribe a cometer tal proeza, depois de cuba em 1938 e da Jamaica em 1998. Ainda não podiam adivinhá-lo, mas foram também a última a consegui-lo. Comandados pelo holandês Leo Beenhakker, os moços de Trindade e Tobago, com Russel Latapy e Dwight Yorke à cabeça, fizeram o que puderam e mais não se podia exigir-se-lhes: 0-0 contra a Suécia, 0-2 frente a Inglaterra e Paraguai. Regressaram como heróis da pátria, cada membro da equipa recebeu um prémio de um milhão de Trindade dólares (cerca de meio dólar americano) e espetaram-lhes nos respetivos peitos a medalha de ouro de Chaconia uma das mais altas condecorações do país. Depois foi o bom e o bonito quando treze jogadores da seleção se queixaram de não terem recebido a totalidade do prémio e se recusaram a participar num jogo particular face à Nicarágua. O assunto acabou em tribunal que deu razão aos selecionados. E, assim sendo, o governo de Port-of-Spain teve de meter a mão ao bolso.
Primeira equipa da zona a chegar a um Mundial, em 1938, Cuba começou por fazer um certo alarido eliminando a Roménia na primeira ronda (a prova disputava-se em eliminatórias diretas) com um empate a três golos e 2-1 no jogo de repetição. Em seguida levaram uma coça das antigas da Suécia (0-8) e deram-se por satisfeitos. Em 1998, em França, a Jamaica conseguiu uma vitória no último jogo, frente ao Japão, mas as duas derrotas anteriores (1-3 com a Croácia e 0-5 com a Argentina) não deu hipóteses para alimentar sonhos. Mas a verdadeira sensação do Caribe em Campeonatos do Mundo teve lugar há quase 50 anos, em 1974, e chamou-se Haiti.
Duas equipas fascinantes
A imprensa agarrou-se ao exotismo de duas das seleções qualificadas para esse Mundial: Haiti e Zaire. Pela primeira vez havia duas equipas de negros na competição. E isso alimentou a curiosidade de toda a gente. O Haiti tinha, à época, a sua melhor equipa de todos os tempos, na qual se destacavam o guarda-redes Henri Francillon, os médios Philippe Vorbe e Guy Renold Jean François, e o avançado Guy Saint-Vil.
A sorte não quis nada com os haitianos no momento do sorteio. Enfiou-os num grupo com Itália, Argentina e Polónia. Bela estucha! Mas, vendo bem, tudo o que fosse não sair da Alemanha Ocidental com três cabazadas era lucro. Por isso, quando chegaram ao intervalo do jogo de estreia, no Estádio Olímpico de Munique, contra a Itália, com 0-0 no marcador, uma ventania morna de esperança varreu os adeptos que, nas bancadas, entraram na farra. Depois, a ventania deixou de ser esperançosa para ganhar estatuto de enlouquecida: logo no primeiro minuto da segunda parte um rapaz de 23 anos chamado Emmanuel Sanon, que morreu com apenas 56 anos vítima de cancro no pâncreas, marcou um golo ao guarda-redes Dino Zoff e entrou pelos portões escancarados do futebol caribenho. A proeza valeu-lhe um contrato na Europa: do Don Bosco Football Club de Pétion-Ville, num subúrbio de Port-au-Prince, passou para o Bershoot, da Bélgica. O sonho desmoronou-se com a reviravolta assinada por Rivera, Benetti e Anastasi. No final do encontro, Sanon e o seu colega Jean-Joseph foram chamados ao controlo anti-doping e Jean-Joseph deu positivo. Bem pôde defender-se afirmando que andava a ser medicado por causa da asma. Foi expulso do torneio e regressou a casa no meio de uma polémica bruta. O caso fez abalar a estrutura da seleção e, no dia 19 de Junho, outra vez em Munique, o Haiti foi esmagado pelos polacos – 0-7! Depois, um laivo derradeiro de orgulho envolveu a equipa que se bateu com dignidade frente à Argentina, perdendo por 1-3 e com Sanon a marcar novamente. O resultado permitiu-lhes regressar a casa de cara lavada. Trinta e seis anos após a aventura cubana, o Haiti levou o futebol das Antilhas de novo a um Mundial provocando o interesse e a curiosidade de quem pensava que dali só saíam coqueiros e praias de mar azul-cloro. Desde 2006 e da presença de Trindade e Tobago que continuamos à espera da qualificação de uma seleção do Caribe. Veremos por quanto tempo…