Por Francisco Gonçalves
A eleição de Luís Inácio Lula da Silva como Presidente do Brasil veio novamente posicionar o gigante da América do Sul como ator de referência no sistema internacional.
Independentemente da opinião que cada um tenha sobre o Presidente brasileiro, há algo que não podemos ignorar: Lula é um gigante político. Se, no primeiro e segundo mandatos, quis afirmar o Brasil internacionalmente, neste mandato o objetivo não pode ser outro.
Lula faz parte do arco de líderes internacionais que pretendem rever a dita ‘pax americana’. Este revisionismo sistémico incide sobretudo na área económica, com vista a diminuir a posição das instituições de Breton Woods (FMI e Banco Mundial), na gestão de crises, no financiamento do desenvolvimento e, sobretudo, retirar o fator ideológico do ‘consenso de Washington’. Paralelamente, pretende-se reduzir o peso do dólar como moeda do comércio internacional e como reserva de valor.
Este objetivo brasileiro necessita de ter salvaguardados apoios determinantes para a sua ação externa, ambas profundamente desprezadas por Bolsonaro durante o seu consulado: a regional, materializando-se no Mercosul, e a histórica, relacionada com os países de expressão portuguesa.
Na dimensão regional, o caminho está já a ser feito, ainda que com alguns revezes, provocados pela excessiva proximidade ideológica a certos regimes, uma fragilidade da sua afirmação na liderança regional.
No que respeita aos países de língua portuguesa, o tempo perdido está a ser recuperado: o Presidente brasileiro já realizou a tradicional visita a Portugal e irá a Luanda nas próximas semanas. Porém, para além das visitas, convém que as ‘antenas’ passem a funcionar com outra atividade.
Nunca consegui compreender por que razão os embaixadores brasileiros em Lisboa são tantas vezes estranhos na sociedade portuguesa. Não poucas vezes é um desconhecido, permanecendo fora da sociedade portuguesa e distante da sua própria comunidade.
Sabendo-se que está para breve a nomeação de um novo embaixador do Brasil em Portugal, convém que não seja um estranho, que ninguém conhece e que pouco aparece. Um chefe de missão brasileiro em Portugal deve ser uma figura maior, reconhecida e respeitada, capaz de defender os interesses do seu país e, em paralelo, aproximá-lo de Portugal.
As visitas de Estado são momentos importantes, mas a visibilidade não pode desaparecer quando o Presidente regressa a Brasília, antes deve ser continuada por quem tenha condições para prosseguir o trabalho das visitas.
Há, também, uma aproximação à comunidade brasileira (a maior comunidade estrangeira em Portugal) que exige disponibilidade e conhecimento específico da realidade portuguesa.
A liderança brasileira saberá melhor que nós o que pretende da relação com Portugal. Porém, não vê de tão perto a recorrente ausência dos seus representantes na comunidade que os recebe.
Ainda que seja o Brasil quem mais perde com a não maximização dos seus interesses, também Portugal perde. O peso do país no sistema, particularmente na Europa, decorre do peso fora da Europa.
Se o Brasil quer ser um ator central do sistema internacional do século XXI, convém que comece por estar próximo dos seus, sob pena de continuar a ser apenas país de futuro.