Um bebé nasce à procura da mãe, do seu conforto e alimento, da relação. Esta irá desenvolver-se através da troca de amor entre ambos e da forma como as necessidades do bebé são atendidas. Uma mãe atenta e recetiva, que entende o seu bebé e lhe consegue dar uma resposta eficaz e carinhosa através do seu alimento, colo ou conforto, promove uma vinculação emocional forte e segura. O tipo de ligação desenvolvida com o primeiro e principal cuidador será o modelo relacional que será interiorizado e que, no futuro, irá influenciar a forma de relação consigo e com os outros.
O vínculo entre pais e filhos é como um fio que só é visível através do modo como se relacionam. Há fios de vários tipos e qualidades – consoante a ligação que se cria – e estes vão sofrendo modificações ao longo do tempo.
Nos primeiros meses de vida, a relação entre o bebé e a mãe é simbiótica. Nesse momento, ainda que curto, o fio é extremamente forte. Mãe e filho dependem um do outro e a proximidade é enorme. Ao longo do crescimento o fio vai aumentando, a criança começará a fazer as suas descobertas e os pais incentivam-na a aventurar-se cada vez mais. Passado pouco tempo volta, para renovar a coragem e receber segurança para arriscar mais, para fazer crescer o fio mais um pouco. À medida que amadurece e se torna mais audaz, curiosa e destemida – consoante a confiança que recebe – o fio vai crescendo e o tempo longe dos pais é cada vez maior. Mas nem sempre o fio cresce com facilidade, seja porque a criança não o estica, seja porque os pais não o desenrolam, ou ambos. Há filhos adultos com fios tão curtos que não são capazes de se atrever a sair de casa dos pais.
Há fios de melhor qualidade do que outros. Uns extremamente grossos, flexíveis e moldáveis, que permitem crescer e voar para longe, voltando porque se quer e não porque se precisa, e outros que não resistem à distância e acabam por se quebrar irreversivelmente por algum desentendimento ou, devido à fraca qualidade, vão esgarçando com o tempo, acabando por romper.
Há também o fio tipo elástico, que estica, estica, estica, mas quando chega a um certo ponto vem disparado para trás. É o de adultos ilusoriamente independentes que, embora cresçam, saiam de casa e constituam família, continuam a reger-se pelas regras e vontade dos pais. São por exemplo as famílias que têm todos os filhos, genros, noras e netos à quarta-feira em casa para jantar, ao sábado para almoçar e ao domingo para ir à missa. Os filhos não voltam porque querem verdadeiramente, mas porque o elástico os obriga a isso.
Por fim, há ainda os fios ilusórios, que pertencem àqueles que cumprem o seu dever de estar com a família quando o rei (os pais ou o menino Jesus) faz anos e sentem que cumpriram a sua obrigação, mas no fundo a relação há muito que não é alimentada e já é quase inexistente.
Quanto mais saudável for o vínculo com a família primária, quanto mais consolidado e interiorizado, melhor a qualidade do fio. Os filhos emancipam-se, trabalham e constituem família, mas voltam sempre a casa dos pais, porque têm prazer nisso e não porque dependem deles. A família que constituem é acolhida e desfrutam todos do prazer de estar juntos, de contarem uns com os outros, de partilharem a vida e de continuarem a viver bons (ou menos bons) momentos juntos. Será também esta a relação que vão desenvolver na sua nova casa e a maior herança que lhes podemos deixar, que contribuirá para que se tornem adultos emocionalmente equilibrados, autónomos e seguros. Que se relacionarão melhor consigo e com o meio. Mantendo fios eternos invisíveis.
Psicóloga na ClinicaLab Rita de Botton