Por vezes, quando se planeia ter um filho, colocam-se tantos objetivos, fazem-se tantos planos e impõem-se tantas metas – algumas delas inalcançáveis – que em alguns casos o bebé imaginário não consegue dar lugar ao bebé real. Quantas pessoas conhecemos que ficam à espera do momento perfeito, da idade ideal, de um excelente ordenado, da altura mais favorável da relação e no meio de tanta exigência o tempo vai passando e o projeto de ter um filho fica guardado para sempre na gaveta da vida?
Um filho não precisa de um percurso brilhante já delineado e do enxoval de uma vida preparado para quando nascer. Precisa sobretudo de ser desejado e amado.
Muitos pais ao terem um filho ambicionam que este venha a estar entre os melhores da escola, no pódio do desporto, que tire um bom curso, que venha a ocupar um cargo de topo e fazem uma lista mental com tudo o que não lhe poderá faltar, ao que vão acrescentando itens à medida que vai crescendo: um bom quarto, o computador mais recente do mercado, o telemóvel de última geração, uma mota, um carro. Há até quem tenha só um filho para que o irmão não lhe roube as condições ideais, não se apercebendo que poderão estar a privá-lo de um companheiro e amigo para vida.
No meio de tantos projetos e teorias, muitas vezes esquecem-se do mais importante: o tempo e disponibilidade para estar com o filho, para o ver crescer, para o acompanhar.
O chamado ‘tempo de qualidade’, embora esteja em voga, na nossa sociedade acelerada, parece mais raro e difícil de encontrar do que o ouro. Porque o tempo de qualidade não é levar o filho ao parque uma vez por semana, comprar-lhe um gelado e ficar com o sentimento de dever cumprido. Tempo de qualidade é um compromisso diário e contínuo de troca, de empatia, de estar realmente com o outro, de se envolver. Não é só tempo físico, é também tempo psicológico. É estar disponível para construir uma relação de qualidade, que se tornará inscrita no outro, e também tempo de vivências e de experiências várias que ficarão guardadas para sempre na sua memória afetiva. É esta disponibilidade de tempo físico e psicológico que pautará um crescimento mental saudável e contribuirá para a formação de um adulto completo e feliz.
Não é a melhor escola, a melhor atividade, as melhores roupas, a melhor consola ou o melhor quarto. Embora haja escolas que aparentemente pensaram em tudo para o bem-estar das crianças, com todo o tipo de recursos e mais algum e também com preços tão elevados que dão a ilusão de garantir um futuro perfeito aos seus alunos, é em casa e sobretudo nos primeiros anos que se dita o equilíbrio emocional e o bem-estar dos filhos. É aí que tudo começa e tudo se forma. As maiores falhas poderão deixar cicatrizes emocionais e mesmo as melhores escolas já não terão capacidade para as reverter, embora possam ajudar no seu processo de cicatrização.
Quando se pensa em ter um bebé, o mais importante não é a escola, as atividades ou os bens materiais. Não é se será o mais esperto, o mais estudioso ou o mais hábil. O que fará realmente diferença será a disponibilidade efetiva que temos para ele, para o ouvir, para o observar, para o sentir e perceber. Para o amar e oferecer genuinamente – através de uma relação de qualidade certa, contínua e estável – aquilo de que mais precisa: pais efetivamente presentes e envolvidos – física e emocionalmente – e não de presentes reais, oferecidos por pais ausentes, que se matam a trabalhar para lhe proporcionar o que lhe faz menos falta.
Psicóloga na ClinicaLab Rita de Botton