Um som inconfundível, digo eu, que na verdade não percebo grande coisa de música senão ter o sossego e a paz para ouvi-la quando gosto. Gosto do que o João Gil, meu querido irmão, faz há anos e anos; gosto da voz fantástica de Nuno Guerreiro. Recordo os êxitos de os escutar, de tentar imitá-los numa guitarra de cordas de nylon que tem tantos anos como a Ala dos Namorados, acreditam vocês que estão a comemorar trinta anos de existência?! Que remédio se não acreditar porque o tempo não perdoa nem volta para trás. Confirma-se a velha teoria de que os dias podem passar devagar mas que os anos, esses, passam a correr. E assim, na próxima semana, na Culturgest, no auditório Emílio Rui Vilar, pelas 21h, que é a hora do anoitecer neste Verão que está a caminho do fim, dia 8 de Setembro, a Ala dos Namorados volta a atacar. «Que pode esperar o público deste concerto?», responde o Nuno Guerreiro repetindo a minha pergunta: «Um som renovado. Canções novas, muita coisa que pode surpreender mas, ao mesmo tempo, recua ao passado da música que fomos fazendo». Eles estão aí! ‘Brilhará’ é o título do novo álbum. «Diria que é algo de mais franco, com uma luz também ela nova, diferente», conta o Nuno. Além dele e do João, Rúben Alves no piano, Alexandre Frazão na bateria, Nelson Cascais no contrabaixo e Luís Cunha no trompete. Equipa de luxo. Que não se chama Ala dos Namorados por acaso. «Da primeira vez que nos juntámos», vai desfiando o João Gil, «tínhamos vários nomes para escolher mas acabámos de estar todos de acordo em relação a este. Tem história. Essa pergunta de querer saber quem inventou o nome é boa. Deixa-me cá pensar. Acho que foi o António Pinho, da Banda do Casaco, que o sugeriu. Ala dos Namorados é romântico. Liga a terra ao mar. Liga-nos à História de Portugal e a um movimento de revolta e de independência».
Lugar de Aljubarrota, junto à Batalha e ao mosteiro, ano de 1385, dia 14 de Agosto. Não, não se combateria à sombra como os 300 da Batalha das Termópilas. Combater-se-ia ao sol inclemente de uma terra que abria brechas de secura. Chefiado por D. Nuno Álvares Pereira, o exército defendia a independência de Portugal colocada em perigo por Castela. Estávamos em minoria, como sempre. Em soldados e em armas. Mas tínhamos a favor o génio militar da estratégia. A Técnica do Quadrado. Uma linha de soldados à frente para os castelhanos pensarem que estavam em vantagem e que não era preciso muito esforço e quando estavam mais fracos, com menos armas, foram rodeados de soldados portugueses. Um dos lados deste quadrado era formado pela Ala dos Namorados. Chamava-se assim porque era constituída por soldados mais jovens que combatiam por Portugal mas também pelas suas damas, por quem estavam enamorados. Era comandada por Mem Rodrigues de Vasconcelos e pelo seu irmão Rui Mendes, sendo identificada por uma grande bandeira verde; teria aproximadamente 400 besteiros, 200 lanças e 650 homens a pé… Como é linda a História deste país que teima em ser aquilo que o mar não quer, como dizia o poeta Ruy Belo, também ele tão injustamente esquecido.
Para continuar!
«Encontrámos no nome muito de heroico e também de trágico», continua o João Gil. «Fizemos disso um vínculo ao fado também. Experiência geodésica. Ligação entre Lisboa e o interior, entre as cidades do litoral, como Porto e Aveiro, ao país que fica para leste. Para a Beira Interior, de onde sou natural». Regressam ao anoitecer do próximo dia 8 de Setembro mas regressam para ficar. «Temos gente diferente da composição inicial da banda mas estamos de volta para continuar, não nos vamos reduzir a um álbum que comemora os nossos trinta anos de vida, vamos tocar em mais sítios, vamos continuar a gravar novas músicas, as pessoas vão ouvir, nestes dois concertos que estão marcados para Setembro, o segundo para dia 29, com uma grande componente solidária (será no Casino de Espinho e reverterá para a Luta Contra o Cancro), os clássicos que sabem de cor e que tiveram a contribuição do João Monge, do Manuel Paulo, do Mário Delgado, do Zé Nabo e do José Moz Carrapa, e várias canções deste disco ao qual resolvemos chamar Brilhará». Brilhará é um tempo de verbo no futuro. É então que, neste momento, o passado se encarrega de cruzar ideias com o porvir.
Novamente o Nuno Guerreiro: «Estou certo de que vai ser algo que vai mexer com as pessoas e, sobretudo, com todos aqueles que já gostavam da Ala dos Namorados. E estou certo disto por causa da frescura do novo som que vão encontrar. Tem muita autenticidade, é muito bonito. Há uma fidelidade muito grande ao nosso passado como banda mas, igualmente, um novo brilho, não se chama Brilhará por acaso. Os espectadores vão reconhecer, com inteligência, a velha sonoridade e a nova. E aquilo que temos de novo para lhes oferecer. Lá está: uma nova luz! Cheia de energia positiva! O disco está muito bonito e, neste momento, sentimos uma felicidade muito grande por podermos ir apresentá-lo a todos os que forem ver-nos à Culturgest e que decidirem comprar o Brilhará».
Eu não tenho muitas dúvidas sobre aquilo que me dizem e lá estarei, no meu posto, para o reencontro. Entretanto também já há novidades para Outubro, um concerto que irá ter lugar em Gondomar. Para que não restem confusões, ‘Brilhará’ é um disco feito na sua totalidade de originais. Os concertos é que obedecerão a uma linha melódica na qual as velhas canções se misturam com as novas. Trinta anos mais tarde, os rapazes que foram buscar inspiração aos jovens apaixonados de Aljubarrota alinham-se para os combates que aí vêm. À medida que o Verão vai chegando ao fim, a energia renova-se e não se deixa afogar pela melancolia tão própria de Setembro. Porque todos os fins vão desembocar em recomeços.