A China é atualmente o principal parceiro comercial de mais de 130 países em todo o mundo. Produz bens de consumo que são vendidos em todas as geografias e consome produtos de todo o mundo.
No top 10 das empresas globais que mais fazem negócios na China encontramos a Hon Hai (de Taiwan), a Volkswagen e a Bosch (da Alemanha), a General Motors e a Apple (dos EUA), a Toyota e a Honda (do Japão), a Charoen Pokphand (da Tailândia), o HSBC (do Reino Unido) e a Samsung (da Coreia do Sul).
No que respeita ao investimento chinês no estrangeiro, o ranking é encabeçado pelos EUA, seguido da Austrália, Reino Unido, Suíça, Canadá, Alemanha, Japão e Malásia.
Isto é, o mundo inteiro faz negócios com a China, certamente geradores de muito rendimento para si e para os seus. Não obstante, parece haver uma onda de desgosto com o investimento chinês em algumas geografias.
Portugal, que precisa de rapidamente captar mais e melhor investimento, só assim pode ultrapassar a estagnação das últimas décadas, é uma dessas geografias.
Quando, como consequência da crise do subprime, o país foi obrigado a vender pelo melhor preço alguns dos seus ativos principais, surgiu a oportunidade para as empresas chinesas entrarem no mercado português. Pequeno mercado, mas oportuno como porta para a União Europeia. O facto de os preços daqueles ativos terem sido de saldo não foi responsabilidade do comprador, mas de quem se colocou a jeito: Portugal, pela exposição à dívida, e União Europeia, pela cegueira ideológica que impediu de ver para lá da esquina da crise.
Os ‘aliados’ esqueceram-se que Portugal era aliado e uma potência em ascensão percebeu a oportunidade.
Há poucas semanas o Governo português recusou que a Huawei entrasse no 5G, em Portugal. De acordo com o que se sabe, por razões de segurança – receio da possível espionagem chinesa. Não sabemos se os chineses nos querem espiar, mas sabemos o que Edward Snowden revelou: a Agência Nacional de Segurança dos EUA escutou 35 líderes mundiais. Entre os líderes escutados, muitos de países próximos, como Emmanuel Macron, Mohammed VI e Angela Merkel.
Quando a crise dos mísseis de Cuba surgiu, consta que Kennedy terá telefonado a De Gaulle, dizendo o que estava em causa, propondo-se enviar provas. O então presidente francês terá dito ao seu congénere norte-americano que «se o senhor me diz que há mísseis, não preciso de ver provas, basta-me a sua palavra».
Esse mundo de alianças sólidas não é o atual. Ao contrário do que gostamos de pensar, Donald Trump não inaugurou a era do pós-verdade, apenas a assumiu. Também não trouxe a falta de confiança, só não tenta esconder.
Em grande medida, há já algum tempo deixámos os curtos anos de certezas da globalização democrática idealista do pós-guerra-fria, para um tempo de regresso do interesse nacional, com muita hipocrisia comunicacional à mistura. Podemos, por conforto, querer voltar àquele mundo, mas ele já não existe (se é que alguma vez existiu).
O líder chinês Deng Xiao Ping disse um dia que «não importa que o gato seja branco ou preto, o importante é que cace ratos». É deste pragmatismo que precisamos para caçar os ratos que continuam a roer as rolhas das nossas garrafas.