Avenidas Novas

Foram tantas as vezes que passei na Praça do Saldanha e acenei ao “Sr. do Adeus”. Parece tudo do tempo dos dinossauros. Santa nostalgia.

Querida avó,

A nossa Freguesia de Avenidas Novas está hoje de parabéns. A freguesia onde eu nasci e (com muita pena minha) nunca vivi. E onde tu resides desde sempre, ainda que mudando de ruas.

Verdade seja dita que esta freguesia só existe desde 2012, após o resultado da reforma administrativa que aconteceu em Lisboa. A freguesia de Avenidas Novas, agregou as freguesias de S. Sebastião da Pedreira, de onde sou natural (eu e todos os que nasceram na Maternidade Alfredo da Costa), Nossa Senhora de Fátima e parte da freguesia de Campolide.

Já me contaste inúmeras histórias antigas desta freguesia. Recordas-te de ver brincar as crianças que habitavam no antigo Palácio Sotto Mayor, do belíssimo Hotel Aviz (onde foste pedir um autógrafo à Maria Callas), que foi demolido em 1962, e onde hoje é o Hotel Sheraton Lisboa. Recordas, frequentemente, o Cine-Teatro Monumental que, como o Ruy de Carvalho diz tantas vezes: «A sua demolição foi um dos maiores atentados ao património e à cultura dos espetáculos em Lisboa». Onde também trabalhou Manuela Maria Simone de Oliveira, Laura Alves e tantos outros.

Eu, que sou mais novo, tenho outras memórias das Avenidas Novas. Sempre tive curiosidade pelas histórias dos “Meninos da Palhavã”, em criança fui muito feliz na Feira Popular (que existia na Av. da República), recordo-me da polémica em torno do Monumental, embora nunca tenha entrado no edifício, e do que se discutiu aquando da construção do El Corte Inglés. Recordo-me dos centros comerciais Imaviz e Apolo 70, muito famosos nas décadas de 1970/1980.

Foram tantas as vezes que passei na Praça do Saldanha e acenei ao “Sr. do Adeus”. Parece tudo do tempo dos dinossauros. Santa nostalgia.

Bom, deixa-me ir pois a minha vida não é só isto. Vou para a festa de aniversário da Freguesia de Avenidas Novas. Depois conto-te tudo. Fui.

Bjs

Querido neto,

T irando o tempo em que estou na Ericeira, vivo nas Avenidas Novas há quase 70 anos. Saltitando pela AV. Filipe Folque, Av. António Augusto de Aguiar e Av. Luís Bivar. No início da Av. António Augusto de Aguiar, lembro-me de haver um grande morro onde pastavam cabras e ovelhas. E, na passagem de ano, vínhamos todos, de todos os prédios, para as janelas que davam para as traseiras bater pratos e deitar coisas velhas para a rua. E nunca me lembro de alguém se queixar do barulho.

E era também a rua onde estavam, todos os dias, amoladores de tesouras e navalhas e cegos a cantar. As pessoas ouviam e deitavam moedas da janela para a rua.

Na época do Natal, a Av. Fontes Pereira de Melo era inundada por homens com varas de perus a caminharem pelo meio da rua. E não me lembro de buzinadelas ou de algum desastre. E lembro-me da inauguração do Teatro Monumental, com As Três Valsas, e do Cinema Monumental, com o O Facho e a Flecha.

Onde são hoje os jardins da Gulbenkian era o Parque de Santa Gertrudes, onde foi a Feira Popular.

Na Av. Luís Bivar – onde até há pouco tempo esteve o Instituto Francês – era uma lindíssima moradia. Todos tivemos imensa pena quando foi deitada abaixo e em seu lugar vimos começar a crescer um prédio. Um dia olhei para lá, uma da janelas estava aberta, e um homem ameaçava outro com uma pistola e aos berros. O outro defendia-se como podia e gritava também. Estava eu já a preparar-me para ligar para a polícia – quando os vejo parar, sentarem-se a uma mesa e beberem uma cerveja. Apesar de tudo fui lá ver o que se passava. Então, aquilo ia ser o Instituto Francês – coisa que não sabíamos – e aqueles dois senhores eram atores a ensaiarem a peça de estreia. Claro que me convidaram logo para a inauguração…

Hoje tudo está diferente.

Parabéns às Avenidas Novas. Cumprimentos ao Sr. Presidente da Junta.

Bjs